A Comissão Nacional da Verdade confirmou nessa segunda-feira que não investigará supostos crimes praticados por adversários da ditadura militar brasileira (1964-1985). Em resolução divulgada no Diário Oficial da União, os integrantes do grupo ressaltam que analisarão apenas violações de direitos humanos praticadas por agentes públicos ou pessoas a serviço do Estado.
No texto publicado no Diário Oficial da União os integrantes da comissão aproveitaram para deixar claro, também, que não vão reexaminar processos das comissões de Anistia e de Mortos e Desaparecidos - pessoas que tiveram seus pedidos de compensação e indenização rejeitados passaram a recorrer ao grupo.
A ativista Eliana Castro avaliou que a decisão de investigar apenas crimes cometidos por agentes do Estado é “importante”. “A esquerda já foi julgada, condenada e executada. Agora, no lado militar, falta julgamento”, afirma. “A ordem do Exército era matar, mas eles (agentes) extrapolaram na execução da ordem”, completa. Eliana diz que a Justiça está chegando pela metade. Ela observa que o coronel Brilhante Ustra foi “condenado” como torturador, mas não será preso. “No caso dos agentes Lício (Maciel) e (Sebastião) Curió, a Justiça também será pela metade.”
O vice-almirante Ricardo Antonio da Veiga Cabral, presidente do Clube Naval, disse que “venceu” os integrantes da comissão que defendiam investigar apenas um dos lados. “Se não vai examinar o outro lado, vai limitar. A verdade vai ficar pela metade”, avalia. “Haverá uma restrição na busca pela verdade. E os crimes da esquerda?” O Clube Naval montou um grupo para assessorar juridicamente agentes da reserva que poderiam ser convocados pela comissão. Até o momento, segundo ele, o grupo não foi procurado.
Resistência
Os integrantes da comissão sofrem resistência da área militar. Ao iniciar o trabalho, eles solicitaram ao Ministério da Defesa os arquivos da repressão às guerrilhas, que se encontram nos centros de inteligência das três Forças. Há uma semana, a Defesa enviou três caixas com papéis que, segundo os integrantes da comissão, não têm nenhuma importância.
O ministro da Defesa, Celso Amorim, já esteve na comissão para dizer que está aberto para entregar os documentos dos centros de inteligência. Mas, agora, os integrantes do grupo temem que Amorim não tenha a representatividade dos setores que impedem a entrega dos papéis, embora comande a pasta.
O próximo passo da comissão é reiterar o pedido de repasse dos documentos. A pressão de abertura dos arquivos deve aumentar nos próximos meses. Representantes de grupos de direitos humanos e pesquisadores já disseram para a Comissão da Verdade que, sem os papéis dos centros de inteligência, dificilmente o trabalho do grupo será reconhecido e aceito. A comissão busca também os arquivos dos departamentos do Serviço Nacional de Informações nos ministérios. À época o SNI tinha um núcleo em cada pasta do primeiro escalão.