O coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra foi condenado pela Justiça de São Paulo a pagar uma indenização de R$ 100 mil à família do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, morto sob tortura em 19 de julho de 1971 nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna), núcleo de repressão do regime militar então sob comando do acusado.
A sentença é da juíza Claudia de Lima Menge, da 20ª Vara Cível da Capital. Cabe recurso.
É o primeiro revés do coronel Ustra no âmbito judicial. O Ministério Público Federal, frequentemente, fustiga o militar, a ele atribuindo torturas e mortes nos porões.
Ustra terá que pagar R$ 50 mil a Regina Maria Merlino Dias de Almeida, irmã da vítima, e a Angela Maria Mendes de Almeida, sua companheira.
Segundo Claudia de Lima Menge, o processo não guarda relação com a Lei de Anistia, de 1979, por esta ser "de âmbito exclusivamente penal".
"Não é de olvidar, porém, que até mesmo a anistia assim referendada pela Corte Suprema não está infensa a discussões, tendo em conta subsequente julgamento proferido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em que o Brasil foi condenado pelo desaparecimento de militantes na guerrilha do Araguaia, enquadrados os fatos como crimes contra a humanidade e declarados imprescritíveis", destaca a juíza.
Militantes do Partido Operário Comunista (POC), Merlino e Angela Mendes de Almeida estavam na clandestinidade desde 1968. Em 1971 após um período na França, o jornalista voltou ao Brasil. Em 15 de julho, quando visitava a família em Santos, litoral paulista, foi levado preso por agentes do DOI-Codi.
Segundo relatos de testemunhas, nas dependências do órgão Merlino passou por severas sessões de tortura, que acarretaram sua morte quatro dias depois. Companheiros de prisão, entre eles o ex-ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vanucchi, que depôs perante a 20.ª Vara Cível de São Paulo, afirmam tê-lo visto com evidentes sintomas de falta de circulação nas pernas, consequência das horas no pau de arara.
A versão oficial para a morte de Merlino foi suicídio - ele teria se jogado na frente de um carro quando era transportado ao Rio Grande do Sul para reconhecer colegas militantes.
O advogado Paulo Alves Esteves, que defende o coronel Ustra, disse que vai recorrer da sentença ao Tribunal de Justiça do Estado. "A condenação desrespeita a Lei de Anistia", observou Esteves.