Jornal Estado de Minas

REFORMA MINISTERIAL

Pastas do Direitos Humanos, da Igualdade Racial e das Mulheres tentam evitar fusão

Guilherme Amado
"É importante que o ministério continue independente. Se você junta tudo, dilui a luta. A discriminação racial é diferente da discriminação contra as mulheres", diz Luiza de Bairros, ministra da Igualdade Racial - Foto: Renato Araujo/ABR
Brasília –A notícia que circulou pela Esplanada no fim do ano passado assombrou os titulares de três ministérios que completam 10 anos de criação em 2012: a presidente Dilma Rousseff fundiria as secretarias de Direitos Humanos, de Políticas para Mulheres e de Promoção de Políticas de Igualdade Racial. Para enxugar gastos, as três ficariam sob o guarda-chuva de uma nova pasta. Diante da repercussão negativa, principalmente de setores do PT e de movimentos sociais, Dilma correu para negar a informação e defender a “responsabilidade política imensa” do trio. No ano em que completam uma década de atuação, as pastas apresentaram ao Estado de Minas aquelas que consideram suas maiores conquistas e desafios na pauta social do governo. E defenderam a existência e a independência de cada uma em relação às outras. “É claro que (a fusão) tiraria nossa força”, alerta Luiza de Bairros, titular da Igualdade Racial.

Criadas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro ano de governo, as três secretarias têm status de ministério e foram, desde a origem, ocupadas por petistas. Além do respaldo político, os movimentos negro e feminista consideram as duas pastas conquistas históricas em um país ainda “marcadamente racista e machista”. Se essas duas forças foram fundamentais para impedir Dilma de aceitar a sugestão de fusão que lhe foi feita pela Câmara de Gestão e Competitividade, órgão que faz estudos sobre como melhorar a máquina pública do governo federal, as titulares das três pastas garantem que também pesaram na decisão as conquistas que afirmam terem tido nesses nove primeiros anos de atuação.

“O Estado brasileiro reconheceu a existência do racismo e tomou para si a tarefa de enfrentá-lo. Institucionalizamos o tratamento da questão racial”, defende Luiza de Bairros, a mais aguerrida das três mulheres à frente das pastas, no que se refere à defesa do trabalho realizado. A ministra aponta entre as conquistas da Secretaria de Promoção de Políticas de Igualdade Racial as ações afirmativas na educação, a criação de uma política de saúde especialmente voltada para os negros e a inclusão no currículo escolar de história e cultura africana. Mesmo assim, ainda considera o Brasil um país racista. “O racismo não diminuiu. Ele é elástico, vai se adaptando de acordo com as mudanças. É uma ideologia poderosa. Por isso, é importante que o ministério continue independente. Se você junta tudo, dilui a luta. A discriminação racial é diferente da discriminação contra as mulheres”, explica.

O objetivo da pasta nos próximos anos é agregar as políticas pela igualdade racial aos grandes programas do governo, como o Minha casa, minha vida; Brasil sem Miséria; e Pronatec, de ensino profissionalizante. No caso do Pronatec, por exemplo, pretende sugerir um mecanismo em que as entidades do movimento negro recrutem jovens para participar dos cursos técnicos.

Na Secretaria de Direitos Humanos, a que goza de mais visibilidade entre as três, o assunto fusão também é evitado. Segundo o secretário-executivo Ramaís de Castro Silveira, que substitui até 16 de janeiro a ministra Maria do Rosário, as atribuições do ministério já são grandes o suficiente. “É a presidente quem decide. Não temos uma posição preliminar. Já temos um rol que nos tem consumido bastante”, defendeu. Entre as conquistas da pasta, Ramaís destaca o Programa Nacional de Direitos Humanos 3, que consolidou e atualizou uma série de propostas na área, além do programa Viver sem Limite, no ano passado, voltado para as pessoas com deficiência, e da Comissão da Verdade.

Ramaís rebate uma das principais críticas de que o ministério foi alvo nos últimos anos. Segundo ele, o governo não foi tímido ao optar por apenas investigar os fatos relacionados à ditadura, sem levar à punição dos crimes cometidos no período. “O entendimento do governo brasileiro é de que isso é uma pauta do Poder Judiciário. Não deve partir do governo, como não foi em nenhum país. Até por uma questão de divisão de poderes”, defende o secretário-executivo.

Visibilidade

Titular da Secretaria de Políticas para Mulheres, a ministra Iriny Lopes afirma que o tema da fusão nem sequer foi debatido pelo governo. “A luta pela liberdade é um avanço no enfrentamento ao preconceito. A desigualdade de gênero é cultural. Essa mudança de mentalidade não se realiza por decreto. Ela será decorrência de um esforço coletivo, de governo e sociedade. O governo Dilma nunca debateu a fusão das três pastas”, acredita. A ministra lembra que o fato de termos uma mandatária do sexo feminino não significa que tenhamos uma representação política equânime. “O Congresso perdeu a oportunidade de realizar uma reforma política que considerasse a necessidade de equidade de gênero nos espaços de poder”, critica.

Os ministros defendem que a natureza das pastas que comandam, responsáveis por políticas que são desenvolvidas por toda a Esplanada e não por elas próprias, dificultaria que as propostas ganhem visibilidade. “A secretaria é um ministério meio, que trabalha com outras pastas”, explica Iriny. Apesar disso, a interlocução com o governo nem sempre é fácil. “Não é fácil mostrar que o racismo é algo tão forte a ponto de estruturar toda a sociedade”, explica Luiza.