Jornal Estado de Minas

Deputado em Minas tira da gaveta projeto que prevê a liberação de alcoólicos na Copa

Ssetor já defende a inclusão da aguardente no cardápio dos estádios

Juliana Cipriani

A Copa do Mundo de 2014 vai ressuscitar na Assembleia Legislativa um projeto de lei que, depois de anos de discussão, nunca chegou a ser votado em plenário, por falta de entendimento dos deputados: a proibição – ou liberação parcial – da venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol de Minas Gerais. Com a expectativa de que a decisão sobre a comercialização do produto fique para os estados, o texto, que libera a cerveja somente no primeiro tempo do jogo, deve ser finalmente votado pela Comissão de Constituição e Justiça. A briga promete ser boa. Enquanto o sindicato do setor se articula para incluir até a cachaça nas competições do mundial, a bancada da bola no Legislativo quer barrar o álcool para os torcedores.

Autor de projetos desde 2007 para impedir a venda de bebidas, o deputado estadual Alencar da Silveira Jr. quer agora liberar o consumo até o final do primeiro tempo. Pelo Projeto 483/11, ficam proibidos a venda e o consumo de bebida alcoólica a partir do primeiro minuto do segundo tempo. Ou seja, os torcedores terão uma hora (45 minutos de jogo e 15 minutos de intervalo) para beber. A regra se estende a uma área de 500 metros no entorno dos estádios. O autor da proposta disse ter mudado de ideia por causa da modernização dos locais de jogos e por observar normas internacionais que, segundo ele, permitem a ingestão de álcool somente na primeira metade das partidas.

“No México e nos Estados Unidos é assim, por que no Brasil não seria? Hipocrisia, porque a pessoa está tomando todas na porta dos estádios. Acho que, se estamos atualizando itens como segurança, colocando um novo modelo para o torcedor, nada melhor que modernizar”, argumenta Alencar. Apesar de a proposta não especificar isso, segundo ele, os torcedores só poderiam beber nos bares. Seria proibido entrar nas arquibancadas com copos. Alencar está levando a ideia ao colégio de líderes e vai se reunir, nas próximas semanas, com o novo líder do governo, Bonifácio Mourão (PSDB), para pedir apoio à tramitação. “Vou apresentar laudos que tenho e informações que colhi em viagens. Podemos começar a experiência na abertura do Independência, que deve ser em 30 dias”, disse o parlamentar, também integrante do Conselho Administrativo do América, a quem pertence o estádio.

Retrocesso

O deputado estadual Marques (PTB) vai tentar convencer os colegas a não liberar a venda de bebidas alcoólicas nos estádios. Para ele, seria um retrocesso voltar com a permissão – apesar de não haver lei neste sentido, um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público proibiu esses itens desde 2008. “Sou atleta e convivi por mais de 20 anos com os jogos. Vi gente morrendo dentro do estádio e vi também os índices de violência diminuírem com a proibição. Ficar durante duas ou três horas sem bebida não vai acabar com a vida de ninguém. As pessoas podem sair dali depois e consumir”, afirmou o ex-atacante do Atlético.

Também ex-jogador, porém goleiro, o deputado João Leite (PSDB) é igualmente contrário à venda de bebidas nas arenas. “O governo federal, que negocia diretamente com a Federação Internacional de Futebol (Fifa), é que teria dados para decidir sobre a Copa. O que tenho são os números de Minas Gerais, que mostram a redução das ocorrências policiais sem a venda de bebidas, então sou por seguirmos o que existe hoje no estado”, afirmou o tucano, que defende a regulamentação deste ponto na própria Lei Geral da Copa, a ser votada pelo Congresso Nacional – até então, o acordo é para deixar esta questão para os legislativos ou governos estaduais.

 
Um lugar para a branquinha

Não satisfeitos apenas com a liberação da cerveja nos estádios – já que somente a patrocinadora oficial da competição poderá ser vendida –, o Sindicato das Indústrias de Cervejas e Bebidas em Geral vai tentar emplacar a cachaça nos campos. A entidade pede apoio da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) para mediar os contatos políticos pela liberação da bebida. “Não existe uma argumentação lógica para proibir. Os argumentos foram os da violência, mas não vejo nenhum estudo que mostre de forma clara que essa redução ocorreu”, afirma o diretor do sindicato Cristiano Lamego, explicando que junto haveria campanha educativa pelo consumo consciente.

A cachaça, como bebida oficial do Brasil por decreto federal e patrimônio cultural e imaterial de Minas (lei estadual), não poderia ficar de fora da batalha. “Estamos em entendimento com as secretarias da Agricultura e da Copa para liberar também nos estádios, como foi feito no México com a tequila. A Fifa costuma abrir exceção para bebidas regionais”, alega. Já há acordo para divulgação do produto em bares, hotéis e eventos da Copa. O secretário de Agricultura, Elmiro Nascimento, negou que haja uma negociação pela venda especificamente nos estádios, mas afirmou que o estado pretende divulgar cachaça, café e queijo. De acordo com o secretário de Governo, Danilo de Castro, o assunto ainda não foi colocado em discussão na esfera do Executivo. A bola está, portanto, com o Legislativo.

Memória

Termo assinado em Minas


Em 2006, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Justiça do Ministério Público dos Estados realizou uma série de encontros para deliberar sobre a questão das bebidas alcóolicas dentro dos estádios e sugeriu que fosse proibida a venda e consumo, como requisito para a implantação de planos e políticas de segurança que coíbam a violência nas arenas. O Conselho recomendou que a CBF adotasse as medidas necessárias para que a norma fosse cumprida. Dois anos depois, em 2008, o Ministério Público mineiro assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) – ferramenta jurídica que garante a legitimidade de uma norma – com o governo estadual, federação de futebol e clubes para proibir a venda de bebidas em jogos de futebol em Minas Gerais.