Jornal Estado de Minas

Prefeituras mineiras estão na mira da PF pelo desvio de R$ 330 milhões

Cifra milionária foi desviada da educação, saúde e obras em apenas 1% dos 5.565 municípios do país, segundo investigações da Polícia Federal realizadas no primeiro semestre deste ano

Maria Clara Prates

Apenas nos seis primeiros meses deste ano, a Polícia Federal constatou que, em pouco mais de 1% dos municípios brasileiros, foram desviados R$ 330 milhões de áreas como merenda e transporte escolar, saúde e obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). As investigações apontam que em 60 prefeituras de todo o Brasil foram fraudadas licitações, superfaturadas obras ou simplesmente os valores desapareceram por meio de notas fiscais frias. Em Minas Gerais, estado com maior número de municípios do país, 37 prefeituras sofreram uma devassa em razão das fraudes. De janeiro até agora, foram 11 operações da PF em todo o país com alvo específico nos recursos públicos destinados às administrações municipais.

Em uma única operação, a Máscara da Sanidade, deflagrada em 21 de junho, 36 administrações municipais no Norte de Minas foram pilhadas favorecendo empreiteiras em licitações para a realização de obras, que consumiram cerca de R$ 100 milhões. Cinco dias depois, foi a vez de Montes Claros, na mesma região, receber uma operação da PF, a Laranja com Pequi, em razão de fraude em licitação da merenda escolar e refeições para presidiários. O valor: R$ 50 milhões. Isso significa que só em Minas foram abocanhados em golpes, segundo as investigações da PF, R$ 150 milhões, ou 45% do total apurado no país.

O segundo lugar no ranking dos assaltos aos cofres públicos foi conquistado pela Paraíba, onde 13 prefeituras se envolveram em fraudes com recursos liberados pelo Ministério do Turismo para realização de festas, no valor de R$ 65 milhões. Conhecidas por seus eventos juninos, 13 prefeituras paraibanas montaram processos de concorrência, dispensaram licitação e apresentaram documentos falsos, para beneficiar até mesmo empresas fantasmas na realização do tradicional são-joão, de festas de santos padroeiros e até a passagem de ano. A Operação Pão e Circo, da PF com o Ministério Público Estadual e Controladoria Geral da União (CGU), desencadeada também em junho, terminou com a prisão de três prefeitos, uma primeira-dama, secretários municipais e empresários integrantes do esquema.

Para tornar mais eficaz sua atuação na repressão a esse tipo de criminalidade organizada, o Departamento de Polícia Federal criou em janeiro o Serviço de Repressão a Desvios de Recursos Públicos dentro da coordenação-geral de Polícia Fazendária, que tem como competência ainda a repressão a crimes cibernéticos, fazendários, previdenciários, contra o meio ambiente e patrimônio público, além do serviço de análise de dados de inteligência policial. O serviço já está em funcionamento em 16 estados, além do Distrito Federal, e deve ser ampliado. O delegado federal Oslain Santana, diretor de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), à qual está subordinada a Divisão de Polícia Fazendária, à época da criação da nova estrutura, justificou: “Com a especialização, teremos uma otimização de resultados e ganho de eficiência”.

Líder
Apesar dos altos valores desviados em Minas, a Prefeitura de Presidente Kennedy, município do litoral Sul do Espírito Santo, lidera o rombo individualmente: foram desviados pelo prefeito R$ 50 milhões, ou seja, um terço do total que se perdeu nas 37 administrações mineiras. Em abril, o prefeito Reginaldo dos Santos Quinta foi preso durante a Operação Lee Oswald por liderar quadrilha responsável por fraudes em licitações, superfaturamentos, desvio de verbas, além de pagamentos indevidos em contratos de serviços e compra de material no Espírito Santo. De acordo com a polícia, os recursos municipais eram desviados para os integrantes da quadrilha. As licitações eram montadas a partir de editais que restringiam a concorrência e eram direcionadas para grupos econômicos previamente escolhidos, que simulavam legalidade do processo.

O ralo aberto também acertou em cheio a Prefeitura de Juazeiro (BA), onde foram desviados R$ 14 milhões para obras do PAC. As obras faziam parte do projeto de revitalização do Rio São Francisco, com a implementação de rede coletora de esgoto, ramais condominiais, ligações domiciliares e intradomiciliares e estação elevatória de água. Os recursos foram liberados por meio de convênio com a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf). A construção, além de problemas na licitação, apresentou superfaturamento e alguns serviços previstos não foram feitos, apesar do pagamento antecipado.