Brasília – Assim que a Operação Porto Seguro foi deflagrada, desbaratando uma quadrilha que vendia pareceres jurídicos e técnicos para empresários que atuavam nas agências reguladoras, a primeira preocupação do Palácio do Planalto foi assegurar que não haveria prejuízo no projeto de concessões dos portos. A presidente Dilma Rousseff mantém a intenção de anunciar o pacote, que prevê investimentos entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões ainda nesta semana, depois de sucessivos atrasos no cronograma.
Duas preocupações permearam os últimos dias. A primeira delas foi explicar que o ex-número dois da Advocacia-Geral da União (AGU) José Weber de Holanda — um dos indiciados na Porto Seguro — não participava das discussões palacianas sobre o novo modelo de concessão. A outra foi manter a sinalização para os investidores, principalmente os estrangeiros, de que o governo não recuaria da decisão de promover mudanças no setor.
Segundo apurou o Estado de Minas o escândalo envolvendo Paulo Vieira (ex-diretor da Agência Nacional de Águas) e Rubens Vieira (ex-diretor da Agência Nacional de Aviação Civil) aumentou o apetite da presidente em criar um novo paradigma para a área. Muitas das irregularidades detectadas têm relação com o arrendamento de áreas para portos, como as autorizações de instalações do ex-senador Gilberto Miranda na Ilha das Cabras e no complexo Bagres-Barnabés. “A operação mostra que Dilma está certa ao criticar o modelo atual”, disse uma fonte que transita no setor aquaviário.
Com a disposição cada vez mais crescente do governo de envolver a iniciativa privada nos investimentos públicos, a importância das agências cresce. “Apesar de o governo não chamar o que faz de privatização, preferindo batizar de concessão, é preciso ter um órgão que fiscalize essa relação entre o mercado e o poder público”, defende o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) José Jorge.
PACOTES Se o governo ainda espera para anunciar a concessão no setor de portos, outros dois pacotes milionários já foram anunciados pelo Planalto. Em setembro, Dilma anunciou a concessão de rodovias e ferrovias, representando um investimento de R$ 133 bilhões ao longo dos próximos anos.
No ano passado, antes da avalanche de quedas de ministros envolvidos em atos de corrupção, o Planalto anunciou o processo de concessão de três aeroportos: Brasília, Guarulhos (SP) e Viracopos (SP). O montante total do negócio chega aos R$ 24,5 bilhões. Dilma, contudo, ficou insatisfeita com o modelo apresentado pelo secretário nacional de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, que impediu a presença de grandes investidores estrangeiros na negociação. Por isso, o governo ainda não anunciou as duas outras concessões planejadas: Galeão (RJ) e Confins (MG). O escândalo também abre espaço para Dilma trocar indicações políticas por nomes técnicos nas agências. “Estão reforçando o discurso dela de capacitação técnica”, disse o senador Delcídio Amaral (PT-MS).
Filho de ministro e corregedor
Brasília – Alvo de devassa da Polícia Federal (PF) na Operação Porto Seguro, as agências reguladoras voltaram aos holofotes políticos e são acusadas pela oposição de ineficiência e de serem usadas como cabides de emprego do governo federal. Na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), autarquia não atingida pela operação da PF, o filho do ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, ocupa o cargo de corregedor substituto da instituição.
Leonardo é servidor público federal desde março de 2005 e é analista administrativo do quadro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em julho de 2006, período em que o pai esteve à frente do ministério pela primeira vez, ele foi requisitado pela ANTT, onde ganha R$ 14,3 mil por mês (salário bruto). A Assessoria de Comunicação do órgão nega que a nomeação de Leonardo tenha sido feita por influência do pai e informa que ele foi indicado pela atual corregedora da agência, Maria Carolina Pullen Arrais. Ela está no cargo desde 2002 e recebe praticamente o mesmo salário de Leonardo: R$ 14,5 mil.
De acordo com a assessoria, “ele foi requisitado para contribuir com os trabalhos da Corregedoria da ANTT desde 20 de julho de 2006”. A nomeação “é questão interna da agência”. Por decreto da ANTT, o corregedor titular é indicado pelo ministro dos Transportes e nomeado pelo presidente da República. Cabe à corregedoria da reguladora fiscalizar as atividades da agência, apreciar representações contra a atuação de servidores e instaurar sindicâncias e processos administrativos disciplinares. Tudo é submetido à decisão da diretoria, que nunca foi contrária a algum entendimento indicado por Leonardo, que presidiu 24 processos.
Para o professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira, há, nesse caso, uma espécie de nepotismo disfarçado. Segundo ele, é uma questão que, no mínimo, merece ser examinada com profundidade para saber o alcance que o filho do ministro tem no cargo. “Não é um caso que caminha para o campo da ilegalidade, pois não há nenhum impedimento legal. Mas, possivelmente, caminha para o campo moral. O fato de o filho do ministro ocupar um cargo estratégico em uma agência estratégica cria uma situação de desconforto. Os dirigentes não vão querer contrariar o filho do dono do galinheiro”, afirma.
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