O advogado Genival Tourinho, deputado cassado durante a ditadura militar, revelou que o então tenente-coronel Octávio Aguiar Medeiros torturou presos quando estava lotado nas dependências da 4ª Região Militar, na Rua Juiz de Fora, Barro Preto, Região Centro-Sul da capital. Conhecido à época apenas como Medeiros, o oficial do Exército teria sido o responsável pelo espancamento de vários presos políticos, durante o período de repressão. O general, que chefiou o temido Serviço Nacional de Informações (SNI), de 1978 a 1985, e ainda o Comando Militar da Amazônia (CMA), tem seu nome na relação de torturadores do livro Brasil: tortura nunca mais. Coincidência ou não, em seu depoimento ao Conselho de Defesa dos Direitos Humanos de Minas Gerais (Conedh-MG), em 25 de outubro de 2001, a presidente Dilma Rousseff citou como um de seus torturadores em Minas um homem que atendia pela alcunha de dr. Medeiros.
O general Medeiros, que deixou a cena nacional em 1987 ao entrar para a reserva, cruzou o caminho de Dilma ao presidir o Inquérito Policial Militar (IPM) que resultou na prisão da então militante, em 1970, no Rio de Janeiro. À época, o militar chefiava o Centro de Preparação de Oficiais da Reseva (CPOR), em Belo Horizonte. Atuando em Minas, o general Medeiros ganhou notoriedade nacional ao conseguir pôr fim a um dos mais aguerridos grupos de resistência à ditadura militar, o Comando de Libertação Nacional, o Colina, ao qual a presidente era filiada.
Com intensa vida política, que o levou à Câmara dos Deputados em 1969 e depois na legislatura de 1974, Tourinho revela que, além do general Medeiros, o também temido general Golbery do Couto e Silva viveu por dois anos em Belo Horizonte, servindo também na 4ª Divisão do Exército, ainda no posto de major. Segundo o advogado, Golbery – considerado um dos ideólogos do golpe militar de 1964 que depôs o presidente João Goulart e chegou à chefia da Casa Civil no governo do general Ernesto Geisel em 1974 – não via o general Medeiros com bons olhos. O advogado lembra que Golbery, depois de deixar o governo, classificou o colega de farda como “trapalhão”, durante um encontro dos dois na sede do extinto Banco Cidade de São Paulo, em Brasília, às 16h. “Golbery queria se inteirar das circunstâncias do atentado que sofri em 1980, a 300 metros do aeroporto de Brasília, ocorrido no dia anterior.” Tourinho teve o carro alvejado por tiros logo depois de denunciar envolvimento de oficiais do Exército em ações de extrema direita.
Trapalhada
Segundo Tourinho, que relatou o encontro em seu livro Baioneta calada e baioneta falada, depois de ouvir a descrição do atentado, Golbery apontou o general Medeiros como suposto autor. “Ah, bom, eu estava meio em dúvida, porque isso não está me parecendo coisa do Pires (Leônidas Pires, ministro do Exército durante o governo José Sarney). Está me cheirando a coisa do Medeiros... Eu não tenho dúvida nenhuma em dizer que efetivamente isso foi trapalhada do Medeiros”, conta o advogado em um trecho do livro. Antes do atentado, Genival Tourinho denunciou os generais Antônio Bandeira, Milton Tavares de Souza e José Luiz Coelho como responsáveis pelo que chamou de Operação Cristal, que incluía uma série de atentados terroristas.
De janeiro a agosto de 1980 foram registrados no país 46 atentados políticos contra banca de jornais, associações civis, redações, entre outros, além do que causou a morte da funcionária da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio Lyda Monteiro da Silva. A denúncia de Tourinho não foi investigada, mas lhe rendeu um processo com base na Lei de Segurança Nacional, que resultou, em 1981, na sua condenação a seis meses de prisão e na cassação de direitos políticos.
Memória
Tentativa frustrada de golpe
A passagem do general Golbery do Couto e Silva por Belo Horizonte, foi motivada por uma tentativa frustrada de golpe contra o governo de Juscelino Kubitschek. Em 24 de agosto de 1954, quando Getúlio Vargas se suicidou, Golbery era adjunto do Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra (ESG). Em fevereiro de 1955, JK foi lançado pelo Partido Social Democrático (PSD) como candidato a presidente da República, tendo como vice João Goulart. O grupo militar da ESG, liderado por Golbery, não apoiou Juscelino e, quando ele foi eleito, tentaram impedir sua posse com um golpe. Suas aspirações foram barradas no Movimento de 11 de Novembro, chefiado pelo ministro da Guerra de João Café Filho, general Henrique Lott, que assegurou a posse de JK e Goulart. Em razão disso, Golbery foi preso por oito dias e depois transferido para a 4ª Divisão do Exército na capital mineira.