Brasília – A legalidade e a legitimidade dos convênios celebrados pelo Ministério do Turismo em 2012 foram postas à prova pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que abriu processo para investigar pelo menos 17 autorizações de repasses de recursos federais a prefeituras no ano passado. O relatório de acompanhamento foi aberto por decisão do plenário do TCU, após a constatação de irregularidades em outras três fiscalizações, feitas em 2009, 2010 e 2011.
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Turismo ocupa 5ª posição em termos de valores de emendas pedidas ao Orçamento de 2013PPS quer interpelar ministro do Turismo sobre diretorMinistério do Turismo promete regras mais rígidas para festasTCU vê irregularidades nos repasses de turismo em MGCeará vai contratar US$ 112 mi lhões para investir em turismoTribunal de Contas da União analisará contas de 2012 do governo federalTribunal de Contas da União quer ser gestor de obras, critica ministro dos TransportesTribunal de Contas da União aponta falhas sistêmicas na fiscalização do governoVinte e um convênios firmados em 2012 estavam baseados em recursos aprovados pelo Congresso. Juntos, eles representaram repasses de R$ 6 milhões. Onze deles contaram com emendas de peemedebistas que somaram quase R$ 2 milhões. Do total, cinco convênios receberam pareceres jurídicos no mesmo dia em que a proposta chegou à Consultoria Jurídica (Conjur) do ministério. Um deles recebeu duas manifestações, uma no mesmo dia e outra no dia seguinte. Cinco convênios tiveram pareceres jurídicos favoráveis no dia seguinte à chegada do processo à Conjur.
A consultora jurídica do Ministério do Turismo, Manoelina Pereira Medrado, se recusou a informar os nomes dos advogados que atuam na Conjur, alegando defesa da privacidade. Ela admite, no entanto, que os cinco pareceristas responsáveis por analisar convênios de eventos firmados no ano passado são comissionados e que nenhum é dos quadros da AGU. Ela justificou a escolha, a princípio, afirmando que os advogados públicos não ficam até de noite elaborando pareceres. Em seguida, afirmou que os integrantes da AGU que atuam na pasta não gostam de analisar convênios por considerá-los mais simples, “bobinhos”, não demandando pesquisas.
O diretor de Relações Institucionais da União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (Unafe), Felipe Hessmann Dutra, estranhou as declarações da consultora jurídica do Ministério do Turismo. “Desconheço a informação de que advogados públicos não ficam no serviço após as 18h. Em muitas situações, elepassa do horário dele, sim. E advogado público está ali para analisar processos independentemente de eles serem simples ou complexos”, afirmou. Para ele, cargos comissionados interferem na independência técnica do parecerista, mantendo-o subordinado aos interesses do gestor. Em relação às emendas do PMDB, o ministério informou que o partido do parlamentar não é levado em consideração no momento da análise da proposta.
Sobre a celeridade na emissão dos pareceres jurídicos, Manoelina Medrado alegou que a consultoria tem acesso às propostas de convênios antes da data registrada no Siconv. A própria equipe do ministério reconheceu, no entanto, que a informação é impossível de ser confirmada, já que não está registrada. A rapidez, em si, não é considerada uma falha, já que não há regras que fixem prazos mínimos para que o processo de um convênio seja analisado pela consultoria jurídica. A celeridade é justificada pela urgência e complexidade da proposta. Mas, em alguns casos, pode abrir brecha para irregularidades.
FISCALIZAÇÃO FALHA Em acórdão emitido no ano passado, o ministro do TCU José Múcio Monteiro chamou a atenção para a “aprovação exageradamente célere, sem a devida verificação quanto aos requisitos legais”, de convênio para a capacitação de 18 mil profissionais ligados ao setor do turismo no Nordeste. O acordo, proposto pelo Instituto para Preservação do Meio Ambiente e Promoção do Desenvolvimento Sustentável (Iatec), previa repasse R$ 7,2 milhões dos cofres do Ministério do Turismo. O ministro do TCU concluiu que o convênio, assinado em 31 de dezembro de 2010, apenas dois dias após o início da tramitação da proposta na pasta, tinha vícios que acarretavam a nulidade do acordo.
Entre elas, foi constatada ausência de capacidade técnica e operacional do Iatec. Segundo apuração do TCU, o instituto não havia atuado na área do turismo antes da celebração do convênio. No voto, Monteiro afirmou que “o Ministério do Turismo firmou o convênio apenas dois dias após a protocolação da proposta, deixando de adotar providências necessárias para a celebração do ajuste, tal como o exame adequado da capacidade técnica e operacional do Iatec, violando dispositivos legais pertinentes ao assunto”.
OUTRO LADO O Ministério do Turismo defende que casos como esse não ocorrem mais. Em portaria assinada pelo ministro Gastão Dias Vieira e publicada em março do ano passado, ficou determinado que “as propostas deverão ser enviadas com antecedência mínima de cinquenta dias da data máxima legal fixada para o empenho orçamentário”. A diferença do convênio de 2010 que acabou sendo anulado por determinação do TCU para os pareceres relâmpago verificados no levantamento da reportagem em convênios do ano passado é que, no primeiro caso, foi comparada a data da assinatura com a chegada da proposta ao ministério. No caso dos convênios de 2012, houve rapidez no trâmite dentro da consultoria jurídica.
O Ministério do Turismo afirma que não há irregularidade em nenhum dos convênios com emendas parlamentares empenhados em 2012 e diz que o papel da assessoria jurídica é verificar a minuta do convênio, se todos os documentos necessários foram juntados, se a entidade está adimplente, se os recursos foram empenhados e se a manifestação da consultoria técnica do ministério foi favorável. Dos 10 convênios celebrados com recursos aprovados pelo Congresso que receberam parecer jurídico favorável no mesmo dia ou no dia seguinte à chegada do processo à Conjur, nove estão na lista de acordos com a legalidade e a legitimidade analisadas pelo Tribunal de Contas da União.
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Sem concurso
A Advocacia Geral da União (AGU) publicou, em 2009, orientação normativa para regulamentar a emissão de pareceres pelos ministérios. No documento, fica estabelecido que “a competência para representar judicial e extrajudicialmente a união, suas autarquias e fundações públicas, bem como para exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo Federal, é exclusiva dos membros da Advocacia Geral da União e de seus órgãos vinculados”. Na prática, a norma implicava a saída dos advogados não concursados dos quadros das consultorias dos ministérios. A norma foi suspensa pela própria AGU, que por duas vezes prorrogou a determinação para que esses profissionais fossem exonerados. O prazo terminou em 31 de dezembro de 2012. O caso foi parar na Justiça e a própria AGU afirmou que “a exoneração desses servidores acabará por retirar, de supetão, grande parte da força de trabalho das consultorias jurídicas nos ministérios”. No dia 1º deste mês, a Advocacia Geral da União informou que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão sinalizou que 100 novos advogados públicos aprovados em concurso serão chamados logo após a homologação do certame. O Ministério do Turismo deverá ser um dos primeiros a receber reforço.