Apesar das acusações do Ministério Público Federal de que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra/MG) deixou de fiscalizar os assentamentos de trabalhadores rurais, o superintendente do instituto, Carlos Calazans, garante que, desde que assumiu o cargo, há três meses, já assinou 530 notificações para retomada dos lotes em razão do comércio ilegal ou do abandono do terreno. Segundo Calazans, o processo está sendo lento porque muitos dos notificados recorrem à Justiça para tentar evitar a retirada. Ele cita como exemplo o assentamento Treze de Maio, em Ibiá, que está com sua finalidade desvirtuada e os principais compradores são comerciantes da cidade vizinha de São Gotardo.
O superintendente do Incra diz ainda que, à época da seleção das famílias para os terrenos no Alto Paranaíba e Triângulo Mineiro, no fim da década de 1990, os critérios usados foram “precários”. As distorções surgiram, então, da soma desse fator com a ineficiente fiscalização do Incra. Para os pequenos agricultores que adquiriram áreas de sem-terra, mas mantêm nos lotes o cultivo ou a criação de gado, o Incra estuda a edição de uma portaria nacional para regularizar a situação das famílias. “Estamos estudando essas situações para que ninguém seja prejudicado. Ele explicou ainda que a prioridade de ocupação dos lotes retomados pelo Incra são de famílias que estão em acampamentos, cerca de 5 mil, aguardando seus terrenos.
Atrativo
Todos esses números não são sem motivo. Minas Gerais responde por 16% de todos os imóveis rurais cadastrados no país e é o maior estado em número de propriedades rurais em todo o território nacional. São tantas terras, acampamentos e assentamentos e poucos recursos para reforma agrária. Essa inclusive é uma das reclamações dos trabalhadores rurais assentados e uma das justificativas para o comércio de lotes que deveriam ser usados para cultivo, conforme mostrou ontem o Estado de Minas.
Quem admite essa penúria é o próprio Incra em seu último relatório de gestão disponível no site da entidade. Em 2010, a autarquia teve um orçamento de R$ 69 milhões para a manutenção de toda a sua estrutura, pagamento de salários, consolidação da política de reforma agrária, como concessão de créditos, assistência técnica, educação, infraestrutura, regularização fundiária e ações de cartografia. Outros R$ 29 milhões foram investidos no pagamento de títulos de dívida agrária, ou seja, para pagar as terras desapropriadas. Além do orçamento apertado, a autarquia ainda padece de funcionários. Em todo o estado, são apenas 200 servidores.
“O quadro que se delineia não é dos mais promissores: insuficiência de pessoal, suspensão de concursos públicos, insuficiência de recursos financeiros, pressão dos movimentos sociais para o acesso à terra, aumento da demanda de acompanhamento e fiscalização dos assentamentos, das obras e serviços contratados”, diz o trecho final do relatório, apresentado em março do ano passado. O documento ainda destaca o fato de o orçamento ter ficado ainda mais enxuto por causa do corte de gastos determinado pela presidente Dilma Rousseff logo no início de seu mandato e que atingiu também o Incra, não só em Minas Gerais, mas em todo o país.
Em 2010, os recursos previstos para a consolidação e emancipação dos assentamentos no orçamento do Incra mineiro eram da ordem de R$ 508.225. No entanto, nenhum centavo foi liberado. O balanço do Incra do ano passado ainda não foi fechado, mas a escassez de recursos já era apontada no último relatório de gestão da entidade.
Barreiro
Foi no Triângulo que surgiu, em 1986, um dos primeiros terrenos desapropriados para abrigar trabalhadores rurais, a antiga fazenda Barreiro, hoje conhecida como assentamento Iturama, oficializado em 1986, no município de Limeira do Oeste (6,7 mil habitantes), com 2.486 hectares e 117 famílias. A região também é um dos berços do movimento ruralista brasileiro e foi palco, durante muitos anos, de disputas envolvendo fazendeiros e trabalhadores sem terra.