Brasília – A decisão tomada pela Mesa Diretora do Senado de cobrir integralmente o calote dado pelos senadores na Receita Federal ao receber os 14º e 15º salários e não pagar Imposto de Renda foi alvo de duras críticas de tributaristas ouvidos ontem pelo Estado de Minas. “Lambança”, “vergonha” e “aberração” foram apenas alguns termos utilizados pelos especialistas para classificar o ato. De acordo com eles, não há precedente no país. O recebimento dos extras sem desconto de imposto foi revelado pelo EM no início de março.
Membro do Conselho Federal de Economia, Paulo Dantas da Costa, economista especializado em tributação, afirma que ainda não entendeu a decisão. “O Senado não é contribuinte. O contribuinte é o senador. Ele é que tem que pagar o imposto. Dessa maneira, a sociedade está pagando por ele. Um absurdo. Dessa forma, a Receita não alcança o contribuinte.” O tributarista Ilan Gorin vai além. “Se o Senado pagar a dívida em nome dos senadores, a Receita Federal deverá cobrar mais um imposto sobre essa nova renda, uma vez que fica configurado um ganho extra”, afirmou.
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Em agosto, quando os senadores começaram a ser notificados em suas residências, um auditor do fisco, ouvido reservadamente, afirmou que os senadores é que deveriam pagar a conta. “A Receita é credora e o Senado é devedor. No entanto, a União não pode cobrar da própria União. Nesse caso, o empregador é a própria União. Por isso, todo o ônus financeiro deve ser lançado nos próprios senadores.”
Na terça-feira, logo após o anúncio da medida, o vice-presidente da Casa, senador Aníbal Diniz (PT-AC), declarou que, depois da notificação enviada nominalmente pela Receita às residências dos parlamentares, muitos colegas pressionaram a Mesa Diretora para não serem punidos.
Nessa quarta-feira, a manobra dos parlamentares para driblar o Leão foi institucionalizada, ao ser publicada no Diário Oficial do Senado. De maneira bastante genérica, o documento não detalha como a Casa vai pagar a dívida em nome dos parlamentares. O documento diz apenas que “os valores das parcelas a serem recolhidas a título de Imposto de Renda estão sendo calculados de forma individualizada pela Secretaria de Recursos Humanos em parceria com a Secretaria de Administração Financeira”.
O prazo para finalizar o cálculo, segundo a secretaria, é de 10 dias, mas o EM fez uma conta aproximada. Considerando o período retroativo de alcance da cobrança devida – cinco anos –, os parlamentares podem ter que devolver, juntos, aproximadamente R$ 10,8 milhões, incluindo as multas por imposto devido. Ao não pagar o IR referente aos salários extras, cada senador deixa de contribuir, por ano, com R$ 12.948. Durante um mandato inteiro, o parlamentar embolsa R$ 103.584.
Revolta
Os senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), Pedro Taques (PDT-MT) e Ana Amélia (PP-RS) informaram que não vão aceitar que o Senado pague a dívida por eles. “Isso é um absurdo. Vou calcular quanto eu devo”, disse Randolfe. À tarde, o parlamentar encaminhou ofício à Mesa Diretora pedindo a revogação da decisão ou que, pelo menos, o ato seja submetido ao plenário para avaliação. Randolfe cobrou também que seu nome seja excluído da lista de parlamentares que terão a dívida paga pela Casa. A senadora Ana Amélia agiu da mesma forma.
Mordomias
Alguns dos benefícios a que cada senador tem direito
» Salário mensal de R$ 26.723,12.
» 14º e 15º salários, chamados de ajuda de custo, recebidos em fevereiro e dezembro.
» Apartamento funcional ou auxílio-moradia no valor mensal de R$ 3,8 mil.
» Cota de passagem aérea de R$ 21 mil a R$ 43 mil.
» Atendimento médico sem limite para o parlamentar, cônjuge e dependentes com até 21 anos, ou até 24, se universitários.
» Despesas odontológicas e psicoterápicas no limite anual de R$ 25,9 mil.
» Passaporte diplomático emitido pelo Ministério das Relações Exteriores.
» Assinatura de duas revistas de sua escolha e quatro jornais.
» Não há limites para gastos com telefone celular. Cota mensal para telefone fixo é de R$ 500, e de R$ 1 mil para líder ou membro da Mesa.
» Cota diária de combustível de 25 litros de gasolina ou 36 litros de álcool, de segunda a sexta-feira, em Brasília, além do direito ao uso de um veículo oficial.