Brasília – Dois nomes emblemáticos da luta contra o regime militar, que resistiram aos anos de chumbo, foram presos, voltaram à vida pública após a redemocratização, fundaram um partido que misturava a classe trabalhadora com a intelectualidade e ajudaram a eleger o primeiro presidente operário no país, enfrentam, agora, aquela que pode ser a última das grandes batalhas políticas de suas vidas. José Dirceu e José Genoino estão às vésperas de serem julgados no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo escândalo do mensalão.
Pelo histórico atual do julgamento e com base nas declarações deles mesmos nas últimas semanas, a condenação é dada como certa. Resta saber se ela virá com punições em regime fechado. Quando Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito, em 2002, Dirceu era o todo-poderoso presidente do PT e ganhou ainda mais força ao ser nomeado chefe da Casa Civil. Ainda há uma década, Genoino forçou um segundo turno contra o tucano Geraldo Alckmin na disputa pelo governo de São Paulo e, depois de perder a disputa, tornou-se presidente do PT no ano seguinte. Daqui a duas semanas, ambos poderão estar condenados por corrupção ativa. A outra acusação que pesa contra eles é formação de quadrilha, ponto que será julgado após o primeiro turno das eleições municipais.
"O Genoino é daquele jeito elétrico, entrava em uma comissão, saía para outra, fazia discursos no plenário, dava entrevistas no Salão Verde. Ele é passional", resumiu o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (PT-SP). "O Dirceu não, ele é mais calculista, estrategista, lida melhor com as adversidades", completou Tatto. "Genoino é ideológico. Dirceu, pragmático. Se assim não fosse, não traria o PL para a chapa de Lula em 2002", disse ao Estado de Minas um aliado do ex-ministro.
Quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, companheiros de Genoino ficaram preocupados com o comportamento depressivo apresentado pelo ex-presidente do PT. Ele chegou a ficar mais de um mês no quarto, com pouca disposição para receber até mesmo os amigos mais próximos. Pessoas que testemunharam aquele momento lembram do abatimento que acometeu o ex-deputado.
Com o início do julgamento, ele se tornou ainda mais tenso e nervoso. "A depressão voltou para valer", disse um interlocutor que acompanha o processo do mensalão. O advogado Luiz Fernando Pacheco reconhece que o cliente está ansioso com a proximidade da análise do caso pelos ministros do STF. "Esse processo estava dormindo há sete anos e agora vivemos os momentos finais. Claro que existe uma grande expectativa, mas Genoino está convicto da legalidade de seus atos", completou o defensor, buscando desanuviar o ambiente.
Renúncia Dirceu, ao contrário, jamais se abateu, pelo menos publicamente. Assim que o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson – também réu no processo do mensalão – o apontou como "chefe da quadrilha" do suposto esquema de pagamento de propinas à base aliada de Lula em troca de apoio político, ele renunciou ao cargo de ministro da Casa Civil, repassando a vaga para a atual presidente, Dilma Rousseff, a quem cumprimentou como "companheira de armas" (Dilma também foi guerrilheira). Em seguida, enfrentou o processo de cassação do mandato de deputado federal na Câmara.
Genoino acabou conseguindo se eleger deputado federal em 2006, mas o mandato foi mais discreto e com menos brilho do que suas passagens anteriores pela Câmara. Em 2010, não conseguiu se reeleger, permanecendo na fila dos suplentes da bancada. Graças à proximidade com os militares e com o então ministro da Justiça, Nelson Jobim, foi nomeado assessor especial do Ministério da Defesa. No início do julgamento, tirou férias de 30 dias. Agora, está de licença médica para tratamento de saúde.
José Dirceu resolveu arriscar-se na iniciativa privada e virou consultor de diversas empresas, valendo-se de sua experiência como ex-homem forte do governo. Ele não revela quais são os clientes, alegando confidencialidade, mas comenta-se que presta serviços para Carlos Slim – o homem mais rico do mundo – e para o proprietário da Delta Construções, Fernando Cavendish.