Jornal Estado de Minas

Insegurança nos fóruns da Grande BH ameaça servidores do judiciário

Em pelo menos quatro cidades da RMBH, incluindo a capital, Estado de Minas comprova que resolução do CNJ que obriga medidas de segurança nas varas criminais não é cumprida

Alice Maciel

No acesso à entrada principal do Fórum Lafayete, em Belo Horizonte, apesar dos seguranças e dos detectores de metal, uma faca de cozinha dentro da bolsa da repórter é identificada com apitos mas não é barrada - Foto: Beto Magalhaes/EM/D.A Press

Um ano e oito meses depois da aprovação da resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que determinou que os tribunais regionais federais e os tribunais de Justiça adotem medidas de segurança nos prédios das varas criminais, juízes mineiros e servidores continuam expostos à violência no ambiente de trabalho. O Estado de Minas constatou in loco a insegurança visitando quatro fóruns da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) onde estão instaladas varas criminais e cíveis. Em Ribeirão das Neves, Contagem, Betim e na própria capital, a reportagem, sem se identificar, entrou nos prédios com uma faca de cozinha na bolsa. Em nenhum momento foi abordada por seguranças, apesar do sinal de alerta dos detectores de metal. Em Betim, o equipamento está instalado, mas fica desligado. Além disso, outros mecanismos de proteção como câmeras de vigilância e o controle de acesso e a falta de infraestrutura dos prédios comprovam que a resolução do CNJ está longe de ser respeitada.

 

Em Ribeirão das Neves, onde há juízes ameaçados de morte, não é difícil entrar com uma arma, até porque os funcionários não estão autorizados a vistoriar as bolsas de quem entra, mesmo se o detector apitar. No ano passado, um homem tirou um revólver da cintura durante a audiência, segundo o promotor de Justiça Henrique Macedo. No prédio, onde trabalham três juízes, apenas duas garagens estão à disposição dos magistrados. Se eles saem depois das 18h, têm de passar pelos presos do regime semi-aberto que estão voltando para a penitenciária José Maria Alkimin. Neste horário, o segurança já fechou as portas e está do lado de dentro, e o juiz, que ficou sem a vaga, tem de caminhar até o carro.


No fórum de Ribeirão das Neves, ficam três vigias, durante o horário comercial, para proteger os três andares das varas criminais. Segundo um deles, que não quer ser identificado, há câmeras de vídeo em todos os andares, mas ninguém fica monitorando. O diretor da Comarca de Ribeirão das Neves, juiz Wenderson de Souza Lima, disse que faz o possível para dar segurança aos fóruns, mas admite que ela ainda é precária. “Se houver um resgate de preso no fórum, morre todo mundo, não só pela falta de segurança, mas pela arquitetura dos prédios que tinha de ser padronizada”, defendeu.


Em Betim, a situação é pior. Apenas um segurança – que acaba tendo de fazer também o papel de atendente – é encarregado de proteger todo o prédio. As varas criminais e o gabinete do juiz ficam no quarto andar. O detector de metal fica ao canto de um grande rol e estava desligado quando a reportagem foi ao local, na quinta-feira. Segundo a administradora, Isabela Couto Machado, o prédio está em reforma, por isso, ainda não teriam sido instaladas câmeras de vigilância e o detector não está funcionando.


No fórum de Contagem, as pessoas deixam os materiais metálicos por conta própria, raramente o segurança para alguém quando o detector apita. A fotógrafa foi uma das abordadas. Antes de revistar sua bolsa, a segurança perguntou: “ Você é advogada?” Ela disse que não e mesmo assim o vigia pediu para que ela abrisse apenas a parte maior da bolsa. Os dois vigias ficam na porta. O restante do prédio, inclusive o gabinete do juiz, fica desprotegido. Nem os magistrados da capital escapam. Ninguém é parado no detector de metal. Os gabinetes dos juízes ficam desprotegidos.


Manifesto nacional

O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), desembargador Nelson Calandra, diz que é falha a segurança dos fóruns de todo o Brasil. Uma das soluções para a proteção dos magistrados, segundo ele, seria o treinamento de uma equipe da Polícia Militar para atuar nessa área. “Mas o que o país tem de fazer, e o mais rápido possível, são mudanças no campo processual e penal e isso passa pelo interesse político”, ressaltou.


Para tentar conter as ameaças e a violência contra os magistrados, a AMB, em parceria com a Associação Mineira dos Magistrados (Amagis), lançou ontem um manifesto nacional por segurança, com sete propostas que serão apresentados à recem-criada frente parlamentar mista pelo aperfeiçoamento da Justiça Brasileira.


O Tribunal de Justiça Federal informou que estão em andamento na sede em Belo Horizonte a troca de todo o sistema de circuito fechado de TV, a instalação de detectores de metal, aparelhos de raios X nas varas criminais, além de treinamento anual para todos os agentes de segurança, inclusive do interior. A assessoria de imprensa informou ainda que os edifícios são dotados de sistema de controle de acesso, com identificação nas três portarias, vigilância física diurna e noturna, em todas as unidades. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais não deu resposta.

 

Propostas de segurança
. Criação de uma política nacional de segurança para a magistratura
. Imediata revisão dos sistemas penal e processual penal, em particular com relação aos crimes de violência contra a pessoa
. Formação de órgão de inteligência em cada tribunal, com atuação destacada para a coleta e avaliação de informação
. Utilização da Força Nacional de Segurança para atuação em momentos de crise
. Capacitação em segurança de dignitário do corpo de agentes de segurança definido em cada tribunal
. Protocolo objetivo de conduta para juízes ameaçados.
. Gestão para que a segurança dos fóruns seja tratada como tema de interesse nacional