Brasília – O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-comandante do DOI-Codi entre 1970 e 1974, obteve nessa quinta-feira na Justiça o direito de ficar calado na audiência pública que a Comissão Nacional da Verdade (CNV) fará nesta sexta-feira. O habeas corpus concedido pela 12ª Vara Federal do Distrito Federal não permite, no entanto, que ele falte à audiência, para a qual foi convocado. Será a primeira vez que a comissão fará uma audiência pública – a transparência de suas ações é motivo de divisão entre os sete membros do colegiado.
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Ustra é convocado para falar à Comissão da VerdadeMPF denuncia coronel Ustra por ocultação de cadáver na ditadura militarTese jurídica do mensalão pode ser usada contra Ustra Ustra terá de indenizar família de morto pela ditaduraIntegrantes da Comissão da Verdade não souberam enfrentar Ustra, dizem militantesNunca fui assassino, diz Ustra à Comissão da Verdade'Padrinho' de Ustra saberia destino de desaparecidos durante a ditaduraO depoimento será aberto ao público. Foram reservados cem lugares para os interessados em acompanhar. “Amanhã (hoje) estaremos lá para o depoimento. A gente não sabe o que vai acontecer. Talvez ele fale, mas pode ficar em silêncio”, disse Freitas Costa.
Este é o primeiro caso em que um convocado a depor na CNV ingressa com um pedido de habeas corpus para garantir o direito de se manter calado. Marcada para as 10h, no Centro Cultural do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, onde funciona a comissão, a sessão contará também com o depoimento do ex-agente do DOI-Codi Marival Chaves, que já prestou dois depoimentos privados aos membros da CNV.
No mês passado, o Ministério Público Federal em São Paulo denunciou Ustra por ocultação do cadáver do estudante de Medicina Hirohaki Torigoe, de 27 anos, morto em 5 de janeiro de 1972. Essa foi a primeira denúncia por ocultação de cadáver feita pelo MPF em razão de crimes cometidos durante a ditadura. Ustra é réu em ação penal do Ministério Público Federal em São Paulo pelo sequestro de Edgard Aquino Duarte, desaparecido nos porões da ditadura em 1972.
Hierarquia
A CNV divulgou nessa quinta-feira a existência de informes produzidos pelo Exército relevando a presença de uma hierarquia na ditadura militar (1964 – 1985) sobre a prisão de "políticos, pessoas de relevo e jornalistas". A informação foi divulgada pelo integrante da comissão Cláudio Fonteles em um de seis textos publicados no site da entidade.
Os informes foram produzidos pelo general de divisão Itiberê Gouvea do Amaral, comandante da 4ª Região Militar em 1968. Em referência ao então ministro do Exército, Lyra Tavares, ele afirma que a decisão sobre prisões tinham o objetivo de centralizar o controle após o Ato Institucional 5, de 13 de dezembro de 1968 – a mais forte ação do regime contra as liberdades civis.
O documento, datado de três dias após o ato, mostra também que, por determinação do então presidente Costa e Silva, essas prisões não deveriam "ser efetuadas sem prévia autorização (dos) ministros", as quais deveriam "submeter-lhe caso julguem necessário". Outro documento trata da censura à imprensa. "É vedado divulgar notícias referente a prisões ou atos decorrente de censura, com exceção das fornecidas ou autorizadas por fontes oficiais". Segundo o documento, também eram proibidos "notícias sobre atividades estudantis ou subversão, movimentos operários e greves".
Outros artigos divulgados se referem ao atentado frustrado ao Riocentro, em 1981, a Guerrilha do Araguaia e sobre os desaparecidos no regime Eduardo Collier Filho e Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira.