Entre abril de 2008 e setembro de 2009, o MCCE recolheu mais de 1 milhão de assinaturas para apresentar o projeto da Lei Ficha Limpa, que se tornou o maior de iniciativa popular do país. Agora, o grupo trabalha para modificar mais regras eleitorais e partidárias. O grupo, formado por 51 entidades nacionais – nas quais se incluem, por exemplo, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) –, está se reunindo para tentar chegar ao consenso do que seria a proposta ideal.
Outro ponto, segundo Marlon Reis, será uma regra para dar mais transparência ao sistema, modificando, por exemplo, o sistema de votação proporcional para os cargos no Legislativo. Pela regra atual para compor as câmaras municipais, a federal e as assembleias, os eleitos são escolhidos a partir de um quociente eleitoral, que define quantas vagas cada partido ou coligação terá, e a partir daí entra o mais votado. “É um voto clandestino porque é possível votar em um e eleger outro que muitas vezes não pensa da mesma forma que o escolhido pelo eleitor. É preciso acabar com essa transferência de votos entre os candidatos”, afirma o juiz.
A minuta de projeto popular deverá ainda incluir a quebra de sigilo fiscal de todos os que concorrerem a cargos públicos. Hoje, a declaração de bens é feita pelo próprio candidato à Justiça Eleitoral e o entendimento é que a Receita Federal teria informações mais claras e confiáveis. O MCCE também discute uma forma de rastrear em tempo real as informações sobre as movimentações financeiras dos candidatos, informando ao eleitor tudo o que entra ou sai do caixa eleitoral.
Uma grande preocupação das entidades do MCCE é acabar com os chamados partidos de aluguel, que são usados como trampolim por candidatos com poucos votos que querem ser eleitos. Entre as ideias para minar essas legendas está a possibilidade de desvincular o tempo de televisão dos partidos da contagem para as coligações majoritárias. Ou seja, apenas o tempo do partido do candidato ao cargo do Executivo valeria. Proibir a militância paga, que são os profissionais contratados para balançar bandeira e distribuir santinhos, seria outra forma de dar mais igualdade ao pleito, segundo Marlon Reis. Para ele, isso acaba se convertendo em uma compra de votos oficial. Isso porque, argumenta, a prática “permite que o candidato passe dinheiro a essas pessoas para que elas peçam voto da família e de outros eleitores”.
Para Marlon Reis, a reforma é urgente, pois o sistema político brasileiro atual é descontextualizado. “O sistema vigente está morto, não tem mais nenhuma legitimidade. Ele vigora desde 1932, quando o Brasil era um país rural, analfabeto, pobre e machista. O país de hoje é outro”, afirmou. O magistrado acredita que o MCCE tem a Ficha Limpa como trunfo para garantir a mobilização em torno do novo projeto. “A Ficha Limpa vai ser o catalisador dessa reforma por dois motivos: primeiro porque mostrou que é possível a sociedade mudar leis eleitorais, quebrou um paradigma; e segundo porque foi feita uma aliança social até se atingir a lei e ela continua. É a partir dela que faremos a reforma política”, afirmou Reis.
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Exigência de adesão
Para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular é preciso reunir 1,4 milhão de assinaturas de eleitores, divididos em pelo menos cinco estados, sendo no mínimo 0,5% do eleitorado de cada um. O projeto da Ficha Limpa conseguiu mais de 1,5 milhão de assinaturas e a lei foi sancionada em junho de 2010. Naquele ano, porém, o Supremo Tribunal Federal vetou a aplicação para as eleições gerais que ocorreram em outubro, mas entendeu como válida a regra, que foi aplicada pela primeira vez em 2012. Com a lei, ficam de fora das eleições os que tiverem sido condenados em segunda instância.