Uma decisão recente do Tribunal de Contas do Estado (TCE) pode acabar beneficiando prefeitos, secretários e dirigentes de órgãos públicos mineiros suspeitos de desviar até R$ 15 mil do bolso do contribuinte. Os infratores não serão mais investigados pelo órgão, criado pela Constituição Federal para fiscalizar os gastos com dinheiro público. Resolução publicada no último dia 2 no Diário Oficial de Contas, reajustou de R$ 5 mil para R$ 15 mil o valor mínimo para a abertura de processo de tomada de contas especial – modalidade em que técnicos do tribunal visitam in loco o órgão acusado de dano ao erário. Para se ter uma ideia, desde 2010 já foram abertas 617 tomadas de contas especiais, 68 delas só nos primeiros três meses deste ano.
“Resolvemos ser seletivos, porque em uma tomada de contas você mobiliza muita gente para a apuração e tem uma despesa grande. Acaba gastando na apuração mais do que o valor que será cobrado”, justifica o presidente do TCE, conselheiro Antonio Carlos Andrada. Ele nega que a medida acabará beneficiando corruptos. “Antes de chegar na tomada de contas, você tem uma série de outros mecanismos para cobrar os dados”, alega. Isso porque, de acordo com o conselheiro, todo gasto de dinheiro público deve ser justificado não apenas ao TCE, mas também a quem repassou a verba pública para um órgão, município ou estado.
Nesses casos, há autonomia do cedente para cobrar os dados sobre os gastos ou mesmo suspender outro repasse de verbas em razão da falta de prestação de contas de um envio anterior. “E mesmo quando o caso chega ao TCE, antes da tomada há a abertura de um processo e aplicação de multa em caso de descumprimento da decisão”, completou Andrada. Em um caso como esse, o TCE envia um comunicado cobrando a comprovação de gastos. Se descumprido, há a aplicação de multa e a abertura da tomada de contas especial – a partir de agora desde que o valor ultrapasse R$ 15 mil.
Omissão de dever
O procurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, Glaydson Soprani Massaria, completa que a obrigação primeira de apurar o desvio é do ente envolvido no repasse da verba. “Se ele não recebe a justificativa dos gastos, instaura uma tomada de contas e julga. Esse julgamento é que vem para o TCE, que agora só vai querer o envio do que ultrapassar R$ 15 mil”, explicou ele, ao também negar que a medida vá beneficiar quem desvia dinheiro.
Com a mesma justificativa, os TCEs de Goiás e Santa Catarina estabeleceram o piso de R$ 30 mil e R$ 28 mil, respectivamente. No Tribunal de Contas da União (TCU), ele é de R$ 30 mil, segundo informações do tribunal mineiro.
Na prática, a medida significará que o TCE nem vai ficar sabendo se houve um convênio inferior a R$ 15 mil e se as contas referentes ao gasto foram prestadas. A tomada de contas especial está prevista no artigo 47 da Lei Complementar 102/08, que prevê apuração dos fatos e quantificação do dano quando caracterizadas a omissão do dever de prestar contas; a falta de comprovação da aplicação de recursos repassados pelo estado ou município; a ocorrência de desfalque ou desvio de dinheiro, bens ou valores públicos e a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico que possa resultar dano ao erário.