Criada como uma estratégia para esvaziar as denúncias do mensalão, a tese de que os recursos do esquema não passaram de caixa dois foi derrubada nessa segunda-feira pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Todos os políticos denunciados pela Procuradoria Geral da República por terem recebido dinheiro do empresário Marcos Valério foram condenados por corrupção passiva, numa demonstração de que a conduta, independentemente da destinação dos recursos, foi criminosa. Mais do que isso, a maioria dos magistrados, em seus votos, confirmou o principal eixo da acusação de compra de apoio político ao governo Lula.
Delator do mensalão, o ex-deputado Roberto Jeffersonfoi condenado por lavagem de dinheiro. Na semana passada, o plenário já havia formado maioria pela condenação do ex-presidente do PTB por corrupção. Ele não escapou de ser incluído no rol de culpados com os políticos que denunciou.
Os ministros condenaram também o deputado federal Pedro Henry (PP-MT), acusado de ter recebido dinheiro do mensalão. Ele foi considerado culpado dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Já o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) foi condenado por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção. Os dois se juntam a João Paulo Cunha (PT-SP). A denúncia contra o petista foi a primeira julgada procedente. Os três admitem ter recebido dinheiro do esquema comandado por Valério. Na avaliação da maioria dos ministros do STF, os repasses feitos para Henry e Valdemar ocorreram em troca de apoio político.
DIRCEU Nesta quinta-feira, o STF começa a julgar a parte mais emblemática do processo, ao tratar dos supostos corruptores: o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-presidente do partido José Genoino. Marcos Valério, já condenado por corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro, volta a ser julgado por ter distribuído dinheiro a políticos.
O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, afirmou que Marcos Valério dispõe do “mais agudo faro desencavador de dinheiro”. Nos capítulos já julgados, os ministros concluíram que houve desvios de recursos públicos, da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil, simulação de empréstimos para o PT e gestão fraudulenta de instituição financeira. Seis ministros apontaram que o esquema liderado por Valério serviu para abastecer um fundo destinado à compra do apoio de partidos. “Não se pode cogitar de caixa dois nem mesmo coloquialmente”, disse Britto.
A interpretação do STF tem um impacto além da esfera jurídica. A conclusão dos ministros representa um julgamento sobre a condução política do governo no primeiros mandato de Lula. Em seu voto, o relator, Joaquim Barbosa, citou duas importantes votações no Congresso: as reformas tributária e da Previdência.
O revisor, Ricardo Lewandowski, discordou da tese majoritária. Em seus três dias de voto, ele condenou políticos que receberam dinheiro de Valério por corrupção passiva, sob o fundamento de que quem recebe alguma vantagem em razão do cargo que exerce, independentemente da destinação e dos motivos, comete corrupção passiva. Ao se manifestar, Lewandowski tratou o dinheiro como ajuda para campanhas políticas, o caixa dois.
O ministro Marco Aurélio Mello afirmou que houve compra de apoio político. “Essa corrupção não visou cobrir simplesmente deficiência de caixa dos diversos partidos, mas sim a base de sustentação para aprovar-se determinadas reformas”, afirmou.
Primeiro a votar, o ministro Dias Toffoli reconheceu que sete políticos e assessores que receberam repasses feitos pelo PT, por meio das agências de Valério, praticaram corrupção. Ele citou o nome de dois petistas acusados de corrupção ativa, mas poupou José Dirceu. Toffoli observou que os recursos autorizados por Delúbio Soares “nunca foram regularmente escriturados em nenhuma das agremiações”.