Manter-se com o poder de aprovar ou rejeitar as contas de câmaras municipais, prefeituras e do estado, recebendo R$ 26 mil por mês em um cargo durante mais 19 anos, ou se lançar na disputa pelo comando de um município de 130 mil habitantes com R$ 14 mil por mês? Seguir afastado da política ou tentar ser o salvador de uma tradicional família que vem perdendo espaço na vida pública? O presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), Antonio Carlos Andrada, tem até o início de junho para decidir se continua no cargo ou se concorre à Prefeitura de Barbacena, no Campo das Vertentes, onde correligionários já colocaram na rua uma pré-campanha batizada de “Volta Toninho”.
O presidente do TCE governou a cidade de 1993 a 1996. Em seguida ganhou as eleições para deputado estadual por duas vezes consecutivas. Depois da segunda vitória, foi indicado pelos colegas parlamentares conselheiro do tribunal, cargo que, caso queira, pode ocupar até os 70 anos. Andrada tem 51. Para disputar a Prefeitura de Barbacena, o presidente do TCE teria que renunciar ao cargo, ou seja, não existe a possibilidade de volta.
O lançamento de Andrada para o governo da cidade tem dois objetivos. Derrotar Danuza Bias Fortes (PMDB), que não é apenas a atual prefeita mas, principalmente, integrante de uma família que há cerca de 90 anos se digladia com parentes do conselheiro pelo poder na cidade. A outra meta é reerguer os Andradas no cenário estadual. O pai de Antonio Andrada, o deputado federal Bonifácio Andrada (PSDB), ficou como quarto suplente nas eleições de 2010, e só assumiu o cargo com a convocação de quatro parlamentares de sua coligação para o secretariado do governador Antonio Augusto Anastasia (PSDB). O patriarca, de 82 anos, articula para se lançar ao Senado ou integrar chapa como vice-governador na disputa pelo Palácio da Liberdade em 2014.
Um dos irmãos de Antonio Andrada, Martim Andrada (PSDB), governou Barbacena entre 2005 e 2008, mas perdeu a reeleição para Danuza. A avaliação na cidade hoje é que o tucano não tem condições de entrar em novo embate com a prefeita. Outro irmão do presidente do TCE, o deputado estadual Lafayette Andrada (PSDB), tem nicho eleitoral em Juiz de Fora, na Zona da Mata. O parlamentar foi secretário de estado de Defesa Social, mas o governador pediu o cargo há duas semanas, depois da divulgação do aumento dos índices de criminalidade no estado. Somente de assassinatos, o crescimento foi de 22,1%.
Abaixo-assinado
Na quarta-feira, Antonio Andrada recebeu no gabinete no TCE um abaixo-assinado com 10,6 mil nomes de adeptos do “Volta Toninho”. Conforme a legislação, o prazo para desincompatibilização de conselheiros e magistrados é menor, quatro meses antes do pleito. Em 2012, o primeiro turno das eleições municipais será em 7 de outubro. Secretários de estado, por exemplo, têm que deixar o cargo em abril.
Por exercer o posto, Andrada não pôde permanecer filiado a um partido. Antes de assumir o cargo no TCE, disputou as duas eleições para deputado estadual pelo PSDB. O presidente do tribunal afirmou apenas ter recebido o abaixo-assinado e que pretende discutir com o governador, o presidente da Assembleia, Dinis Pinheiro (PSDB), e o procurador-geral de Justiça, Alceu José Torres Marques, antes de tomar uma decisão. “É uma questão de gentileza. Fazemos um trabalho em conjunto”, diz. Caso vença a eleição, Andrada perde o foro de conselheiro, que se equivale ao dos desembargadores.
Na hipótese de aceitar a candidatura a prefeito de Barbacena, Adriene Andrade, vice-presidente do TCE e mulher do senador Clésio Andrade (PMDB), deverá assumir a presidência do tribunal. Apesar de a escolha ser feita em eleição com o voto dos sete conselheiros, existe um acordo entre o grupo para que a cadeira ocupada por Adriene seja a próxima indicada à sucessão de Andrada. Conforme o regimento do TCE, a eleição acontece 15 dias depois da renúncia do presidente.
Memória
Verdade ou mito?
A influência dos Andradas e dos Bias Fortes em Barbacena remonta à última metade do século 19. Tudo começou com uma aliança entre as duas famílias, que passaram a comandar a vida política local. No entanto, com a Revolução de 1930 e o surgimento de novos líderes estaduais e municipais, foi inevitável a ruptura entre os grupos. Desde então, a cidade mineira se tornou palco de acordos, disputas e conchavos por poder. Seus solares se tornaram templos políticos, onde de um lado estava uma influente família presente em vários momentos da história brasileira – o que inclui o processo de independência do Brasil – e do outro uma oligarquia local cuja história se confunde com a ocupação da região. Mas há quem diga que a rivalidade entre os dois grupos é um mito, uma vez que eles apresentavam ideias conservadoras semelhantes e dificultaram a ascenção de outros líderes e ideais políticos locais.