Brasília – O depoimento do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, marcado para amanhã na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista que leva seu nome, é visto pelos parlamentares que a integram como a volta à origem. Ainda que Cachoeira, no papel de acusado/testemunha, não fale nada nem dê qualquer pista sobre seus negócios, estão todos na torcida para que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello rejeite o habeas corpus apresentado pela defesa de Cachoeira para que seu depoimento seja adiado. “Se ele for, acredito que falará de forma superficial. Será apenas um evento, sem grandes respostas. Mas é simbólico para retomarmos o eixo”, disse ao Estado de Minas o deputado Luiz Pitiman (PMDB-DF), que integra o colegiado.
A ida do bicheiro ao Congresso Nacional, porém, ainda não é certa. O ministro Celso de Mello deve decidir liminarmente hoje se aceita o habeas corpus apresentado pela defesa de Cachoeira. No documento entregue na sexta-feira ao STF, Márcio Thomaz Bastos, advogado do bicheiro, alega que não teve acesso a todas as provas que os deputados e senadores da comissão têm contra seu cliente, o que impede sua defesa. “É imperativo que Carlos Augusto e seus advogados conheçam previamente todas as provas que poderão servir de substrato aos questionamentos que decerto lhe serão dirigidos pelos parlamentares”, argumenta Bastos.
Segundo o professor de direito Mamede Said, a alegação é válida. “É um direito fundamental de qualquer pessoa, por mais culpada que seja, somente se pronunciar quando tem acesso aos motivos pelos quais é acusada, respeitando o princípio do contraditório e da ampla defesa”, explica. Said acredita, portanto, que a tendência do STF é, se ficar provado que a defesa realmente não teve acesso integral ao inquérito, liberar Cachoeira de ir ao Congresso. “Mas isso não o isenta de comparecer à CPI em algum momento”, pondera o professor. “O Supremo pode também dizer que ele deve ir, mas pode exercer o direito ao silêncio para não produzir provas contra si mesmo.”
Provas
Os integrantes da CPI trabalham com a última possibilidade sugerida por Said. “Não há qualquer embasamento para que o depoimento seja adiado, mas Cachoeira tem o direito de silêncio e, quanto a isso, não há muito a fazer”, comenta o deputado federal Cândido Vaccarezza (PT-SP). “Esse é um caso que avançou graças às provas técnicas produzidas pelo MP e pela PF e não por confissões ou testemunhas. Então, não vamos imaginar que o réu vá chegar à CPI, abrir uma maleta, tirar um chicote e começar a se flagelar, confessando crimes”, acrescenta o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ).
Na quinta-feira, os integrantes da comissão vão colher os depoimentos dos procuradores da República Daniel de Resende Salgado e Léa Batista de Oliveira, responsáveis pela Operação Monte Carlo, que resultou na prisão de Cachoeira. No mesmo dia, os parlamentares devem votar requerimentos de novas convocações, como a do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). Os depoimentos de pessoas flagradas nas escutas da PF como colaboradores do esquema do bicheiro estão marcados para a próxima semana, quando o próprio Cachoeira deve voltar ao Congresso para depor no Conselho de Ética do Senado, que apura sua relação com o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO).