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Estado de Minas

Minorias se unem em igrejas inclusivas e mantêm a fé nos direitos humanos

Cresce no Brasil a participação das igrejas que acolhem homossexuais e todos aqueles que não se enquadram nos padrões ortodoxos das grandes comunidades religiosas


postado em 24/03/2013 06:00 / atualizado em 24/03/2013 07:57

 Alessandra Mello

 

"É muito difícil mudar um sistema já colocado, por isso abandonei a igreja, mas nunca perdi a fé" - Silas Viana Soares, de 43 anos, pastor da Igreja da Comunidade Metropolitana, em Belo Horizonte (foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press)

 Em tempos de da radicalização contra as minorias, ganha força no Brasil as igrejas inclusivas, cujo discurso passa ao largo da discriminação e acolhe sem distinção aqueles que não se enquadram nos padrões ortodoxos das grandes comunidades religiosas. Uma delas, a Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM), celebra em abril uma década de existência, ainda bastante tímida, no Brasil. Mas aos poucos vem conquistando adeptos e ajudando a romper o preconceito.

 Em Minas Gerais já são dois templos. Um na capital e outro em Divinopólis, Região Central do estado. A maioria dos seus seguidores é de homossexuais que tiveram de abandonar sua crenças por não se sentirem acolhidos pelas igrejas que frequentavam. Em todo o Brasil são 13 igrejas distribuídas em 11 estados. Mas a ICM não está sozinha. Segundo estudo da antropóloga Fátima Weiss, que acompanha a questão da diversidade sexual e religião, existem hoje pelo menos 10 igrejas inclusivas no país. Um número ainda pequeno para uma proposta que surgiu, na década de 1960, na esteira do movimento pelos direitos civis da comunidade homossexual estadunidense.

 

“A ICM está presente em 38 países há mais de 40 anos. Nos Estados Unidos, a nossa moderadora mundial, reverenda Nancy Wilson, faz parte do Conselho de Fé do presidente Barack Obama”, conta o líder da ICM no Brasil, reverendo Cristiano Valério, de 36 anos, formado em psicologia e teologia e assumidamente gay. Segundo ele, a igreja não se sente ofendida de ser conhecida como “templo gay”. “Não nos incomoda de maneira nenhuma, mas acaba reduzindo a nossa atuação. A questão gay é apenas uma das nossas áreas de atuação. Lutamos contra as injustiças desse mundo, como o machismo, o preconceito racial e de classe, o sexismo, a homofobia”, defende Cristiano, criado em uma família, segundo ele, de católicos fervorosos e praticantes. Para ele, a melhor definição para a ICM é “uma igreja dos direitos humanos” que “valoriza e não ataca todo tipo de diversidade”.

 “O diferente não nos ameaça. Ele nos enriquece”, prega Cristiano, para quem a radicalização contra a comunidade gay nada mais é do que uma resposta dos conservadores as conquistas de cidadania e direitos obtidas nos últimos anos pela comunidade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros). “Avançamos muito, por isso toda essa reação”, afirma com tranquilidade e certeza de que mais conquistas vão surgir a partir da mobilização da sociedade em torno da defesa dos direitos das minorias.

 DISCRIMINAÇÃO Em Belo Horizonte, a ICM é comandada pelo pastor Silas Viana Soares, de 43 anos, estudante de teologia e cabeleireiro. Nascido e criado em uma família de evangélicos, frequentador assíduo dos cultos e da escola dominical , ele diz que deixou sua igreja há cerca de uma década quando começou a se sentir discriminado por outros fiéis. “É muito difícil mudar um sistema já colocado, por isso abandonei a igreja, mas nunca perdi a fé. Sempre soube que o problema não era comigo e sim com os olhos com que a minha igreja lia a Bíblia”, defende Silas.

 A ideia de criar uma igreja inclusiva na capital mineira surgiu, segundo ele, logo no início dos anos 2000, quando um grupo e amigos começou a se reunir para discutir a Bíblia e também maneiras de garantir assistência religiosa e espiritual para gays excluídos de outras congregações. Aos poucos, o grupo se organizou e hoje se reúne em um culto todos os domingos à noite, no salão do Hotel Amazonas, no Centro de Belo Horizonte. “Nossa intenção é estar onde estiver um excluído”, defende Silas, que, para se tornar pastor, deve de frequentar uma curso de teologia. Segundo ele, no começo foi difícil, mas, com o tempo, todos passaram a aceitá-lo.

 Segundo ele, atualmente há uma imagem errônea sobre os evangélicos. “Nem todos são assim”, garante Silas, citando, entre vários exemplos, o nome de Ebenezer da Silva Melo Júnior, pastor na Igreja Batista Nacional Palavra de Vida e professor do curso de teologia do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, e contando com orgulho que ele já pregou para os fiéis da ICM.

 Questionado sobre por que aceitou pregar na ICM, uma igreja que acolhe principalmente gays, alvo hoje de preconceito por parte de algumas igrejas, Ebenezer disse que, como “ministro do evangelho de Jesus Cristo”, não poderia se “privar de compartilhar essa palavra com outros irmãos e irmãs em Cristo”

 Sobre o fato de algumas igrejas tachar como pecado o homossexualismo, o pastor disse que essa definição é decorrente do método utilizado na interpretação da escritura. “Entendo que, em função dos métodos utilizados, existem hoje na Igreja Cristã, de uma forma geral, interpretações múltiplas e contraditórias.” Ebenezer disse ainda considerar equivocado o pensamento do pastor Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, acusado de homofobia e racismo, e garante que ele “não representa a totalidade do pensamento evangélico brasileiro”.

 O pastor Ebenezer garante que não causou nenhum estranhamento receber em sala de aula um homossexual interessado em virar pastor. “Entendo que a academia seja um ambiente aberto e de respeito a alteridade. Entendo ainda que seja um ambiente onde podemos pensar a fé, criticando nossa forma de ler, interpretar e aplicar a Bíblia em nossas igrejas locais e na sociedade.”


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