Brasília – A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) pagou duas vezes pela mesma obra de saneamento nos trechos Centro e Dom Avelar, em Petrolina, no interior pernambucano. Quando o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, era prefeito da cidade, em 2005, a Codevasf firmou convênio de R$ 23,8 milhões para a implantação de estação de tratamento de esgoto na Bacia Centro e na Dom Avelar. O convênio foi pago, mas as obras de 2005 não foram concluídas, de acordo com auditoria da Controladoria Geral da União (CGU). Mesmo assim, a Codevasf assinou em maio de 2011 outro contrato, de R$ 65 milhões, para obras de saneamento em Petrolina, incluindo o Centro e o Bairro Dom Avelar como áreas beneficiadas pelo investimento.
As irregularidades e pendências do convênio de 2005 foram analisadas por Clementino Coelho, irmão do ministro e na época à frente da Presidência da Codevasf. Em julho de 2011, a superintendência da regional de Pernambuco encaminhou nota técnica a Clementino listando as “providências adotadas” para sanar os problemas das obras de tratamento de esgoto. A nota foi encaminhada à Secretaria de Controle Interno da CGU por Clementino, menos de dois meses depois de ter autorizado o novo convênio de saneamento da Codevasf em benefício de Petrolina.
O montante do convênio destinado à terra natal do ministro da Integração corresponde a 75% do orçamento da Codevasf em 2011 voltado para ações de saneamento rural e urbano. No ano passado, a rubrica dispunha de R$ 86 milhões para projetos. Com aporte de recursos da fase 2 do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o orçamento subiu para R$ 184 milhões. Os investimentos foram anunciados em Petrolina como o primeiro passo para que o município se tornasse a primeira cidade de Pernambuco com 100% de saneamento básico. No âmbito do governo federal, as obras de esgotamento sanitário em municípios com mais de 50 mil habitantes são de responsabilidade da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiente, do Ministério das Cidades. Petrolina tem 293 mil habitantes. As obras do convênio entre Codevasf e Compesa tiveram início no ano passado e o período de vigência do pacto será encerrado em 2013.
O Estado de Minas entrou em contato com a Prefeitura de Petrolina e questionou a situação das obras listadas no relatório da CGU, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição. A prefeitura informou apenas que estava levantando as informações sobre o convênio de 2005, pois foi firmado em outra gestão. De acordo com a Codevasf, o projeto para a conclusão da implantação de redes de esgotamento sanitário de Petrolina foi elaborado pela Compesa, que é a concessionária municipal e operadora do sistema. Ainda de acordo com a estatal, as obras do convênio de 2005 foram entregues. “Não procede a informação de que as obras não foram realizadas. Com base na prestação de contas do referido convênio, foram executadas obras e serviços no valor deR$ 16,5 milhões e ainda devolvido o valor de R$ 1,4 milhão.” O registro do convênio de 2005 no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) do governo federal, no entanto, indica repasses de R$ 19,4 milhões para Petrolina.
Sem comprovação
Auditoria da CGU identificou que, dosR$ 23,8 milhões do convênio firmado entre a prefeitura de Petrolina e a Codevasf em 2005, pelo menos R$ 4,6 milhões não foram devidamente comprovados nas prestações de contas. O trabalho de fiscalização identificou ainda que a obra de saneamento contratada à época em que Fernando Bezerra era prefeito do município teve R$ 412 mil de recursos perdidos em sobrepreço e R$ 339 mil em “pagamentos irregulares”. O período de vigência do convênio enquadrado pela CGU também compreende a administração de Odacy Amorim, sucessor de Bezerra.
De acordo com a CGU, apesar de as obras estarem inacabadas foram identificadas medições que superam as quantidades contratadas. Os técnicos relataram que os vícios do convênio tiveram início no processo de licitação. Apesar de 22 firmas terem solicitado o edital, apenas quatro apresentaram propostas e “constatou-se que todas as empresas possuem ou já possuíram algum tipo de vínculo, seja participação em consórcios, seja na participação de seus sócios na composição de outras empresas em comum”.
Quando o projeto de saneamento para o município de Petrolina foi aprovado, a obra foi orçada em R$ 9,9 milhões, mas a proposta original foi modificada e o convênio ganhou termo aditivo, elevando para quase R$ 24 milhões o montante de recursos federais que seria despendido via Codevasf. O relatório da CGU deu origem a um inquérito civil no Ministério Público Federal.