O coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra, apontado por organizações de direitos humanos como mais notório torturador dos tempos do regime militar, acaba de perder uma batalha. Por unanimidade, a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou hoje, o recurso no qual ele pedia a reformulação da sentença de primeira instância em que foi reconhecido como torturador.
Essa é a primeira vez que uma decisão envolvendo a tortura no regime militar é referendada por um colegiado de segunda instância. "Foi uma conquista inédita na Justiça brasileira", comemorou o advogado Fábio Konder Comparato, representante da família Teles, autora da ação, ao deixar o tribunal, na Praça da Sé, no centro de São Paulo.
A decisão do Tribunal de Justiça confirma a sentença proferida em 2008 pelo juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23.ª Vara Cível. Mas não põe fim ao debate. O advogado do coronel, Paulo Alves Esteves, já anunciou disse que irá apresentar um embargo, contestando a decisão.
"Na argumentação que apresentei aos desembargadores, tratei sobretudo das leis especiais que permitiram a transição democrática, incluindo a que deu origem à Comissão Nacional da Verdade", explicou. "Mas o tribunal não debateu nenhum desses argumentos, o que constitui uma omissão."
Esse foi o primeiro revés importante nos embates judiciais do ex-comandante do DOI-Codi com ex-prisioneiros políticos. Até agora ele obteve sucesso em todos as discussões que envolvem questões penais e pedem sua condenação. A derrota de agora ocorreu no plano civil.
O que se decidiu, basicamente, foi atender ao pedido de Maria Amélia, César Augusto e Crimeia Alice Schmdt de Almeida para que fosse declarada a existência de uma relação jurídica de responsabilidade civil entre eles o coronel Ustra, nascida com a tortura, causadora de danos morais.
O relator da apelação, desembargador Rui Cascaldi, assinalou que o réu era responsável pela integridade física dos prisioneiros e que a tortura era ilegal. "A lei proibia a tortura de qualquer pessoa detida, mesmo naquela época", insistiu, referindo-se ao período autoritário. Lembrou em seguida artigos da carta constitucional outorgada em 1969, que vedavam a prática da tortura.
Também participaram do julgamento os desembargadores Carlos Augusto De Santi Ribeiro e Hamilton Elliot Akel.
O coronel Ustra comandou o Doi-Codi no período de 29 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974. Segundo organizações de direitos humanos, 502 pessoas foram torturados naquele local neste período. Desse conjunto, 40 teriam sido executadas.