Nessa interceptação, Tadeu Leite determina ao servidor Romilson Fagundes da Cunha, do setor de licitação, também preso pela Polícia Federal, que autorize o início das obras do cemitério mesmo sem os documentos do contrato, levados por auditores do TCE (veja fac-simile de trecho do relatório da PF). O prefeito não foi alvo de grampo mas apareceu nas interceptações por causa de telefonemas dados por ele para pessoas investigadas.
Outro lado Em nota, a Prefeitura de Montes Claros afirma que o contrato do cemitério "está em sua fase inicial e que não houve nenhum pagamento relativo ao mesmo". Diz ainda que a administração pública só "tomou conhecimento de eventuais irregularidades envolvendo as pessoas e empresas em questão a partir da divulgação da citada operação pela Polícia Federal".
Evandro Garcia também aparece em um dos grampos, articulando para tirar da concorrência das obras do cemitério uma empresa interessada no certame. Uma das estratégias tratadas por ele com Elisângela Pereira da Fonseca, cunhada do empresário e sócia dele na EPG Construções, é colocar um valor menor para vencer a disputa e depois fazer aditivos no contrato para elevar o preço da obra. Também são citadas no relatório conversas do empresário com o ex-secretário de Administração e Fazenda de Tadeu Leite, Luiz Eduardo Mota Fonseca, apontado pela PF como lobista e executor em Montes Claros das obras das empresas do grupo de Evandro Garcia. "Como é que faz para tirar esses caras?", pergunta o empresário, sendo tranquilizado por Luiz, que avisa: "Já deve ter uma recomendação interna para tirar eles" (sic). Em outra conversa, Luiz Eduardo conta que está tudo certo e diz que a desclassificação da concorrente e a vitória da Radier seriam oficializadas em 28 de março.
Pouco dias depois dessa conversa – em 30 de março –, o resultado da licitação foi publicado no Minas Gerais, diário oficial do estado. O documento, assinado justamente na data citada no diálogo, apesar de a publicação ter ocorrido dois dias depois, inabilita a Retromáquinas e declara a Radie vencedora do certame.
Em 31 de março, Evandro Garcia disse, em outro telefonema, que Luiz Eduardo passasse na sede da Norte Vale para pegar R$ 22 mil. “Embora Luiz (Eduardo) seja um dos executores de obras em que as empresas de Evandro Garcia sagraram-se vencedoras nos processos de licitação, salta aos olhos que esse pagamento esteja sendo efetuado exatamente um dia após o sucesso na fraude no processo licitatório envolvendo a contratação com a Prefeitura de Montes Claros”. Na conversa gravada, Evandro e Luiz Eduardo agendavam ainda um encontro para “definir direitinho” a forma de execução da obra. “Infere-se desse áudio que, uma vez atingido o primeiro objetivo (manipulação do processo de licitação), entra a segunda etapa (fraude na execução da obra), sem prejuízo de eventual aditamento ao valor do contrato de forma a aumentar as margens de lucro”, diz um dos trechos do relatório, que trata exclusivamente da Prefeitura de Montes Claros.
Entenda o caso
» Irregularidades em série
Operação conjunta do Ministério Público estadual e Polícia Federal prendeu na quinta-feira 16 pessoas suspeitas de comandar um esquema de fraudes em licitações e obras em 37 prefeituras do Norte de Minas.
De acordo com as investigações, as irregularidades alcançam a cifra de pelo menos R$ 100 milhões.
A quadrilha, de acordo com o MP, atuava desde 1994 e era comandada pelo casal Evandro Leite Garcia e Maria das Graças Gonçalves Garcia, donos das construtoras Norte Vale, Radier Construções e Construtora EPG, todas com sede em Montes Claros.
Juntas, as três empresas firmaram cerca de uma centena de contratos com prefeituras da região para a realização de diversas obras, como construção de postos de saúde, casas populares, rede de esgotamento sanitário, escolas municipais e de limpeza urbana.