João Alves Filho, do Democratas, é o único negro entre os prefeitos de capital que tomaram posse no dia 1º de janeiro. Ele volta ao cargo em Aracaju (SE), depois de ter sido prefeito da cidade na década de 1970 e governador do estado em duas ocasiões.
O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Marcelo Paixão, coordenador do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Sociais (Laeser) do Instituto de Economia (IE) lembra que, no Brasil, poucos negros exercem funções de destaque. Essa mudança de paradigma já ocorreu nos Estados Unidos, que reelegeram um negro para a presidência.
“O Barack Obama é produto de uma coisa que mudou nos Estados Unidos, que foi o acesso da população negra aos espaços sociais mais prestigiados. A política eu não diria que foi [a área] mais privilegiada dessa mudança não, mas [isso se observa] no acesso às universidades, a grandes empresas, na mídia, há uma visibilidade pública maior. E isso acaba favorecendo que as pessoas achem menos estranho ter pessoas diferentes, de pele escura, exercendo funções de comando”.
Paixão lembra que os Estados Unidos têm uma história que se inicia com a guerra civil e passa pelo período das leis segregacionistas, o que nunca ocorreu no Brasil. Mesmo assim, os norte-americanos produziram um presidente de evidente origem negra e o Brasil não.
Para a deputada federal Benedita da Silva, apesar de o Brasil ainda não eleger muitos negros, outras lutas e representações sociais importantes foram alcançadas nos últimos anos.
“Os Estados Unidos já elegeram e reelegeram um negro para a presidência. E o Brasil ainda não conseguiu, mas já elegeu um operário, elegeu uma mulher, penso que estamos avançando, porque são lutas muito importantes também, e a cada dia vemos esses movimentos crescer e serem representados. Creio que daqui a pouco a comunidade negra vai estar em outro patamar”
Para a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Eliana Graça, o problema é cultural e histórico, envolvendo a disputa do poder.
“Os negros não se candidatam não é por que não têm competência, não é bem isso. Primeiro que você tem uma cultura na sociedade que é machista e racista, né, então nós ainda não conseguimos derrubar esse racismo, nós temos uma história de submissão da raça negra, a questão da escravidão, que a gente não superou totalmente”.
Eliana considera que houve avanços, mas os próprios partidos políticos não oferecem oportunidades iguais de acesso às candidaturas. Além disso, ela destaca que os negros são a parcela da população que tem menos acesso à renda e a um bom trabalho.
“Com essas campanhas milionárias, como é que os negros concorrem, sem ter o financiamento público de campanha? Porque hoje se elege quem tem dinheiro”.
A secretária de políticas de ações afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Ângela Nascimento, afirma que, se por um lado existe a ideia de que os negros são importantes na vida da sociedade brasileira, por outro eles não são vistos como tendo as mesmas condições dos brancos para ocupar os espaços de decisão.
“Se nós somos um Brasil que sempre foi colocado como miscigenado e se há uma participação bastante expressiva da população negra, porque há sub-representação da população negra nessas instâncias [de poder]?”
Para Ângela, se todos são iguais, os negros também podem dividir igualmente os espaços de poder. “Considerando que essas desigualdades estão concentradas na população negra, é fundamental que ela seja protagonista dessas mudanças”. De acordo com ela, o Brasil criou o imaginário perverso de que negros são ótimos para trabalhar e incapazes de comandar, algo que precisa ser transformado.