Jornal Estado de Minas

Presidente da Assembleia ataca Ministério Público

Agência Estado
Réu em ação penal aberta pelo Tribunal de Justiça por suposto desvio de recursos públicos na época em que exercia o cargo de prefeito de Itapira (SP), o deputado Barros Munhoz (PSDB), presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, protagoniza intensa crise com o Ministério Público Estadual. Munhoz acusa promotores de Justiça de “perseguição política”, contra ele e contra gestores municipais. “Quanto prefeito, quanta gente está sofrendo por causa de acusações injustas”, afirmou Munhoz, em pronunciamento no plenário do Legislativo paulista, no último dia 4.
O deputado atacou a promotora Cristiane Hillal, que atua na Comarca de Mogi Mirim (SP) e investiga atos da administração de Carlos Nelson Bueno, prefeito tucano em segundo mandato, seu aliado. A hostilidade contra a promotora provocou imediata reação e indignação no Ministério Público. É o capítulo mais tenso das relações entre as duas instituições. Os promotores avaliam que seu trabalho irrita quem age à margem da moralidade. “O Ministério Público caminha no melhor rumo, causando incômodos àqueles que insistem em desafiar os princípios éticos dos quais a sociedade se mostra sedenta”, fustiga a Associação Paulista do Ministério Público.

A Procuradoria-Geral de Justiça, em nota, repudiou a investida do deputado. Os promotores se mobilizam. Nas redes sociais exibem a gravação e o vídeo da sessão em que Munhoz acusou Cristiane Hillal, admirada por seus pares pelo longo histórico de combate a lesões contra o patrimônio público.

Desde que promotores de Itapira - onde foi prefeito três vezes - o colocaram no banco dos réus em ações penais por peculato e ações civis por improbidade, Munhoz provoca membros do MP, a quem atribui abusos. Desta vez, foi mais longe. “É inquestionável, e aliás há um número muito grande de políticos, empresários e pessoas em geral, que têm sido vítimas de um comportamento inadequado de alguns membros do MP.”

Segundo ele, “como em algumas comarcas, como em alguns lugares, o membro do MP quer ser mais do que o prefeito, mandar na cidade quer perseguir politicamente o prefeito, quer ingerir na política da cidade e esse é o caso presente de Mogi Mirim”.

O presidente da Assembleia relata que a gestão Bueno identificou irregularidades na Santa Casa de Mogi e quis tomar providências, mas teria encontrado na promotora um obstáculo. “Isso tem que acabar, isso tem que ter um paradeiro”, bradou Munhoz a seus pares.

Segundo ele, nos últimos seis anos a promotora enviou 1.445 ofícios ao prefeito, que cumpre segundo mandato, cobrando explicações ou informações sobre atos municipais. “Para responder foram mais de 5 toneladas de papel, são milhares de horas e vários funcionários públicos se ocupando disso. E a bandidagem solta pela rua porque ir atrás de bandidos é mais incômodo do que estar nas manchetes dos jornais, de TV, nos microfones das rádios perseguindo políticos.”

Ele afirma que “respeita” o Ministério Público. “Infelizmente (estão) crescendo as exceções. E no Brasil demora 30 anos para você provar que uma acusação é falsa. O honesto injustamente acusado demora 30 anos para provar sua honestidade.”

Dinheiro vivo

“Existem indícios suficientes de que Barros Munhoz teria desviado bens e rendas públicas em proveito próprio e alheio”, afirma o desembargador Samuel Junior, do TJ, em declaração de voto pela abertura da ação contra o deputado - acusado de violar 33 vezes o artigo 1.º do Decreto Lei 201/67 (crime de prefeito).

A denúncia do Ministério Público, que tira Munhoz do sério, lhe atribui recebimento de valores quando prefeito de Itapira, em 2003. Após contratar uma empresa de fachada, segundo a promotoria, para construção de uma estrada na região, o então prefeito foi contemplado, entre 13 de janeiro de 2003 e 16 de dezembro de 2004, com “inúmeros depósitos em suas contas bancárias, todos em dinheiro vivo e em valores diversificados”.

Rastreamento bancário em seis contas de Munhoz mostra que naquele período ele captou R$ 933,15 mil. “Tais valores são desproporcionais ao patrimônio e rendas de Munhoz, inclusive aos declarados à Receita”, sustenta a promotoria.

Na contramão do relator, Armando Toledo, que considerou a denúncia inepta, o desembargador Samuel Junior foi taxativo. “A denúncia não é inepta, não apresenta nenhuma mácula e os elementos que a instruíram estão, em princípio, a apontar para a ocorrência de justa causa para a persecução criminal no tocante aos 33 delitos imputados (a Munhoz).”

“Barros Munhoz criou obstáculos e dificultou as investigações, deixando claro que sabia das irregularidades, que não queria fossem devidamente apuradas, o que serve para comprovar, sempre em princípio, seu envolvimento nas ocorrências.” As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

Promotores

Os ataques do deputado Barros Munhoz provocaram reação da cúpula do Ministério Público paulista. A Procuradoria-Geral de Justiça fez uma alerta. “O Ministério Público, em todo o Estado, e por todos os seus membros, atua sempre movido pelo interesse público não se deixando permear por pressões de qualquer ordem, tampouco por situações que envolvam interesses político-partidários.” A procuradoria sustenta que as críticas “revelam-se injustificáveis, na forma e conteúdo, dirigidas à promotora Cristiane Hillal.”

O Conselho Superior do Ministério Público, colegiado presidido pelo procurador-geral, fez ato de desagravo à Cristiane “em razão das ofensas proferidas pelo deputado”. A Associação Paulista do Ministério Público destacou a “primorosa atuação (de Cristiane)na área de direitos e defesa do patrimônio público”. A entidade anota que o sistema jurídico prevê instrumentos para revisão de toda e qualquer decisão tomada por membro do Ministério Público, “inclusive por meio de medidas judiciais”. Para a associação de classe, “tornam-se inaceitáveis ataques pessoais, injustos e diretos ao trabalho por ela (Cristiane) desenvolvido”.

“Mesmo pós 24 anos de existência da Constituição cidadã, ainda existe dificuldade de entender o papel fiscalizatório do MP e de perceber que a democracia se exercita para além do dia da votação dos nossos representantes políticos”, argumenta a associação. “Mais do que combatendo a corrupção, o MP está rompendo paradigmas.”