Jornal Estado de Minas

Sem os conselhos de Lula, Dilma enfrenta maior crise política do governo

Sem o principal conselheiro e aliado político por perto, Dilma enfrentou na semana que passou a maior crise com a base desde a posse, com a troca de líderes no Congresso

Paulo de Tarso Lyra
Quando o assunto é político, a presidente Dilma Rousseff pede a bênção ao ex-presidente Lula - Foto: Pedro Ladeira/AFP
Brasília – A presidente Dilma Rousseff não hesita sobre quem deve procurar quando tem dúvidas para tomar decisões políticas e administrativas de seu governo: Luiz Inácio Lula da Silva. Se nos debates econômicos os interlocutores são mais numerosos, nesse ramo ele não é o conselheiro preferencial: é o único a quem ela confia seus dissabores, receios e próximos passos. Lula fez falta à presidente nos últimos dias, quando a convalescença para recuperar-se de uma pneumonia coincidiu com o estouro de uma crise sem precendentes com a base aliada desde a posse de Dilma, em janeiro de 2011.

A decisão da presidente de demitir abruptamente os dois líderes do governo no Congresso — Romero Jucá (PMDB-RR) no Senado e Cândido Vaccarezza (PT-SP) na Câmara — diz muito sobre o modo como ela toma decisões. E mostra que, sem o auxílio precioso de seu antecessor, ela ainda tateia no jogo real da política e na convivência com os partidos governistas.

Dilma tem, aos poucos, colocado o seu perfil no governo. Como diz um parlamentar independente, “ela percebeu que pode buscar a reeleição em 2014, já que Lula parece ser, cada vez mais, carta fora do baralho da sucessão presidencial”. Mas não se cansa de repetir que isso não significa uma ruptura com o antecessor. Até porque ela sabe que ainda não está segura o suficiente para dar passos sozinhos na seara política.

A última vez que Lula e Dilma conversaram pessoalmente foi há cerca de duas semanas, na véspera da posse de Marcelo Crivella como ministro da Pesca — sugestão de Lula. Mas a crise aumentou, o PMDB rebelou-se, o governo perdeu uma votação secreta no Senado e Dilma abriu guerra com o Congresso. Nesse período de crise, Lula pouco pôde ajudar.

No fim do ano passado, Dilma já havia demonstrado o desejo de substituir Romero Jucá (PMDB-RR) na liderança do governo no Senado. Ela estava irritada com as denúncias envolvendo o irmão do peemedebista, Oscar Jucá Neto, na diretoria da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Lula conseguiu frear o ímpeto presidencial. Dessa vez não deu certo e a presidente indicou Eduardo Braga (PMDB-AM) como novo líder do governo no Senado.

Estratégia

Lula sugeriu a nomeação de Marcelo Crivella para o Ministério da Pesca como uma maneira de ajudar a candidatura do petista Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo. A estratégia tinha dois objetivos: atrair o PRB, que tem como candidato próprio o ex-deputado federal Celso Russomano, e diminuir a insatisfação dos evangélicos com o kit gay do Ministério da Educação.

Estilo de Lula era outro

Curiosamente, o próprio Lula, apresentado por aliados e até por adversários como um “animal político”, não amparava suas decisões com base nas palavras de um único interlocutor. Durante o primeiro mandato, um dos principais conselheiros foi o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos. Ele teve uma participação fundamental para diminuir a temperatura, inclusive da oposição, durante a crise do mensalão. No segundo mandato, Lula dava muita atenção às palavras do então ministro da Comunicação Social, Franklin Martins. E durante os oito anos quando as nuvens carregadas trovejavam sobre o Planalto, Lula sempre chamava o atual presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), para um encontro extra-agenda no gabinete presidencial.

Assim que tomou posse, Dilma encerrou outra prática de Lula: as reuniões de coordenação política de governo. Esses encontros reuniam não apenas os ministros palacianos, mas também alguns estratégicos, como os titulares da Fazenda, Planejamento, Justiça e Defesa. A presidente limitou-se à reuniões diárias de briefings com os ministros da Casa, encontros que foram rareando diante dos temores de Dilma de “vazamento de informações”.

No debate econômico, ela sente-se mais à vontade para multiplicar os convivas. Dentro do governo, os mais frequentes são o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. Fora da máquina, ela debate com o empresário Jorge Gerdau — presidente da Câmara de Gestão e Competitividade —, o ex-ministro Delfim Netto e os economistas Luiz Gonzaga Beluzzo e João Manuel Cardoso de Mello, mentor do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, e ligado à petista Maria da Conceição Tavares. A explicação para essa pluralidade é a intimidade com que a presidente lida com esses temas econômicos, baseada em planilhas e números que ela domina.