A nova divisão dos royalties do petróleo retorna à pauta da Câmara do Deputados na semana que vem, mas antes mesmo do início dos debates a condução do tema já desagrada lideranças municipais que sonham com uma distribuição “mais justa” dos recursos extraídos em alto-mar. Isso porque é forte a presença de deputados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, os chamados estados produtores, na comissão especial formada na Casa para analisar o projeto aprovado no ano passado no Senado, o que torna mais distantes as chances de desconcentração dos recursos.
O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, lamentou que as próprias lideranças partidárias responsáveis pela indicação dos integrantes da comissão não levassem em consideração a importância do debate. “Se eles enfrentam um tema como este de forma tão desproporcional, só podemos lamentar. Rio e Espírito Santo, que não aceitam uma divisão mais igualitária dos royalties entre todas as unidades da Federação não têm mais de 80 parlamentares, enquanto os representantes de outros estados somam cerca de 450 deputados. Por isso, a divisão de vagas na comissão representa uma distorção muito aguda”, criticou Ziulkoski.
Entre os titulares escolhidos está o deputado fluminense Anthony Garotinho (PP), que em novembro entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a proposta aprovado no Senado. O mandado de segurança 31031 foi entregue ao ministro Luiz Fux, que será relator da ação. A judicialização do processo, no entanto, é vista com grande preocupação pelo governo federal, já que pode atrasar a abertura das licitações para novos campos, inclusive prejudicando a exploração das áreas do pré-sal.
Mobilização
Apesar da apreensão em relação aos trabalhos da comissão e do tempo que será usado para que os deputados cheguem a um acordo, Ziulkoski acredita que não haverá dificuldade em aprovar o texto de Vital do Rêgo (leia nesta página), que reduz os recursos do petróleo repassados à União e a estados e municípios produtores e aumenta a participação de todos os entes da Federação. Uma nova mobilização da CNM já está marcada para o final de fevereiro, com objetivo de evitar que o assunto seja deixado de lado no Congresso.
O presidente da CNM criticou também o que considerou como “falta de compromisso” da Mesa Diretora da Câmara de honrar as promessas feitas aos prefeitos no ano passado de que o tema seria levado a plenário até dezembro, e questionou a própria criação da comissão especial para discutir o assunto. “Essa ação já tem um caráter protelatório, uma vez que foram vários pedidos de urgência da votação. Outra preocupação é o tempo que essa comissão vai levar para produzir algum relatório e encaminhar a proposta ao plenário. Ainda em 2011 tivemos a garantia do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), de que a divisão dos royalties seria apreciada. Mas devido a acordos do governo federal, que precisava aprovar outros temas, fomos mais uma vez atropelados”, afirma.
Saiba mais
Mudança nos percentuais
De autoria do senador Wellington Dias (PT-PI), o projeto de divisão dos royalties foi aprovado no Senado em outubro de 2011, na forma de substitutivo do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB). O texto prevê que a fatia da União nos campos já licitados caia dos atuais 30% para 20%. Para os estados produtores, a fatia diminui de 26,25% para 20%, e para os municípios produtores haverá cortes graduais dos atuais 26,25%, chegando a 4% em 2020. Parte dos recursos deverá ser dividida conforme o rateio do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE). O substitutivo prevê também a redistribuição na participação especial, otributo pago sobre campos com grande lucratividade. Nesse caso, a União, que hoje recebe 50%, passaria a receber 42% em 2012. A partir daí, com a expectativa de aumento das receitas, a União voltaria a ter sua alíquota ampliada ano a ano, até chegar a 46%.
Em busca de consenso
Os dois deputados mineiros escolhidos pelos seus partidos para integrar a comissão especial que vai analisar as propostas de divisão dos royalties do petróleo, Paulo Abi-Ackel (PSDB) e José Humberto (PHS), já têm posições definidas sobre a polêmica e esperam que os trabalhos não sejam prejudicados por atitudes radicais por parte dos representantes dos estados ditos produtores. “Nossa primeira providência será fazer com que as bancadas do Rio de Janeiro e Espírito Santo percebam que não há qualquer intenção de prejudicar seus estados. O objetivo é fazer com que os demais estados e municípios sejam contemplados com os recursos que serão extraídos em área continental”, diz Abi-Ackel.
O parlamentar tucano afirmou que a comissão deve levar em consideração também o projeto do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que retira da União um percentual maior do que o previsto no texto aprovado no Senado, de Vital do Rêgo (PMDB-PB). Segundo Abi-Ackel, a proposta de Dornelles seria a forma ideal para que os estados e municípios não tenham suas rendas prejudicadas nos próximos anos e mantenham os compromissos assumidos anteriormente. “Será importante que a União abra mão de uma parcela dos recursos e, como prevê o texto de Dornelles, seja definida a incidência de ônus maior sobre as petroleiras. A conta ainda não fechou e será preciso discutir detalhes que continuam indefinidos. Mas para conseguirmos o consenso é preciso acabar com a carga emocional presente nesse tema”, defende o deputado.
Para o deputado José Huberto (PHS), a desconfiança sobre a comissão aumentou ainda mais depois de confirmado que a maioria das nomeações é de deputados capixabas e fluminenses. No entanto, o parlamentar acredita que caberá aos representantes dos outros estados, defender a divisão mais igualitária dos royalties do petróleo aprovada no Senado. “Tenho receio de que as nomeações possam privilegiar a forma atual da distribuição, mas ainda não existe a definição de um relator ou presidente. Acredito que as bancadas dos considerados produtores vão tentar de toda forma impedir que seus estados tenham repasses reduzidos, por isso é preciso acompanhar o tema de perto”, afirmou José Humberto.