Jornal Estado de Minas

Campanha propõe punição rigorosa para quem maltratar animais

Juliana Cipriani
A indignação de milhares de brasileiros com recentes casos de maus-tratos contra animais domésticos pode dar origem à próxima lei de iniciativa popular do país. Depois das mobilizações que se transformaram em legislação nas áreas eleitoral, de habitação e direito penal, os defensores de cães, gatos e outros bichos de estimação anunciam que vão colher 1,3 milhão de assinaturas para propor uma punição mais rígida contra quem agredir os pets. Eles fazem uma primeira manifestação hoje e preparam uma petição para captar adesões a partir de abril. Em Belo Horizonte, os manifestantes se reúnem às 10h na Praça da Liberdade.
Se depender do volume de envolvidos, conseguir participação popular nesse tema será fácil. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) excluiu os animais do último censo, mas, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos para Animais de Estimação, são 35,7 milhões de cães e R$ 19,8 milhões de gatos no país. O caso de Lobo, o cão rottweiler que foi amarrado pelo dono no para-choque do carro e arrastado por 11 quilômetros em Piracicaba, no interior de São Paulo, é emblemático para a causa, que já foi levada por uma comissão ao Congresso Nacional. O animal acabou morto. A atual legislação de crimes ambientais (Lei 9.605/98) imputa a quem praticar abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais uma pena de três meses a um ano de prisão e multa. A punição pode aumentar entre um sexto e um terço se o agredido morrer.

O problema, segundo as entidades defensoras dos animais, é que a pena é branda e quase sempre convertida automaticamente em prestação de serviços. A presidente da organização não governamental (Ong) Vira-Lata, Vira Vida, Míriam Miranda, diz que é preciso garantir que seja aplicada a pena de detenção, além de aumentar a punição pedagógica de prestação de serviços. Também para ela, é preciso incluir na lei a perda de direitos civis de quem comete crimes contra animais. Essa pessoa poderia, por exemplo, sofrer restrição no acesso a empréstimos ou a contratos com o serviço público.

Nos Estados Unidos, argumenta Miriam, quem maltrata animais cumpre pelo menos 1.200 horas de serviços prestados, 10 vezes mais do que o proposto pelo Ministério Público como conciliação no caso de Lobo, no Brasil. “Já vi gente saindo algemado de casa. Eles têm serviços de averiguação, e já houve gente que recebeu pena de cinco a seis anos de detenção. Isso mostra a seriedade de um país”, afirma.

Integrante da comissão pela criação da Lei Lobo e da ONG Segunda Chance, Fernanda Barros diz que a proposta de lei popular está sendo elaborada por juristas e protetores de animais. A opção por iniciar a coleta de assinaturas em abril foi para dar mais tempo para acertar nos termos do projeto. “Achamos a punição branda aos crimes cometidos contra animais e entendemos que uma alteração na lei será mais rápida por meio da iniciativa popular”, explica. Hoje o tema fará parte da manifestação “Crueldade nunca mais”, que ocorrerá simultaneamente em 50 cidades do Brasil.

Manobra

“É um primeiro passo para chamar a população e manter viva essa indignação frente a tantos crimes ocorridos recentemente”, diz Fernanda. Para ajudar nas assinaturas, todas as ONGs de proteção a animais serão contatadas e um trabalho de marketing já está sendo estudado.

A iniciativa popular é um trunfo com o qual o presidente da Frente Parlamentar de Defesa dos Animais, deputado Ricardo Izar (PSD-SP), espera contar para evitar que sejam votados projetos contrários aos direitos dos bichinhos. É que tramitam cerca de 30 matérias sobre o tema na Câmara, e a primeira da fila, do ex-deputado Tomás Nono, descriminaliza os maus-tratos a animais domésticos. “Nosso medo é que o projeto dele seja votado e a situação piore, mas já estamos conversando com o presidente da Casa, deputado Marco Maia (PT), para colocar em separado textos que aumentam a punição. Enquanto os grupos de apoio buscam assinaturas, trabalhamos internamente para convencer o presidente a não apensar o texto ao projeto de Nono”, disse. Pelo regimento interno, projetos semelhantes são juntados.

Izar acredita ter o apoio da presidente Dilma Rousseff (PT). “Ela gosta (de animais) e tem seus cachorrinhos. Não vejo ninguém que possa se dizer contra, a população de cães e gatos é grande no país”, afirmou. A única resistência, segundo o deputado, poderia vir do lobby do pessoal dos rodeios, mas com um texto de iniciativa popular será mais fácil para os deputados romper a dificuldade. “Quando você tem uma causa com suporte popular é muito mais fácil trabalhar”, prevê.