Jornal Estado de Minas

Velha disputa entre UDN e PSD volta à tona nas últimas semanas em Mariana

Ex-prefeita teria transferido biblioteca que ficava na casa onde morou Pedro Aleixo, fundador da UDN, como represália aos opositores do seu ex-marido, que pertencia ao extinto PSD

Marcelo da Fonseca- enviado especial
A velha disputa entre UDN e PSD, que marcou a política brasileira até meados dos anos 1960, voltou à tona nas últimas semanas no município de Mariana, na Região Central do estado. Tudo porque a biblioteca pública municipal, que funcionava na casa onde morou Pedro Aleixo (1901-1975) – estadista mineiro que participou da fundação da UDN –, foi retirada do lugar no início deste mês por determinação da prefeitura e transferida para o Centro de Convenções da cidade. No imóvel desapropriado vai funcionar um cursinho pré-vestibular. A mudança desagradou a parte da população, que questionou as razões da decisão e levantou a possibilidade de a troca ter sido motivada por uma rixa entre antigos rivais. Isso porque João Ramos Filho, ex-prefeito que foi assassinado em maio de 2008, e marido de Terezinha Ramos (PTB), prefeita cassada na semana passada, era integrante do antigo PSD.
O ex-prefeito do município e responsável pela criação da biblioteca pública em homenagem a Pedro Aleixo, Celso Cota (PSDB), lamentou a decisão da prefeitura, que, segundo ele, passaria a usar um espaço destinado inicialmente para eventos de negócio e turismo para outra finalidade. “A biblioteca ficava bem localizada na área central e prestava homenagem ao ex-presidente Pedro Aleixo, com um acervo rico em exemplares únicos que retratam a história de Minas. Levá-la para o centro de convenções é um erro, já que o espaço foi criado para receber eventos maiores da cidade e está virando uma extensão da prefeitura”, afirma Cota.

Para o ex-vereador Luciano Rolla, a mudança de lugar da biblioteca pode sim ter sido uma retaliação de Terezinha Ramos aos adversários de seu marido – e hoje seus adversários. Quem fica no prejuízo, na sua opinião, são os moradores, que perdem um espaço público que fazia referência a uma figura ilustre da cidade.

Já a vereadora Aida Anacleto (PT) criticou a falta de diálogo entre a prefeitura e a Câmara Municipal na hora de definir mudanças que afetam a população da cidade. “Só tomei conhecimento quando passei por aqui e vi a mudança. Mas a proposta não foi discutida com ninguém. A casa de Pedro Aleixo atendia muito bem a cidade, já que estava em um lugar tranquilo e perto de tudo. Foi um espaço projetado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e atendia muito bem aos usuários. É mais uma mudança absurda a que assistimos sem poder participar”, disse a parlamentar.

O secretário de Educação de Mariana, Rinaldo Urzedo, negou qualquer motivação política para a troca e afirmou que a polêmica foi criada por pessoas que não concordaram com a mudança. “Essa questão política envolvendo UDN e PSD foi inventada por mentirosos para criar uma justificativa sobre a mudança, mas não teve nada disso”, explica. Segundo ele, a intenção é aumentar o número de usuários e o novo curso pré-vestibular vai ser coordenado pela própria prefeitura, para atender alunos das escolas públicas do município. “Queremos colocar a biblioteca em um espaço mais próximo da população e dinamizar seu uso. O lugar em que ela funcionava era destinado ao lazer e não ao setor cultural, o que fazia com que ela virasse um depósito de livros”, afirmou.

ADVERSÁRIOS

Proibidos durante o Estado Novo (1937-1945), os partido políticos voltaram a ser legalizados em 1945. A partir de então, a vida política brasileira ficou polarizada entre os partidos getulistas, PSD e PTB, e o principal partido antigetulista, a UDN. Mesmo com a morte de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954, suas ideias permaneceram com grande influência nas disputas partidárias até 1964.

UDN – União Democrática Nacional
» A legenda foi fundada em abril de 1945 e surgiu como um grupo contrário ao regime do Estado Novo de Getúlio Vargas e suas políticas de governo. Sua ideologia ficou caracterizada pelo forte apego ao moralismo, a defesa do liberalismo clássico e pelas críticas às políticas populistas. Em Minas, os udenistas ganharam duas eleições para governador. Em 1947, com Milton Campos, e em 1960, com Magalhães Pinto. Nacionalmente, os udenistas foram derrotados em três pleitos consecutivos (1945, 1950 e 1955), ganhando a eleição de 1960, quando apoiou a candidatura de Jânio Quadros.

PSD – Partido Social-Democrático
» Formado em julho de 1945 pelo grupo mais conservador que integrava a base de apoio do governo de Getúlio Vargas, o PSD era composto por interventores nomeados por Getúlio, lideranças rurais e por altos funcionários estatais. O partido foi majoritário no parlamento brasileiro durante duas décadas e elegeu dois presidentes da República. Eurico Gaspar Dutra, em 1945, e Juscelino Kubitschek, em 1955.

» A partir do decreto que criou o Ato Institucional nº2 (AI-2), em 27 de outubro de 1965, ficou permitida a existência de apenas duas agremiações políticas nacionais, sendo que nenhuma delas poderia usar a palavra “partido”. Formaram-se então a Arena (Aliança Renovadora Nacional) – base de sustentação civil do regime militar composta em grande parte por ex-integrantes da UDN e políticos que deixaram o PSD – e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), grupo que deveria fazer uma oposição bem-comportada em relação ao regime militar.

Saiba mais

Pedro Aleixo
1901-1975

O marianense foi incluído na lista dos ex-presidentes da República em setembro do ano passado, quando a presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei reconhecendo que, em 1969, houve um desrespeito à Constituição quando Pedro Aleixo era vice-presidente e foi impedido pelos militares de assumir a Presidência no lugar de Costa e Silva, que havia sofrido um derrame cerebral. Formado em direito na Universidade Federal de Minas Gerais, em 1927 Pedro Aleixo elegeu-se conselheiro municipal em Belo Horizonte – cargo correspondente hoje ao de vereador. Em 1933, elegeu-se deputado federal e, em 1937, se tornou presidente da Câmara dos Deputados, colocando-se contrário ao Estado Novo de Getúlio Vargas, que fechou todas as casas legislativas do país. O político mineiro não aceitou participar do regime ditatorial de Vargas e recusou o convite do interventor mineiro, Benedito Valadares, para que assumisse a prefeitura da capital mineira. Em 1945, participou da fundação da União Democrática Nacional (UDN), legenda de oposição às políticas getulistas. No Congresso, foi um dos opositores ao governo de João Goulart e participou nas articulações do golpe militar de 1964. O mineiro foi eleito pelo parlamento, para a Vice-Presidência da República, na chapa do general Costa e Silva, mas não tomou posse quando o militar se afastou.