A Controladoria Geral da União (CGU) está correndo atrás de pelo menos R$ 39 milhões que foram desviados dos cofres públicos em Minas Gerais no ano passado. Esse número, apresentado no relatório dos processos de tomada de conta encaminhado ao Tribunal de Contas da União (TCU), representa a soma das irregularidades em convênios e parcerias firmadas com órgãos federais cometidas por prefeituras, organizações não governamentais (ONGs), associações e sindicatos, detectadas pelos órgãos de controle até dezembro de 2011.
Os valores deixam claro também que recuperar o dinheiro perdido no ralo da corrupção continua sendo um grande desafio para os órgãos de controle, que esbarram na demora para a conclusão dos processos, nas variadas interpretações por parte do judiciário em ações de improbidade, além da dificuldade de construir o mapeamento detalhado do percurso do dinheiro desviado.
A deficiência na recuperação dos recursos públicos mal aplicados se repete em todo o país e desafia os responsáveis pela fiscalização a buscar formas mais efetivas de reparar os danos causados pela corrupção. Segundo relatório da Advocacia Geral da União (AGU), com dados colhidos de dezembro de 2010 a novembro de 2011, as ações de improbidade analisadas pelos órgãos somaram R$ 2,14 bilhões no Brasil. Desse total, cerca de R$ 330 milhões foram recolhidos pelos cofres da União e outros R$ 338 bloqueados. Apesar de representar apenas 15,39% de recuperação do montante desviado, os dados já mostram uma melhoria significativa, uma vez que há oito anos os recursos que retornavam à origem não chegavam a 1%. (veja quadro).
“As dificuldades de se conseguir esse dinheiro de volta são muitas. Primeiro é preciso identificar o ilícito, o que é bem complicado, já que quem vai desviar considera todas as formas de fazer o ato da forma mais oculta possível. Depois de verificada a irregularidade, é preciso juntar a documentação para comprovar a irregularidade e quantificar o montante perdido”, explica André Luiz de Almeida Mendonça, diretor do Departamento de Patrimônio e Probidade da AGU. Com pouquíssimos casos de confissão relacionados a corrupção, os advogados integrantes do Grupo de Atuação Pró-Ativa do órgão ficam responsáveis por demonstrar na Justiça todo o caminho do dinheiro, desde a autorização e liberação feita nos ministérios até o momento em que foram detectados os problemas denunciados. “Normalmente o processo é concluído em uma média de sete anos. Só com a confirmação do ilícito podemos pedir o bloqueio e ressarcimento dos valores”, afirma Mendonça.
Lacuna Entre mais de 140 projetos que tramitam no Congresso e tratam do combate a corrupção – a maioria caminhando a passos lentos nas casas do Legislativo –, uma proposta que ataca diretamente a dificuldade em garantir o retorno de recursos desviados aos cofres públicos pode sair do papel nos próximos meses. O Projeto de Lei 6.826, de autoria do Poder Executivo e apresentado à Câmara em 2010, pretende ampliar o alcance das sanções contra empresas envolvidas em atos contra a administração pública. Hoje, uma lacuna na legislação dificulta a inclusão do patrimônio de empresas em decisões que preveem o ressarcimento ao poder público.
Segundo o relator do projeto, deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), que na semana que vem apresenta seu parecer à Comissão Especial sobre Atos contra a Administração Pública, a nova regra vai permitir que as empresas sejam responsabilizadas administra e civilmente quando for constatado algum tipo de favorecimento em licitações ou superfaturamentos de obras. “É uma mudança que vai possibilitar a divisão das punições, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado. Incluímos nos atos de corrupção ações como o suborno de fiscais que visitam as sedes e tentativas de dificultar a apuração de denúncias. Mas também adicionamos um capítulo que prevê acordos de leniência. Caso a empresa colabore nas investigações e no esclarecimento dos fatos, a pena poderá ser reduzida”, explica Zarattini.
O diretor de Departamento e Probidade da CGU diz que esse tipo de iniciativa é importante, já que poderá aumentar as opções para que sejam colhidas informações e dados sobre possíveis irregularidades. “É um mecanismo que já existe em outros países, mas vale lembrar que não são as novas leis que vão resolver nossos maiores problemas com corrupção no Brasil. O problema está nas interpretações que damos às regras, que muitas vezes são usadas com uma visão protecionista que dificulta uma efetiva punição e recuperação dos recursos desviados”, ressalta Mendonça.
Ainda não há data para audiência pública com representantes das federações das indústrias para discussão das mudanças, mas Zaratini garante que até agora as conversas tem sido positivas. Segundo ele, os representantes empresariais não teriam apresentado resistências em relação ao projeto. Depois do parecer do relator, serão necessárias cinco sessões para avaliação das emendas até que a proposta seja votada. A expectativa é de que ela seja levada ao Senado no mês que vem.
Enquanto isso, 48 servidores foram demitidos
Em fevereiro, a expulsão de servidores públicos federais envolvidos em irregularidades bateu novo recorde, quando 48 agentes foram punidos com a demissão, sendo 41 do cargo efetivo, seis destituições (perde apenas o cargo em comissão, se for concursado) e uma cassação de aposentadoria. Segundo a CGU, o número é o maior para o mês desde 2003. No ano passado foram 39 demitidos; em 2010, 18, e em 2009, 41. Ainda de acordo com o órgão, nos últimos nove anos foram 3,6 mil punições com expulsão.
Principais irregularidades
Prejuízo causado por servidor ou funcionário público
Omissão no dever de prestar contas
Não foram alcançados os objetivos pactuados
Desvio de finalidade na aplicação dos recursos transferidos
Fonte: Relatório de processos encaminhados ao TCU em 2011
Taxa de recuperação
dos recursos (%)
2004 0,06
2005 0,79
2006 1,64
2007 1,70
2008 6,28
2009 2,58
2010 6,28
2011 15,39
Fonte: Departamento de Patrimônio e Probidade, relatório anual da AGU