Jornal Estado de Minas

Ministro do Supremo contra o voto secreto

Um dia depois de o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defender um processo mais transparente, Marco Aurélio Mello diz que o Parlamento precisa alterar o modelo

Diego Abreu Juliana Colares
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), encampou as críticas feitas na quinta-feira pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, contra as votações secretas do Congresso Nacional. O magistrado avalia que “não há justificativa socialmente aceitável” para que os votos dos parlamentares continuem a ser fechados. Ele avalia que o modelo precisa ser alterado pelo Parlamento, principalmente por respeito ao eleitor. “Sou amplamente favorável à publicidade. O servidor público presta contas diariamente aos contribuintes. E uma das formas de prestar contas é tendo transparência na prática de atos”, afirmou Marco Aurélio, em entrevista ao Estado de Minas.
“Estou analisando a problemática sob o ângulo da conveniência. Por isso, sou amplamente favorável ao voto aberto, cada qual assumindo a sua responsabilidade e não se ocultando o mistério. Creio que os representantes do povo brasileiro devem atuar de forma clara e identificável porque eles prestam contas aos eleitores. Deputados e senadores são porta-vozes dos cidadãos”, completou o ministro. Na quinta-feira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou que o voto secreto “é uma tradição antiga”, mas defendeu “que quanto mais transparente for qualquer processo, melhor”.

O ministro Gilmar Mendes quer que o tema seja discutido, mas diz que é preciso ter cautela. “Todos nós somos, em princípio, a favor da ideia da transparência. Mas pode haver razão que justifique o voto fechado em determinados casos”, afirmou ontem, ao Estado de Minas. “Não acredito que seja muito fácil simplesmente dizer que o argumento em favor da transparência ou da prestação de contas é decisivo em todos os casos”, complementou.

Entre as decisões tomadas no Congresso em votações secretas está a aprovação do nome indicado pela Presidência da República ao cargo de ministro da Suprema Corte. Há parlamentares que se dizem contrários à abertura do voto nessas situações por temerem consequências negativas no futuro, em possíveis julgamentos no STF. Em relação ao assunto, Gilmar Mendes disse não acreditar em represálias. “Não vejo assim. Mas é um argumento de proteção. São pensatas para evitar constragimento. Essa é uma matéria sensível”, ponderou. “Isso (o fim do voto secreto) tem que ser avaliado com o devido cuidado. Por exemplo, no que diz respeito à cassação de mandatos, essa é uma questão de julgamento. É um procedimento em que se toma uma cautela até para garantir uma isenção”, afirmou Gilmar Mendes.

Mensalão

Em 2005, auge do escândalo do mensalão, o plenário da Câmara livrou da punição de perda de mandato dois parlamentares que, no ano passado, acabaram condenados pelo STF: João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT). A Corte não só os condenou à prisão como declarou a perda dos direitos políticos. O voto secreto ajudou a proteger 80% dos deputados suspeitos de envolvimento no mensalão. Em uma das ocasiões, quando João Magno (PT-MG) foi absolvido pelos pares, a deputada Angela Guadagnin (PT-SP) fez a chamada “dança do mensalão”.

Para Gilmar Mendes, com o voto aberto a pressão da população poderia gerar constrangimentos nos parlamentares. No caso dos vetos presidenciais, ele acredita que há lógica na defesa do sigilo em nome da proteção contra pressões do Executivo. Em todas as situações que envolvem a discussão, Mendes sugere cautela.