Brasília – Os fundadores da Rede Sustentabilidade se mobilizaram ontem, durante o lançamento da legenda, para rejeitar o rótulo de "partido da Marina Silva" e para repetir em uníssono que a nova agremiação política não tem fins eleitorais. Mas nos discursos dos líderes e dos militantes, a ex-candidata do PV à Presidência surgiu de maneira inquestionável como a estrela do partido e figura central do movimento, que tem como bandeiras a ética, a justiça social e a sustentabilidade. A tentativa de desvincular a criação da legenda das eleições de 2014 também fracassou: a vereadora de Maceió Heloísa Helena, ex-candidata do PSOL à Presidência, lançou Marina para a disputa ao Palácio do Planalto. "É uma possibilidade, mas por enquanto é apenas uma possibilidade", desconversou a ex-senadora e ex-ministra. Chamados de "sonháticos, muitos apoiadores desfilavam com camisas estampadas com os dizeres "Marina 2014".
O deputado Reguffe (PDT-DF) e o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que são entusiastas do projeto mas negam a mudança de legenda, também passaram pelo evento de lançamento da Rede. Colaboradores como a empresária e socióloga Maria Alice Setubal fizeram discurso durante o evento, defendendo a proposta de um novo caminho na política. O empresário Guilherme Leal, da Natura, que foi candidato a vice na chapa de Marina em 2010, mandou uma carta de apoio. O ator Wagner Moura enviou um vídeo de apoio e foi bastante aplaudido.
O ex-secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente João Paulo Capobianco, que coordenou a campanha do PV à Presidência, foi o primeiro a tentar evitar o personalismo em torno da legenda. "Não podemos tratar a nossa maior liderança como a dona do partido. Esse não é o partido da Marina", discursou Capobianco. O vereador paulistano Ricardo Young (PPS) seguiu a mesma linha e ainda tentou desvincular a legenda da disputa de 2014.
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Marina Silva terá obstáculos para o 'sonho' se realizarPSB ensaia flerte com movimento da Rede Sustentabilidade, de Marina Silva'Rede' de Marina Silva faz campanha por assinaturasDeputados do PT e do PDT participam do lançamento de partido de Marina SilvaMas nem mesmo os militantes encamparam essas teses. O interesse em torno de Marina era tanto que muitos fizeram fila para tentar tirar fotos ao lado da estrela da Rede Sustentabilidade. Coube a Heloísa Helena declarar publicamente o que todos ali já sabiam: os militantes querem ver Marina candidata ao Planalto. "Eu entendo quando dizem que este não é o partido da Marina, também sou assim, não aceito o personalismo. Mas eu preciso dizer que me sinto feliz em ser sua soldada. Em ser conduzida por você, Marina", disse a vereadora, ainda oficialmente no PSOL. E disparou em seguida: "Por mais que a Marina não goste que digamos isso, quero vê-la disputando a eleição presidencial em 2014", completou Heloísa Helena, gerando o momento de maior comoção dos militantes. Todos levantaram e começaram a cantar "Brasil urgente, Marina presidente".
Crise À tarde, durante uma rápida entrevista coletiva à imprensa, Marina Silva ainda tentava se esquivar da posição de estrela do partido. Ela se sentou na segunda fileira, misturada a outros militantes. "Gente, nós somos uma rede, queremos quebrar o modelo atual de partido", explicava um dos apoiadores de Marina, diante dos apelos dos jornalistas para que ela se posicionasse à frente. Assim como fizera durante o discurso aos apoiadores, ela falou que o Brasil passa por uma "crise civilizatória" e afirmou que existe um mal-estar com relação ao momento enfrentado pelo país. "Saímos da fase do ativismo dirigido pelo sindicato, pela ONG, pelo DCE, e hoje estamos na fase do ativismo autoral, graças à ajuda da internet", explicou Marina.
Questionada sobre o direcionamento político da legenda, ela disse que a Rede Sustentabilidade "não será de direita e tampouco de esquerda". "Nem um nem outro, estamos à frente. Não seremos oposição nem situação. Vamos assumir posição", explicou. "Se a presidente Dilma fizer algo bom para o país, vamos apoiar. Se quiser passar algo como o Código Florestal, por exemplo, ficaremos contra", acrescentou. Ela garantiu que o novo partido poderá fazer alianças com outras siglas, mas com restrições. "As alianças serão pontuais, com qualquer partido com que tenhamos afinidade programática. A ideia é manter a coerência do discurso", acrescentou. Para que o partido saia do papel, os militantes terão que reunir quase 500 mil assinaturas e aprovar o processo no Tribunal Superior Eleitoral. É preciso concluir o processo até outubro para que os filados possam disputar as eleições do ano que vem.
Normas Os apoiadores começaram ontem a discutir as linhas gerais do estatuto da Rede Sustentabilidade. Há algumas normas consideradas pétreas, como a recusa de doações de indústrias de armas, tabaco, álcool ou agrotóxicos, por exemplo. Pessoas com ficha suja não serão aceitas, com exceção de militantes que já foram presos por envolvimento em movimentos sociais ou ambientais. Há ainda alguns pontos sem consenso, como a ideia de proibir os filiados de concorrerem mais do que uma vez à reeleição. Até 2014, antes das eleições, o estatuto ficará pronto, com detalhes como o limite para doações.