Brasília – O pleito municipal desse ano é considerado histórico pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) por ser o primeiro com aplicação integral da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010). Essa novidade, entretanto, preocupa tanto os advogados quanto o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), porque falta jurisprudência para guiar sua aplicação.
Apesar do entusiasmo provocado pela lei, que é resultado de mobilização popular, a presidenta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, prevê que poderá haver interpretações diferentes da norma entre os juízes eleitorais de todo o país.
“Sempre que uma nova lei aparece, ela permite interpretações diferentes, porque ainda não está consolidada uma jurisprudência”, disse a ministra. A jurisprudência se forma após decisões reiteradas dos tribunais sobre determinada interpretação da lei.
Segundo levantamento feito pelo jornal O Globo no mês passado, apenas no TSE, há 1,6 mil processos relativos às eleições municipais de 2008. O tribunal é a última instância para demandas na Justiça Eleitoral.
Para Ophir Cavalcante, a situação “efetivamente é preocupante”. Ele sugere que “se faça um mutirão e que seja dedicado mais tempo do que tem sido para limpar toda essa pauta, para se chegar às eleições mais ou menos em tempo real entre as impugnações e os julgamentos”.
Conforme Cármen Lúcia, a celeridade do julgamento de processos “é o maior desafio que a Justiça no mundo inteiro tem” e, em especial, a Justiça Eleitoral, “porque os prazos são muito curtos”. Os juizes eleitorais, por exemplo, têm somente o período que separa a eleição e a posse dos vencedores para tomar decisões que podem modificar o resultado das urnas.
A ministra também se mostrou preocupada com a demora nos julgamentos. “Quanto mais rápido nós andarmos melhor, este é o nosso desafio. É nisto que eu estou empenhada até a alma, para dar celeridade, porque eu sei que, quando o cidadão e a imprensa falam que ainda há processos, sinto que eu ainda não fiz o que precisava fazer, embora tenha feito tudo que eu podia”.
Além do passivo do pleito passado e das dúvidas sobre a Lei da Ficha Limpa, a prestação de contas dos prefeitos também poderá gerar processos na Justiça Eleitoral. Na semana passada, o TSE decidiu que apenas a apresentação das contas (não necessariamente a aprovação pelos tribunais de contas) é suficiente para os atuais prefeitos participarem da eleição.
A ministra Cármen Lúcia, que foi voto vencido na decisão do TSE sobre a prestação de contas, lembra que “não significa todo mundo que apresente tenha a conta desaprovada [no futuro]”. No entanto, se os prefeitos liberados para concorrer tiverem, posteriormente, a contas consideradas sujas, terão a posse comprometida, causando insegurança jurídica.
Ophir Cavalcante criticou a decisão do TSE. “Houve um equivoco na reinterpretação dessa questão. O entendimento anterior atendia muito mais aos anseios da sociedade”, afirmou.
Cármen Lúcia e Ophir Cavalcante assinaram nesta terça-feira em Brasília um protocolo entre o TSE e a OAB para que a Ordem atue em campanhas de esclarecimento da população sobre as eleições e ajude a coibir irregularidades, como o abuso do poder econômico.