Jornal Estado de Minas

Acusado de estelionato, Marco Feliciano depõe nesta sexta em audiência fechada

Supremo isola prédio para o interrogatório do deputado e presidente da Comissão de Direitos Humanos. Apesar de o caso não correr em segredo de Justiça, sessão será fechada

Maria Clara Prates

- Foto: Arte / Quinho / EM / DA PRESS
Os protestos contra o deputado federal pastor Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, que se arrastam há quase um mês, fizeram com que a Justiça montasse um esquema especial de segurança para esta sexta-feira, quando o parlamentar vai depor em processo no qual é acusado de estelionato. A segurança do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu isolar o prédio para o interrogatório do deputado e restringir a entrada no complexo que abriga a Corte. Nas quatro sessões do colegiado desde que tomou posse no comando do colegiado, no início de março, o pastor do Templo Avivamento, acusado de racismo e homofobia, enfrentou fortes protestos, que deixaram um saldo de duas detenções de manifestantes e a decisão, inédita na Câmara, de fechar as reuniões da comissão ao público. Pressionado por líderes partidários a renunciar ao cargo, Feliciano é ainda alvo de uma série de representações por causa de suas atitudes.

A audiência de interrogatório no STF vai ocorrer a portas fechadas por decisão do relator do processo, ministro Ricardo Lewandowski. Na sala do magistrado serão acomodados o réu, o representante da Procuradoria da República, os advogados do parlamentar e os servidores da Corte. Como o processo não está sob segredo de Justiça, os jornalistas poderão ter acesso, depois da sessão, ao depoimento do pastor, que será gravado e filmado, garantiu o relator. O ministro Lewandowski – que atuou como revisor do processo do mensalão – justificou o reforço na segurança e o depoimento fechado: “É preciso que ele (Feliciano) tenha livre trânsito, que os advogados, a procuradora e o juiz possam trabalhar com toda a tranquilidade para não tumultuar, não haver assédio. Quero garantir a tranquilidade do interrogando. Isso vai ser gravado e filmado. Vocês requeiram (o acesso ao depoimento) que eu vou analisar”, completou.

Calote De acordo com a denúncia, oferecida em 2009 pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, quando Marco Feliciano ainda não era deputado federal, ele e um assessor firmaram um contrato para a realização de um show religioso em São Gabriel, a 320 quilômetros de Porto Alegre, ao qual o pastor não compareceu. À época, a produtora do evento teria feito depósito de R$ 13 mil, referente ao cachê da apresentação, na conta indicada pelo pastor. Mas, depois do acerto, o assessor do hoje parlamentar teria ligado para a produtora e advogada Liane Pires Marques para informar que Feliciano tinha sofrido um acidente no Rio de Janeiro e, portanto, não poderia comparecer ao compromisso. Intrigada com o fato, a advogada buscou informações e verificou que não foi registrado nenhum acidente com evangélicos do Templo do Avivamento. Segundo ela, na verdade Feliciano tinha uma entrevista em uma rádio, que lhe teria oferecido o dobro do cachê pago pela produtora gaúcha.

Além do processo criminal no STF, o deputado responde também a uma ação cível que ainda tramita em São Gabriel. Nela, a advogada Liane pede indenização pelo prejuízos causados pela ausência do pastor no evento. No ano passado, a Justiça determinou que Marco Feliciano pagasse os R$ 13 mil a Liane como devolução do cachê. O deputado pagou, mas ela pede mais. Segundo a produtora, o prejuízo comprovado teria sido de quase R$ 100 mil na época, em despesas com segurança, passagens aéreas e estrutura para o show. Ainda segundo Liane, a dívida hoje estaria em R$ 2 milhões. A defesa do deputado nega a acusação. Segundo o advogado Rafael Novaes, Feliciano teria recebido o dinheiro e tentado devolvê-lo. No entanto, diz, os organizadores do evento teriam se recusado a receber o valor e optado por recorrer à Justiça.

No meio do um verdadeiro turbilhão – alimentado, de um lado, por manifestantes em defesa dos direitos humanos, e de outro, pela pressão dos próprios colegas e até correligionários na Câmara para que ele deixe a comissão –, Marco Feliciano bem que tentou adiar o interrogatório. Mas o argumento não convenceu o ministro Lewandowski. Segundo alegou o pastor, ele já estava comprometido para ministrar um culto religioso no Pará. “Indefiro tal pretensão, porquanto a data, sexta-feira, foi escolhida de modo a não prejudicar a atuação parlamentar do denunciado. Ademais, as atividades judiciárias preferem a quaisquer outras de natureza privada”, afirmou Lewandowski no despacho.

Os pecados de Feliciano

Representações e processos contra o deputado

Estelionato

O deputado Marco Feliciano (PSC-SP) será ouvido hoje no Supremo no processo em que é acusado de estelionato. A denúncia foi feita pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul em 2009, antes de Feliciano tomar posse como deputado federal. O processo foi remetido ao STF em razão do foro privilegiado. A acusação afirma que o parlamentar e pastor firmou contrato para ministrar um culto religioso mas não compareceu. Na ação, o deputado é acusado de obter para si a vantagem ilícita de R$ 13.362,83 simulando um contrato "para induzir a vítima a depositar a quantia supramencionada na conta bancária fornecida".

Homofobia

Em 17 de março, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enquadrou Feliciano na lei que define crimes de preconceito de raça ou cor. Ele quer que o Supremo Tribunal Federal instaure ação penal por discriminação e condene o deputado a pena de prisão e pagamento de multa. O procurador entendeu que duas mensagens postadas por Feliciano no Twitter tinham conteúdo discriminatório. Como não existe no Brasil lei que estabelece pena por homofobia, o procurador-geral usou a norma que estipula pena de prisão para quem "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional". O pastor argumenta que está sendo “vítima de uma perseguição fria e calculista”.

Difamação

Em 1º de abril, os deputados Jean Wyllys (PSOL-RJ), Érika Kokay (PT-DF) e Domingos Francisco Dutra (PT-MA) entraram com representação criminal na Procuradoria Geral da República contra Feliciano e o empresário Silas Lima Malafaia, que estariam usando empresa de assessoria para difamá-los. Eles pedem a acusação de Feliciano e Malafaia por sete crimes: difamação, calúnia, falsificação de documento público, injúria, falsidade ideológica, formação de quadrilha ou bando e improbidade administrativa.

Ataque a colegas

Em 2 de abril, a deputada Iriny Lopes (PT-ES) protocolou representação da Mesa Diretora da Câmara contra o pastor em que afirma que, ao dizer que a Comissão de Direitos Humanos era “dominada” por “Satanás” , o pastor feriu a honra e a imagem dos colegas. Essa representação, assim como a feita por grupo liderado pelo PSOL, será encaminhada à Corregedoria da Câmara ou ao Conselho de Ética da Casa. A mesma denúncia foi levada à Procuradoria Geral da República.

Quebra de decoro

Um grupo de nove deputados do PSOL, PT, PSB e PMDB entregou à Mesa Diretora da Câmara, em 3 de abril, representação em que o pastor é acusado de quebra de decoro parlamentar ao empregar funcionário fantasma e utilizar verba da Casa para negócios particulares. Para o grupo, a conduta é “incompatível com o decoro parlamentar, punível com a perda do mandato”. Os deputados apresentaram também recurso para anular a eleição de Feliciano ao comando da comissão.