Jornal Estado de Minas

Bens públicos: igreja vai ser dona da rua em BH

Proposta de vereador, que autoriza negócio destinado à construção de templo batista para 30 mil pessoas, passou em primeiro turno no plenário da Câmara com o aval de 29 colegas

Alice Maciel
Não é só a Prefeitura de Belo Horizonte que quer colocar à venda ruas da cidade, como prevê o Projeto de Lei 1.698/2011, que deve ser votado na semana que vem na Câmara Municipal. Sem levar em consideração a Lei Orgânica do Município, 29 dos 41 vereadores da capital mineira aprovaram na reunião extraordinária de segunda-feira, em primeiro turno, uma proposta que autoriza a venda ou permuta de trechos de ruas no Bairro São Cristóvão, na Região Nordeste, para a Igreja Batista da Lagoinha. Autor do projeto, que recebeu outras 21 assinaturas, o vereador João Oscar (PRP), membro da igreja, negou que a atitude tenha cunho político.
A intenção é construir no trecho da Rua Ipê e nas ruas não implantadas Serra Negra e Samuel Salles Barbosa um novo templo, com capacidade para 30 mil pessoas. De acordo com João Oscar, atualmente a igreja comporta 7 mil membros, mas tem 45 mil fiéis. “A ampliação é uma necessidade. As ruas não têm pavimentação, nenhuma utilidade, não tem tráfego, e os terrenos do entorno são todos da igreja”, justificou o parlamentar. O fato é que o espaço público – onde há inclusive postes demonstrando a existência de ruas – já virou estacionamento da igreja antes mesmo de ser vendido.

A ideia de fechar, principalmente o trecho da Rua Ipê, que liga a Rua Manoel Macedo à Caetano Marques, não agrada aos moradores do bairro. A escritora Silvana Resende conta que passa pelo local diariamente. “Hoje, por exemplo, fui até a Rua Arariba fazer umas compras e, para isso, tenho que passar por esse trecho”, disse. A entrega de correspondências também será prejudicada, caso o templo seja construído nas vias. “ Se isso acontecer, terei de fazer entregas alternadas, ir um dia à Rua Caetano Marques e outro à Manoel Macedo. Com essa passagem eu consigo entregar cartas no mesmo dia nas duas ruas”, observou o carteiro Paulo Vitor Moreira dos Santos.

Apesar de a Lei Orgânica da capital prever que cabe ao prefeito a administração dos bens municipais, tendo suas decisões apenas endossadas pelo Legislativo, um projeto parecido com o do vereador João Oscar já passou na Casa. De autoria do vereador Silvinho Rezende (PT) e de cinco colegas, o projeto que virou lei em 2011 doou um terreno da prefeitura para a Matriz de Santo Antônio, em Venda Nova. Na justificativa, Silvinho destaca que a instituição “apresenta um núcleo de formação cristã, humanística e de cidadania”.

Pagamento

O projeto de lei que vai beneficiar os evangélicos estabelece o parcelamento do pagamento, com correção pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e os juros que poderão ser cobrados da Igreja Batista da Lagoinha (1% ao mês). A proposta de João Oscar também autoriza o município a receber como pagamento pelo terreno ocupado um imóvel de valor menor, desde que a diferença em relação ao preço da área vendida seja paga pelo comprador.

“O projeto já passou pelas comissões e foi debatido inclusive com representantes da prefeitura, que não viram problema em dar continuidade à proposta”, ressalta o parlamentar. Ele afirma que o fato de pedir a autorização dos colegas para a venda ou permuta das ruas não significa que, necessariamente, o Executivo vá fazer as negociações.

De acordo com o obreiro da Igreja Batista da Lagoinha, Breno Inácio, a igreja já fez reuniões com a prefeitura. Segundo ele, as negociações devem ser feitas por meio de permuta, ou seja, a igreja dará um terreno em troca das ruas. “As ruas não implantadas passam dentro de um terreno que é nosso, de 32 metros quadrados”, informou Inácio.