As disputas políticas anunciadas para 2013 têm potencial para tirar o sono e o sossego das principais lideranças do país. No início de fevereiro, serão eleitos os novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. O ano também será decisivo para a corrida presidencial de 2014 e para a definição das alianças estaduais. Mas a tensão latente no universo político contrasta com a monotonia que impera nas estruturas do poder de Brasília. Quem circular pelos corredores do Congresso em janeiro dificilmente vai concluir que, nos bastidores, há um embate ferrenho por espaço e poder.
O recesso parlamentar, aliado às férias dos titulares dos principais ministérios da Esplanada, suscita uma debandada generalizada. Além de deputados, senadores e ministros, as figuras que orbitam nesse cosmo político, como lobistas, advogados e assessores, também aderem à fuga coletiva, deixando Brasília irreconhecível. O burburinho dá lugar ao marasmo. Nos ambientes de negociações e negociatas, há espaço apenas para turistas que, como coadjuvantes, fotografam solitários os cenários das tomadas de decisões do poder.
O estouro dos fogos de artifício que anunciam a chegada de um novo ano é o sinal de alerta para o esvaziamento completo do universo político da cidade. A virada do calendário é quase um salvo-conduto para os engravatados que circulam pelos gabinetes da capital: as ruas de Brasília esvaziam-se na mesma proporção em que os políticos lotam o aeroporto rumo aos estados de origem ou à praia mais próxima.
O formato adotado nas eleições para a Mesa Diretora das duas casas do Congresso colabora para o êxodo político. Não há campanha declarada, peregrinação por gabinetes ou distribuição de panfletos com propostas dos candidatos que pleiteiam uma vaga de comando no parlamento. Boa parte das articulações é feita nos estados, longe do Congresso. Quem não tem a benesse da folga prolongada vai aos gabinetes apenas para bater o ponto, já que o recesso branco é quase uma tradição oficializada.
Impacto
Brasília vai muito além da Esplanada dos Ministérios e dos núcleos de poder, mas é inegável o impacto da ausência dos políticos na vida da cidade. O comércio é o primeiro a sentir os efeitos desse esvaziamento. Principalmente os restaurantes. Na capital federal, conversas decisivas costumam ocorrer entre goles dos vinhos indicados pelos melhores sommeliers e em meio a garfadas de pratos da haute cuisine. O recesso afeta, em especial, os estabelecimentos de gastronomia de alto padrão. Como além do salário polpudo os parlamentares têm cota mensal para gastar com alimentação, deputados e senadores são clientes tratados como reis nos restaurantes da cidade, com gastos muito acima da média. E o desaparecimento dos políticos das mesas é como uma bomba no faturamento desses comerciantes.
O empresário Jorge Ferreira, dono de alguns dos bares mais badalados da capital, como o Armazém do Ferreira e o Feitiço Mineiro, conta que janeiro é o pior mês para os negócios. E esses prejuízos são causados pela fuga de políticos? “Não falo só de políticos, falo da burocracia estatal como um todo. Tem o recesso do Congresso, mas também do Judiciário e de boa parte do Executivo. No GDF, a maioria dos servidores tira férias nessa época. Então, não é nada inusitado, é esperado, mas é sempre muito negativo”, explica o empresário. Ele lembra que, no passado, restaurantes fechavam as portas nessa época. “Hoje em dia, a gente aproveita para dar férias para a maioria dos funcionários ou para realizar obras. Nossa preparação para janeiro é como a dos ursos para o inverno: a gente sabe que o mau tempo vai chegar, então, a gente se organiza para hibernar”, brinca Ferreira.
Trabalho em baixa
“É o pior mês”
Em dias de votações disputadas no Congresso, os taxistas que trabalham no ponto em frente à chapelaria precisam de agilidade para atender toda a demanda. Eles chegam a fazer o trajeto entre a Esplanada e as quadras do Plano Piloto até 20 vezes por dia. Parlamentares, funcionários e advogados recorrem sempre aos serviços dos taxistas da região. Mas, durante o recesso, o taxímetro de Claiton Batista Soares, 32 anos, fica parado praticamente o dia todo. “Fico torcendo para chegar logo o carnaval, somente depois disso é que o movimento normaliza e a gente consegue trabalhar direito”, afirma o taxista, que há três anos trabalha no ponto do Congresso. “Janeiro é o pior mês. Quando faço quatro corridas por dia, eu comemoro. Normalmente, são pelo menos 15”, acrescenta Claiton.
Prefiro a agitação”
O cafezinho do Salão Verde da Câmara é o grande termômetro do movimento do Congresso. Nos dias de grande agitação política, as mesas ficam lotadas e parlamentares disputam espaço no balcão. Já no recesso, a área com vista privilegiada para o belo painel de Athos Bulcão fica deserta. Funcionário do café há três anos, o garçom Francisco Aguiar, 46, revela que o expediente parece mais longo diante do abandono da clientela. “Tenho que cumprir oito horas e, como a gente não atende praticamente ninguém, a sensação é de que a hora não passa. Eu prefiro a agitação dos dias que têm sessão no plenário do que esse vazio”, brincou o garçom. Independentemente do movimento, ele precisa fazer o trajeto diário entre Planaltina, onde vive, e o Congresso.
“Recesso é ruim”
Há 22 anos, Omar Leite faz as cabeças mais influentes da política brasileira. O simpático barbeiro de 70 anos trabalha no Senado e tem mais de duas décadas de experiência no ramo das cabeleiras (ou quase carecas) do Congresso. Diariamente, ele atende 20 pessoas na barbearia da Casa, entre senadores, deputados e servidores. Mas quando chega janeiro, o falante funcionário já sabe que vai faltar trabalho — e assunto. No primeiro mês do ano, ele recebe uma média de dois clientes por dia. Normalmente, Omar dá expediente até as 19h, mas ontem deixou o trabalho pouco depois das 14h, pois não havia o que fazer. “A gente só abre em consideração com os clientes antigos que não viajam. Mas o movimento é quase nulo. O recesso é muito ruim para a gente”, afirma o barbeiro.