Jornal Estado de Minas

Drogas

STF vai definir se porte para consumo não será mais crime

O Supremo Tribunal Federal (STF) já legalizou a união civil entre pessoas do mesmo sexo e o aborto de bebês anencéfalos. Agora, depois do julgamento do mensalão, a Corte tem pela frente a missão de decidir sobre a descriminalização do uso de drogas. Tramita no STF um processo impetrado pela Defensoria Pública de São Paulo que alega a inconstitucionalidade do artigo 10 da Lei de Drogas, que criminaliza o porte de drogas para consumo pessoal. Para a defensoria, o dispositivo contraria o artigo 4 da Constituição federal, que assegura a todo cidadão a inviolabilidade da intimidade e da vida privada. O órgão alega ainda que o uso de entorpecentes não lesa o estado nem bem jurídico de terceiros, por isso não pode ser considerado crime.

Por decisão do ministro Gilmar Mendes, relator do recurso, a decisão tomada pela Corte nesse processo terá repercussão geral, ou seja, o que for decidido nesse processo terá de ser acompanhado, em casos idênticos, por todas as instâncias inferiores da Justiça brasileira. Na prática, caso a Defensoria Pública de São Paulo tenha sucesso na ação, não será mais crime o porte para consumo no Brasil. Atualmente tramitam na Câmara dos Deputados 97 projetos de lei que tratam sobre drogas, a maioria referente à repressão ao tráfico.

O processo trata do caso do mecânico Francisco Benedito de Souza, de 52 anos, condenado a 1 ano e dois meses de detenção por porte de arma de fogo. Ele foi flagrado com 3 gramas de maconha dentro de uma cela do Centro de Detenção Provisória de Diadema, Região Metropolitana de São Paulo.

O processo foi concluído e deve entrar na pauta de votação no ano que vem, prevê André Barros, advogado da marcha pela legalização da maconha, cuja realização foi autorizada, ano passado, por unanimidade pelos ministros do STF.

A Procuradoria Geral da República é contra a tese da Defensoria. Para o subprocurador-geral da República, Wagner Gonçalves, o uso de drogas lesa a saúde pública, que fica “exposta a perigo pelo porte de drogas proibidas, independentemente do uso ou da quantidade apreendida”. “O uso de entorpecentes não afeta apenas o usuário em particular, mas também a sociedade como um todo”, afirma o procurador, na contestação ao recurso.

Já para a Defensoria Pública, não existe “qualquer desrespeito a pessoas ou bens jurídicos no simples consumo particular de drogas, consistindo tal uso mero exercício da vida privada”. O defensor do caso, Leandro Castro, não foi localizado para comentar o caso. Ele está de férias e só retorna em dezembro. Mas de acordo com a assessoria de imprensa, a Defensoria de São Paulo tem adotado essa tese em todos os processos por porte de drogas para consumo pessoal e apresentado recursos ao STF nos casos de condenação.

DEFESA A causa já tem a simpatia de diversas entidades não governamentais, entre elas o Viva Rio, a Comissão Brasileira Sobre Drogas e Democracia (CBDD), a Pastoral Carcerária, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminaisb (IBCCRIM) e o Instituto de Defesa do Direito a Defesa (IDD). Todas essas entidades foram admitidas pelo STF como amici curiae, amigos da causa, em latim, e poderão se manifestar durante o julgalmento do caso, ainda sem data precisa.
Tanto o IBCCRIM quanto o Viva Rio citam, nas petições em que pedem autorização para participar da causa; a Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia, criada pelos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, Cesar Gaviria, da Colômbia, e Ernesto Zedillo, do México, que com a Comissão Global de Políticas Sobre Drogas, têm defendido a descriminalização do uso da maconha.

O IBCCRIM cita estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em parceria com a Universidade de Brasília (UnB) que aponta o aumento da população carcerária desde que a nova Lei de Drogas, a mesma contestada pela Defensoria de São Paulo, entrou em vigor, em agosto de 2006. De acordo com o estudo, de 2007 a 2010 a população carcerária ligada às drogas aumentou 62,5%. “Um acréscimo que se deu justamente sobre as pessoas que eram rés primárias e não tinham envolvimento com o crime organizado”.

Juridiquês/português
Amicus Curiae
Expressão em latim que significa “amigo da corte”. É uma intervenção assistencial em processos de controle de constitucionalidade por parte de entidades que tenham representatividade adequada para se manifestar nos autos sobre questão de direito pertinente à controvérsia constitucional. Elas não são partes dos processos, atuam apenas como interessados na causa, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF).

DIFERENÇAS
» O que diz o artigo 28 da Lei de Drogas
Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às penas de advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade, medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

» O que diz o artigo 5 da Constituição Federal, no inciso X
São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. .