Os números oficiais arquivados nos gabinetes dos líderes do governo na Câmara e no Senado são claros. Com 366 deputados e 63 senadores, a base governista no Congresso domina 71,3% da Câmara e 77,7% do Senado, porcentual mais do que suficiente para aprovar emendas constitucionais, rejeitar projetos inoportunos, atropelar a oposição e deixar a presidente Dilma Rousseff governar em paz. Mas na prática não é bem assim.
Em vez de ser uma solução para os problemas do governo, a base gigantesca da presidente no Congresso é um dos motivos das dores de cabeça de Dilma, pois vive em brigas e disputas internas e cobra caro o apoio, sempre exigindo cargos em ministérios e estatais e liberação do dinheiro de emendas parlamentares. "É uma base problemática, desobediente, que precisa ser enquadrada" admitiu o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto, futuro secretário de Transportes de São Paulo.
Dois casos recentes ilustram a forma como os parlamentares da base votam e "traem". Em setembro, a Câmara aplicou uma surra no governo durante a votação do Código Florestal, obrigando a presidente Dilma a vetar boa parte da medida provisória que havia sido editada justamente para corrigir problemas de uma decisão anterior do Congresso sobre o mesmo assunto e sobre a qual já havia sido derrotada.
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Cobrança
Um deputado que integra a direção nacional do PT e preside uma das mais importantes comissões do Congresso disse que seu maior problema nas votações é causado sempre pelos parlamentares da base. São eles que mais exigem. Sabendo disso, a oposição faz acordos com eles para determinados assuntos, de forma que é difícil aprovar uma proposta de interesse do governo. Há, sempre a exigência de uma retribuição, com ênfase para a liberação do dinheiro das emendas.
Como a presidente nunca enviou ao Congresso emendas constitucionais importantes - quando se exige fidelidade de 308 deputados e 49 senadores -, a base governista tem servido apenas para evitar que a oposição aprove a criação de CPIs. Todos os pedidos que chegam e que representam algum perigo para o governo são arquivados.
A exceção foi a CPI do Cachoeira, destinada a investigar as ligações do contraventor Carlinhos Cachoeira com políticos e empresários. Mas ela é um caso à parte.
Nenhum requerimento que pudesse levar perigo ao Planalto foi aprovado. "Pelo menos nesse caso, a base foi de grande serventia para o governo", lembrou o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). .