Jornal Estado de Minas

Incra faz pente-fino em assentamentos no Norte de Minas

Luiz Ribeiro

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) iniciou ontem uma operação pente-fino no Projeto de Assentamento Hebert Souza (PA Betinho), no distrito de Engenheiro Dolabela, em Bocaiúva, no Norte de Minas. O Incra pretende identificar todos os lotes vendidos ou ocupados irregularmente na área, expulsar os arrendatários ou ocupantes ilegais e destinar os terrenos àqueles que realmente são produtores rurais. A força-tarefa é resultante da série de reportagens “Terra improdutiva”, publicada pelo Estado de Minas em fevereiro e março, que mostrou a venda e o uso ilegal de terrenos destinados à reforma agrária no Norte de Minas, no Alto Paranaíba e no Triângulo Mineiro.

 

Depois da publicação da série de reportagens, a Superintendência Regional do Incra admitiu que existem irregularidades em todos os 266 projetos de assentamento do estado, com o PA Betinho sendo considerado um caso “emblemático”. Maior área da reforma agrária da Região Sudeste, com 24,6 mil hectares, o PA Betinho foi criado há 13 anos, sendo assentadas 736 famílias em lotes que variam de 14 a 20 hectares. A proposta era de que ele seria um projeto modelo para a reforma agrária no país. Porém, conforme revelou o EM, pelo menos metade dos lotes foram parar nas mãos de pessoas sem qualquer ligação com a agricultura, incluindo um prefeito, vereadores, parentes de políticos, comerciantes e até policiais.

 

Em vez de pequenas lavouras, o que se vê nos terrenos é criação de gado de raça e casas bem construídas, como se fossem áreas de lazer. Em um dos terrenos, às margens da BR-135, foram instalados até uma pista de vaquejada e um criatório de cavalo de raça, como se fosse um haras.

A força-tarefa conta com participação de nove servidores do Incra, com a cobertura da Polícia Federal e o apoio do Ministério Público Federal (PF). O superintendente do Incra em Minas, Carlos Calazans, lembrou que o “mutirão” para a regularização de lotes em área de reforma agrária é inédito no país. “Durante 20 dias vamos percorrer um a um todos os lotes do assentamento, para verificar o perfil de cada ocupante. Vamos identificar aqueles que têm perfil de trabalhador rural, que poderão continuar no assentamento. Os outros serão notificados a deixar o assentamento”, informou Calazans.

“Já sabemos que dos 756 lotes do PA Betinho 50% estão em situação irregular. Dessa forma, cerca de 370 ocupantes ilegais terão que deixar o assentamento”, assegura o superintendente, lembrando que a intenção é repetir o pente-fino também nos assentamentos Santo Antônio e  13 de Maio, em Ibiá, no Alto Paranaíba, onde, conforme revelaram as reportagens do EM, terrenos que seriam destinados à pequena produção na reforma agrária, foram comercializados e acabaram virando sítios para lazer em fins de semana.

Prefeito

Entre as pessoas que se apropriaram irregularmente de terrenos no projeto de assentamento em Bocaiúva estão o prefeito de Engenheiro Navarro, Sileno Lopes (PP), e os vereadores Júnior da Carne Seca, de Engenheiro Navarro; e Teu de Souza, de Buenópolis. Um policial rodoviário federal também é apontado como o verdadeiro dono de um lote no assentamento que estaria em nome de outra pessoa. No caso de Sileno Lopes, a suspeita é de que ele estaria usando pelo menos 14 lotes, por meio de compra, aluguel ou arrendamento. “Independentemente se for um, dois ou mais lotes, o prefeito será notificado a entregá-los dentro do prazo de 30 dias. Ele também poderá responder a processo criminal”, assegurou Calazans.

Recursos

Calazans informou que conseguiu na Superintendência Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Supram Norte) licença especial para a construção de 436 casas no projeto. Com isso, os R$ 4,2 milhões alocados pelo governo federal, que estavam bloqueados, serão liberados. Cada família em situação regular deve receber R$ 15 mil.