Terminada a batalha no Congresso Nacional para derrubar os vetos da presidente Dilma Rousseff à redistribuição dos royalties do petróleo para contratos em andamento, prefeitos e parlamentares de estados não produtores entram novamente em campo numa posição divergente em relação à da presidente: enquanto ela defende que essas receitas sejam gastas integralmente com a educação, os gestores querem esticar o cobertor, usando o dinheiro para cobrir gastos também de outras áreas, principalmente da saúde.
Por ora, não há regras que limitem o uso dos recursos, mas uma medida provisória (MP) enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso em dezembro já estabelece que os royalties provenientes de novos campos sejam investidos exclusivamente na educação. Bola da vez no Legislativo, a MP já provoca debates entre os gestores municipais, que se mobilizam para evitar futuras restrições, como quer o Planalto.
Nesta semana, a presidente Dilma defendeu, em reunião com mais de 20 governadores, a necessidade de o país reservar a verba para a educação, investindo principalmente na valorização dos professores. “Vocês me perdoem, mas destinar os royalties do petróleo, as participações especiais e tudo que o petróleo arrecada para educação é condição para o país mudar de patamar. Nenhum prefeito, nenhum governador vai dar status para professor com o orçamento que nós temos”, afirmou Dilma.
Segundo o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM) e prefeito de São Gonçalo do Pará, Ângelo Roncalli, a destinação prioritária dos recursos para a educação é bem-vista pela maioria dos prefeitos, mas a vinculação integral dos royalties a essa área nem tanto. Defensor de um uso mais maleável das verbas, Roncalli argumenta que o engessamento impediria que prefeituras que já têm bons resultados no setor de educação utilizassem o dinheiro em áreas mais deficitárias.
“A legislação sobre o uso desse dinheiro vai ser definida a partir de agora, com muitas conversas, e não há oposição à valorização da educação na hora do gasto. Entretanto, temos também a saúde, que é hoje o principal gargalo de muitas cidades, com investimentos abaixo dos percentuais mínimos exigidos pela lei. Então, vamos buscar um meio-termo nessa divisão, talvez reservando 30% ou 40% para garantir melhorias também na saúde pública”, avalia Roncalli.
A disputa tende a ser acirrada, considerando o volume de receitas provenientes dos royalties. Apenas por meio dos contratos atuais, os cofres das prefeituras mineiras e do governo do estado, por exemplo, receberão um incremento de 658% em sua arrecadação de royalties neste ano, que deverá chegar a R$ 926,8 milhões. Um montante que enche os olhos dos prefeitos, muitos deles às voltas com dificuldades para cobrir os gastos municipais.
Outras demandas O prefeito Cézar Emílio, de Capitão Enéas, cidade de 15 mil habitantes no Norte de Minas, é um dos que não pretendem investir os recursos extras garantidos pela nova Lei dos Royalties exclusivamente em educação. O município, que até 2012 recebia anualmente cerca de R$ 80 mil em royalties, terá direito a R$ 469 mil assim que a nova regra entrar em vigor. “A destinação para a educação é muito bem-vinda, já que esse é um setor essencial para qualquer cidade, mas temos outras carências que poderão ser supridas aos poucos com essa verba”, avalia.
Outra questão levantada no debate sobre o uso dos royalties é o caráter finito desses recursos. “Não sabemos hoje até quando teremos essa fonte na ativa, por isso não será uma atitude responsável vincular tudo para a educação. Como faremos para sustentar essa estrutura no futuro?”, questiona Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM).
Audiências O deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator da Medida Provisória 529/12, que trata da destinação dos recursos das futuras concessões, já antecipou que será necessário fazer alterações no texto. Duas audiências públicas já foram marcadas: uma sobre a produção de petróleo e outra sobre a destinação dos royalties. "Precisamos saber que volume de dinheiro vamos ter, qual vai ser a cronologia dessa produção e se a destinação dos royalties será 100% para educação”, explica Zarattini, que pretende ouvir a opinião dos municípios antes de apresentar uma proposta. Na quinta-feira, a comissão mista que analisa a MP realiza a primeira audiência sobre o tema. A outra reunião está prevista para o dia 19.
Trâmite no STF
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu informações à Mesa Diretora do Congresso antes de apreciar os três mandados de segurança protocolados por parlamentares do Rio de Janeiro e do Espírito Santo que tentam anular a sessão, realizada na quarta-feira, que derrubou o veto presidencial à lei que redistribui os royalties do petróleo. O presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), tem até 10 dias para se pronunciar. Deputados e senadores fluminenses e capixabas acusam Renan de “ilegalidade e abuso de poder” por ter colocado o veto em votação na quarta. Segundo eles, deveria haver um prazo de 30 dias para que a matéria fosse analisada, pois o Diário Oficial da União de terça-feira trouxe uma nova mensagem sobre os vetos, com correções.