Jornal Estado de Minas

Consenso une votos dos ministros do STF no julgamento do mensalão

Votos do revisor coincidem com os do relator, com quem tem travado fortes embates: ambos consideram Valério e ex-diretor do BB culpados

Maria Clara Prates
O empresário Marcos Valério, acusado de ser o operador do mensalão, e o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, apontado como colaborador do esquema, conseguiram o que parecia impossível: o consenso entre o relator, Joaquim Barbosa, e o ministro revisor da Ação Penal 470, Ricardo Lewandowski. Ambos votaram pela condenação desses réus por todos os crimes de que são acusados na primeira fatia do processo analisada. Os dois vinham se desentendendo desde o início do julgamento, no dia 4, e travaram calorosos embates durante as sessões no Supremo Tribunal Federal (STF) devido a posições divergentes. Lewandowski votou pela condenação de Pizzolatto pelos crimes de corrupção passiva, peculato – por duas vezes – e lavagem de dinheiro, por receber vantagens ilícitas em transações do fundo Visanet em contrato com a DNA Propaganda, empresa de Valério. Já em relação ao empresário e seus sócios, assim como Barbosa, o revisor reconheceu existirem “robustas provas” para a condenação por corrupção ativa e peculato.
A situação de Pizzolato e de Valério seus sócios na DNA, Cristiano Melo Paz e Ramon Hollerbach, tornou-se mais complicada com os votos de consenso do relator e do revisor do processo do mensalão – suposto esquema de pagamento de propina a parlamentares da base aliada do primeiro governo Lula em troca da aprovação de projetos de lei de interesse do Executivo. O placar pela culpa desses réus em relação a desvios de recursos do Banco do Brasil por meio do Fundo Visanet já conta com dois dos 11 votos do plenário. Basta a concordância de mais quatro ministros para que ambos sejam condenados a prisão em regime fechado. Nos bastidores, ministros comentam que é tradição nos tribunais superiores em matérias penais seguir relator e revisor, quando há harmonia de posições entre eles. Se forem confirmadas essas condenações, Pizzolato e Marcos Valério podem pegar penas superiores a oito anos, o que leva a cumprimento inicial dentro da prisão, sem chance de prestar serviços à comunidade.

Em seu voto, Lewandowski desmontou uma a uma as alegações das defesas dos réus, a começar pela do ex-diretor do BB Henrique Pizzolato. O revisor considerou fantasiosas as alegações do ex-dirigente da instituição financeira de que teria recebido R$ 326 milhões da DNA apenas para prestar o favor de repassar o dinheiro a uma pessoa do Partido dos Trabalhadores, não identificada por ele.

Guinada


A Procuradoria Geral da República (PGR) acusa o grupo de Marcos Valério de ter pago R$ 326 mil a Pizzolato em troca de vantagens em contratos do Banco do Brasil com suas agências de publicidade. Segundo a PGR, o grupo teria recebido uma antecipação ilegal de pagamentos, por meio de autorização do então diretor da instituição financeira e se apropriado ilegalmente de R$ 2,9 milhões durante a execução do contrato com o BB, usando o chamado "bônus de volume" (prêmio de incentivo pago por veículos de comunicação a agências de publicidade para estimular a propaganda), com anuência de Pizzolato.

Lewandowski reconheceu que mudou parte de seu voto na última hora. Ele pretendia absolver Pizzolato de um dos crimes de peculato: ““Eu estava convencido até ontem (terça) à noite, quando, revendo a espécie probatória, deparei-me com documentos que me fizeram dar uma guinada de 180 graus para acompanhar o voto do ministro Joaquim Barbosa”, afirmou Lewandowski. Acostumado aos embates com o colega, o relator disse que já estava preparado para fazer uma réplica para defender sua tese quando ouviu do revisor: “Guarde sua réplica para depois”.

Da guilhotina do relator e revisor só escapou, até agora, o então ministro da Secretaria de Comunicação Social, Luiz Gushiken, que chegou a ser denunciado como integrante do núcleo financeiro do mensalão. Lewandowski deu seu voto em forma de desagravo. "As provas judiciais submetem os acusados às maiores humilhações e constrangimentos. Não existe prova qualquer nos autos de que o réu tenha participado, influenciado ou mesmo tomado conhecimento dos fatos". O ex-ministro foi denunciado por peculato sob a alegação de que tinha conhecimento do repasse irregular de R$ 73,8 milhões pelo Banco do Brasil à DNA Propaganda.