A exploração de jogos de azar no Brasil é uma contravenção penal, uma atividade ilícita, em terra ou no mar. A proibição vale para todo o território nacional e só são permitidas apostas em corridas de cavalo e nas loterias oficiais. Os diálogos usados na Operação Vegas apontaram intensas conversas entre Cachoeira e Demóstenes, inclusive com trocas de informações sobre projetos de lei no Congresso que poderiam beneficiar os negócios do bicheiro.
Numa das conversas mais rumorosas divulgadas até agora, gravada em 22 de abril de 2009, Cachoeira pede que Demóstenes dê uma “olhada” no Projeto de Lei 7.228, de 2002. O senador se informa sobre o projeto e diz ao bicheiro que a proposta não regulamenta as loterias estaduais. “Inclusive, te pega”, diz Demóstenes na gravação. O bicheiro faz, então, ressalvas sobre alíneas que regularizariam a jogatina.
Em outras conversas – no total foram 298 entre fevereiro e agosto de 2011–, Cachoeira teria obtido garantias de Demóstenes de que a exploração de jogos de azar seria aprovada no Congresso, o que motivou novos empreendimentos pelo bicheiro. Policiais federais que participaram da Operação Vegas conseguiram fotos do barco-cassino comprado por Cachoeira e, pelos diálogos telefônicos usados na investigação, constataram que outra embarcação seria adquirida. Uma delas seria levada para o Rio de Janeiro, onde operaria em caso de legalização dos jogos de azar.
“A família sabe da existência do barco. Para funcionar, tem de ir a alto-mar. Esse barco-cassino está parado em Miami”, diz um familiar de Cachoeira. A defesa do bicheiro não se pronuncia sobre as investigações da PF. O Estado de Minas tentou ouvir os advogados de Demóstenes, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.
Gabinete do prefeito As cartadas de Cachoeira nos negócios de jogatina passaram também pelo gabinete do prefeito de Águas Lindas de Goiás, Geraldo Messias (PP). A cidade no entorno do Distrito Federal era considerada uma das mais rentáveis na exploração de máquinas caça-níqueis e casas de bingo. Para os negócios prosperarem, Cachoeira contava com o apoio de Geraldo Messias, segundo as investigações da PF.
O inquérito que embasou a Operação Monte Carlo já revelou ligações telefônicas entre o bicheiro e o delegado da PF de Anápolis (GO) Fernando Byron Filho, denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) como participante da quadrilha. Nos diálogos, Cachoeira pede que o delegado não indicie o prefeito nas investigações que resultaram na Operação Apate, deflagrada pela PF, em conjunto com a Receita Federal, em 13 de maio de 2011. A conversa telefônica em questão é de 27 de abril do mesmo ano.
O que se sabe, agora, é que essa não foi a única intervenção do bicheiro em prol do prefeito, no que diz respeito à Operação Apate. Em 10 de maio de 2011, três dias antes da operação, Geraldo Messias recebeu Cachoeira em seu gabinete. “Cachoeira o informou pessoalmente sobre a operação”, cita a investigação da PF. As investigações que resultaram na Operação Apate detectaram fraudes de R$ 200 milhões em diversas prefeituras, entre elas a de Águas Lindas. No dia da operação, Geraldo Messias não estava na cidade. O Estado de Minas tentou ouvir o prefeito sobre o fato de ter recebido Cachoeira na prefeitura, mas ele não deu retorno às ligações.
DEFESA DO GRAMPO
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, saiu em defesa ontem das investigações conduzidas pela Polícia Federal contra o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Segundo ele, a PF cumpriu “rigorosamente o seu papel” ao longo da Operação Monte Carlo. Também defendendo a lisura dos grampos telefônicos que flagraram conversas entre Carlinhos e o senador Demóstenes Torres, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, contestou as declarações dos advogados do parlamentar, de que as investigações foram ilegais. “O alvo, com autorização judicial, era o Cachoeira, mas o que acontecia é que o senador ligava com frequência para ele. Por isso, há muitos áudios com o parlamentar”, disse.