Brasília – A confusão que se instalou em pelo menos 13 estados na última semana, devido aos boatos de que o Bolsa-Família seria extinto, colocou o programa em evidência. Até para os críticos ficou explícita a importância conferida pela população à política governamental de transferência de renda, que hoje atende 13 milhões de famílias pobres. Se para combater a miséria os repasses mensais que variam de R$ 32 a R$ 306 têm efeitos imediatos inequívocos, o mesmo não se pode dizer sobre uma mazela secular no Brasil: a desigualdade de renda e, portanto, de oportunidades. Estudo feito por pesquisadores do Insituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que o Bolsa-Família contribui em apenas 1% para reduzir a concentração de riqueza no país — uma das mais elevadas do mundo.
Um mecanismo estatístico criado pelos autores do estudo — Marcelo Medeiros e Pedro Souza — identifica os fatores que ajudam a concentrar e a distribuir renda no país e o peso de cada um na formação do quadro atual de desigualdades. Dos oito elementos analisados, a assistência social, formada pelo Bolsa-Família e pelo Benefício de Prestação Continuada (cujo público são idosos e pessoas carentes com deficiência), é praticamente irrelevante para desconcentrar a riqueza. Nesse quesito, o impacto maior decorre do Imposto de Renda, que incide sobre os mais endinheirados, contribuindo em 10% para diminuir a desigualdade. Do outro lado, a renda do trabalho no setor privado eleva a disparidade .
Ranking Embora o Brasil tenha registrado queda contínua da desigualdade nos últimos 12 anos, a concentração de muito nas mãos de poucos persiste. Para se ter uma ideia, 41,5% de toda a renda estão com os 10% mais ricos, enquanto os 50% mais pobres dividem 16,4% do bolo. O primeiro grupo ganha 12,7 vezes mais que o segundo, se considerada a renda domiciliar per capita média. Distância só superada por países como Honduras, Colômbia e Bolívia. Nações próximas, como México, Peru e Argentina, têm desigualdade menor que a brasileira.
Governo federal discorda
Brasília - Presidente do Ipea e ministro-chefe interino da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Marcelo Neri defende a efetividade do Bolsa-Família na redução das disparidades. “É um programa que cumpre os dois papéis. Reduz a pobreza e também diminui a desigualdade”, destaca Neri. Desde 1990, o coeficiente de Gini, parâmetro internacional usado para medir a desigualdade de distribuição de renda em um país, tem apresentado queda. Numa escala de 0 a 1 (quanto mais próximo de 1, maior é a concentração de renda), o índice brasileiro caiu de 0,607 para 0,527 (dado de 2011). Na avaliação de Neri, isso se deve aos programas sociais iniciados em meados da década de 1990 e fortalecidos mais recentemente.
O Ministério do Desenvolvimento Social, em nota, destacou que o trabalho dos pesquisadores Marcelo Medeiros e Pedro Souza tem “a relevância de promover o debate sobre que tipo de sociedade o país está construindo”, mas discordou da conclusão do estudo. “São inegáveis os benefícios diretos e indiretos que o Bolsa-Família tem provocado em todo o Brasil, auxiliando efetivamente para diminuir as desigualdades históricas do país”, informa o comunicado. A pasta elencou uma série de dados sobre o programa, como redução de mortalidade de 19,4% entre crianças nos municípios com alta cobertura do Bolsa- Família. (RM)