Os três ex-dirigentes do Banco Rural José Roberto Salgado, Vinicius Samarane e Ayanna Tenório não tiveram qualquer responsabilidade na concessão dos empréstimos, que foram lícitos, às empresas do empresário Marcos Valério e ao Partido dos Trabalhadores (PT), que teriam alimentado o caixa para pagamento de propina à base aliada do governo de Luiz Inácio Lula da Silva em troca de apoio político, conhecido como mensalão. Essa foi a tese apresentada ontem pelos advogados de defesa dos ex-diretores, Márcio Thomaz Bastos, ex-ministro da Justiça; Maurício Campos, ex-secretário de Defesa Social de Minas; e Antônio Carlos Marins ao apresentarem suas alegações finais. Entre citações de Rui Barbosa e Fernando Pessoa, os defensores esmiuçaram o processo para apontar o que consideraram ausência de provas que sustentem as acusações de gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, apresentadas pela Procuradoria Geral da República.
Com teses idênticas, as defesas frisaram para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o quinto dia de julgamento do escândalo do mensalão, que as transações bancárias ocorreram em 2003, quando nenhum deles tinha assumido função de direção. De acordo com eles, a autorização das transações foi de responsabilidade de José Augusto Dumont, então responsável pelo banco, que morreu em uma acidente de trânsito em 2004. Ao subir à tribuna, o advogado Thomaz Bastos apelou para a consciência dos ministros, pedindo cuidado redobrado com o caso, já que os réus não terão direito a revisão de sentença. “É um julgamento de bala de prata, feito uma vez só, e por isso, como se trata de destinos de pessoas, é preciso um duplo cuidado". Na abertura da primeira sessão do julgamento, na quinta-feira, o Supremo negou pedido de Bastos de desmembramento do processo contra 38 réus, sob a alegação de que no STF os acusados não teriam direito a dupla jurisdição.
De acordo com o ex-ministro, entre mais de três centenas de testemunhas, apenas uma acusa José Roberto Salgado, ex-vice presidente da instituição, de fazer parte do esquema: o ex-funcionário do banco Carlos Godinho, que seria um “falsário”. “O depoimento dele serviu apenas para o oferecimento da denúncia. Agora, em sua sustentação oral, o procurador Roberto Gurgel o abandonou, porque ficou comprovado que ele falsificou assinatura nos autos”, disse Bastos. O advogado assinalou ainda que à época da concessão de empréstimos às empresas de Marcos Valério e ao PT Salgado exercia a função de diretor da área internacional e de câmbio.
Essa linha de raciocínio foi seguida pelo seu sucessor na tribuna, advogado Maurício Campos Júnior, responsável pela defesa de Vinícius Samarane, ex-diretor da instituição. O defensor garantiu que, apesar de não ter autorizado os empréstimos, quando foi chamado a dar parecer sobre a renovação dos contratos seu cliente foi contra. “O excesso da acusação parece evidente. Arrastam-se para esse processo pessoas que não se encontram no tempo do que ocorreu. As rotinas bancárias eram, segundo o Banco Central, praticadas por todas as instituições financeiras do país naquele tempo”, afirmou. Antônio Cláudio Marins disse que sua cliente, Ayanna Tenório, tinha função apenas de gestão de recursos humanos, e quando foi contratada pela instituição financeira, em abril de 2004, os empréstimos já tinham sido autorizados. “Ela foi denunciada por causa do organograma (do banco). E o que mais? Mais nada”, conclui.
Cassação
Os ministros do Supremo ouviram ainda a defesa do deputado federal João Paulo Cunha (PT/SP) – que à época do escândalo era presidente da Câmara dos Deputados –, acusado de receber R$ 50 mil do suposto esquema de pagamento de propina a parlamentares. Seu advogado, Alberto Toron, disse que o valor se refere ao pagamento de serviços da SMP&B prestados à Câmara. "Onde está o peculado? Em lugar nenhum". Ele lembrou também que João Paulo Cunha sofreu processo de cassação, mas o mandato foi mantido. Por fim, o advogado José Roberto Leal alegou a inocência do então ministro da Secretaria de Comunicação Luiz Gushiken, acusado de orquestrar desvio do fundo Visanet, ligado ao Banco do Brasil, para a empresa de Valério. O procurador-geral da República já havia pedido a absolvição do réu sob a alegação de que as provas contra ele são insuficientes.