Marcelo da Fonseca
Um assunto bastante conhecido do eleitor brasileiro ganhou espaço nos discursos de políticos que já se movimentam de olho na eleição presidencial do ano que vem: a privatização. Só que desta vez no discurso dos tucanos, que pretendem mostrar que a prática, tão criticada pelo PT em eleições passadas, vem sendo usada cada vez mais nos últimos anos, mas sob o nome de ‘concessão’. Para evitar que o discurso contraditório coloque em xeque questões ideológicas do partido, petistas batem na mesma tecla: tentam mostrar a diferença entre o modelo de concessões adotado pela presidente Dilma Rousseff e as privatizações do governo de Fernando Henrique Cardoso.
“No passado, não soubemos defender as ações de nosso governo. Erro que não vamos cometer desta vez”, avalia o presidente estadual do PSDB, deputado Marcus Pestana. O tucano explica que uma das estratégias para 2014 será mostrar que o atual governo tenta implementar as mesmas ações que tanto criticou, mas não consegue bons resultados. “Esse PIB baixíssimo que vimos semana passada se deve à incompetência do setor público em realizar os investimentos necessários. E o governo não consegue gerar um ambiente para atrair o capital privado. Durante toda a sua história, o PT demonizou as parcerias com o setor privado, agora se rende aos fatos e tenta desestatizar serviços essenciais, mas com avanços pífios”, critica Pestana.
Com uma agenda cheia de licitações para entregar à iniciativa privada a administração de portos, estradas e aeroportos, o Palácio do Planalto espera que o sucesso das concessões ao longo deste ano sirva como alavanca para retomar o crescimento do PIB. No entanto, os petistas tratam de distanciar o modelo atual das ações adotadas pelos tucanos quando estiveram no governo federal. “Nesse modelo, continuamos donos da empresa, que passa a ser concedida somente em parte e por tempo determinado ao setor privado. Nos aeroportos, por exemplo, a Infraero mantém 49% do controle dos terminais e com grande poder de decisão”, explica o deputado Miguel Corrêa (PT).
VELHA GUARDA As disputas conceituais sobre concessão e privatização são travadas também por lideranças históricas das duas legendas, que levam para o campo ideológico a defesa do que consideram o melhor para o Brasil. Antigos representantes do PT, mesmo vendo com receio as concessões, reforçam o discurso de que se tratam de situações diferentes. “Não são conceitos iguais, já que por meio de concessão existe um contrato flexível em que o Estado pode revisar as regras buscando o melhor para o público. Já na privatização ocorre a perda do controle acionário da empresa”, explica Raul Pont, um dos fundadores do PT e deputado estadual no Rio Grande do Sul.
Segundo o petista, o tema está sendo muito debatido no partido e, mesmo aqueles que não veem as concessões como modelo ideal para o Brasil, vão trabalhar para defender as escolhas do governo Dilma. “Acho até que não é esta a melhor forma para melhorar os serviços essenciais, já que é possível termos empresas públicas que funcionem bem e o governo deveria atuar para recuperá-las. Mas se a maioria do partido entende que as concessões são a melhor saída, não há qualquer contradição com nossas ideias”, ressalta Point, que aponta prejuízos causados pelas privatizações da era FHC como evidência de que foram ações contrárias àquelas adotadas por Dilma.
O contra-ataque parte do próprio ex-presidente. Na semana passada, quando o PSDB reuniu lideranças em Belo Horizonte para discutir propostas que serão apresentadas ao país, FHC apontou a dificuldade que petistas têm em lidar com as privatizações. “Agora mesmo estamos discutindo a privatização da distribuidora de energia elétrica e a privatização, ou como dão outro nome, a concessão dos portos. O que houve foi a usurpação de um projeto, só que malfeito. Não se tem nem coragem de dizer que vai privatizar”, disse Fernando Henrique em discurso para correligionários.