Tereza destacou serem de 2006 os dados utilizados para chegar ao IPM – que mede privações de serviços essenciais independentemente da renda, apontando 2,7% da população brasileira com necessidades graves. “Foi a partir de 2007 que se incorporou um contingente grande do Bolsa-Família, que houve a valorização do salário mínimo, o programa de agricultura familiar integrada ao programa de alimentação escolar e melhoramos o acesso à energia com o Luz para Todos. Então, se esses avanços fossem computados, certamente teríamos um salto muito maior”, disse a ministra, sem precisar quantas posições o Brasil subiria no IPM caso os progressos mais recentes estivessem no cálculo do Pnud, exatamente por não “conhecer a metodologia”.
A ministra não soube explicar os motivos que levaram as Nações Unidas a não considerarem estatísticas atualizadas, depois de uma solicitação nesse sentido que o governo brasileiro teria feito no início deste ano. “Por que (os dados) não foram incorporados? É uma boa pergunta”, limitou-se a declarar.
Comparação O coordenador das Nações Unidas no Brasil, Jorge Chediek, destacou, no próprio relatório, que o movimento do país rumo a um desenvolvimento humano elevado está contemplado na última versão do estudo, apresentando anualmente pelo organismo. “Muitos dos avanços mais recentes alcançados pelo Brasil ainda não estão refletidos no relatório porque usamos dados comparáveis a todos os 187 países, mas as tendências positivas deixam em evidência as melhoras e conquistas do Brasil nas últimas décadas”, afirma Chediek.
Chediek destaca o sucesso do Brasil em políticas de sustentabilidade, inclusão social e desenvolvimento como um exemplo concreto para a Rio%2b20, evento mundial que será realizado no ano que vem no Rio de Janeiro. Na breve coletiva, a ministra Tereza Campello também ressaltou as menções positivas que o relatório faz ao país, na área de meio ambiente, saneamento e transferência de renda, citando nominalmente o Bolsa-Família.
A ministra negou, entretanto, que a motivação para uma coletiva de última hora sobre o assunto tenha vindo de queixas de Lula, sugerindo desconhecer o telefonema dado pelo ex-presidente a Gilberto Carvalho. Mas a versão não se sustentou. “O presidente Lula nos deu um telefonema iradíssimo hoje (ontem) sobre os números do Pnud, dizendo que não era justo, e que a gente tinha que reagir”, comentou Carvalho, durante um seminário internacional com o embaixador da Itália, no Palácio do Planalto.
O ex-presidente não teria concordado com os critérios do Pnud. O secretário-geral também considerou que os parâmetros da pesquisa não retratam a realidade brasileira. “Entendemos que vale a pena uma discussão em torno da metodologia. Temos consciência de que nossos indicadores sociais cresceram e seguem crescendo. Nossos técnicos vão sentar com os técnicos do Pnud para discutir isso”, adiantou Carvalho.
Palavra de especialista
Flávio Comim - economista
As reclamações sobre o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), recém-lançado para o Brasil, procedem. O indicador está muito desatualizado, usando dados de 2006. Além disso, foi construído para uma estrutura de pobreza africana/asiática, diferente da brasileira. Desse modo, tem pouca relevância para a política pública do país. O resultado de 2,7% de “pobres multidimensionais” é menor do que 8,5% de pobreza extrema e 11,5% de insegurança alimentar moderada e grave, números do próprio governo brasileiro. Mas isso não quer dizer que o conceito de pobreza multidimensional não tenha inúmeras virtudes na mensuração da miséria e que esforços conjuntos entre o Pnud e o governo brasileiro não possam gerar uma nova versão para a criação de um “IPM Brasileiro” . Em nome de 16,2 milhões de brasileiros (8,5% da população em pobreza extrema), é preciso transformar esse limão em uma limonada.
*Pós-doutor pela Universidade de Cambridge e consultor do Pnud no relatório de IDH do ano passado.