Para Ayres Britto, o projeto de lei complementar que será colocado para votação no Congresso parte de um pressuposto “falso e equivocado juridicamente”, que vai “contaminar a pureza jurídica do resultado”. “As câmaras (legislativas) não emitem juízo técnico. A decisão das câmaras é de conveniência e de oportunidade. Obedece a critérios exclusivamente políticos. O Tribunal de Contas age como o Judiciário, fazendo o exame de ajuste, de verificação da compatibilidade ou não dos atos do prefeito aos modelos jurídicos pertinentes, coisa que as câmaras (legislativas) não fazem. Elas não são órgãos técnico-jurídicos, são órgãos políticos que só sabem e só podem decidir por critérios subjetivos de conveniência e de oportunidade”, disse Ayres Britto. “Quem trabalha com objetividade e não com subjetividade de capricho, não com cumplicidade e não à base de alianças é o Tribunal de Contas. As câmaras se movimentam num outro espaço decisório, que não tem nada de técnico e tudo de político. A Lei Ficha Limpa já foi julgada constitucional pelo Supremo. Nela, o Poder Legislativo não tem função judicante, tem função legislativa”, complementou.
Na quarta-feira, Vaccarezza afirmou que a proposta será levada ao colégio de líderes e ao plenário da Câmara dos Deputados na terça-feira. A previsão dele é de que o texto seja aprovado até o fim de junho. Sobre a possibilidade de a proposta passar no Congresso, Ayres Britto é enfático: “Do ponto de vista da depuração ética dos costumes político-administrativos, acho um lamentável retrocesso para não dizer um desastroso retrocesso, com todo o respeito aos que pensam diferentemente. Do ponto de vista da pura juridicidade, acho um tremendo equívoco”. “O Congresso está partindo de uma premissa falsa de que compete ao Legislativo julgar não só as contas anuais, mas as triviais, tópicas, pontuais, as chamadas contas de gestão. Essa tipologia de atuação exige exames objetivos e, portanto, técnicos, coisa que a Constituição jamais habilitou o poder legislativo a fazer”, disse o ministro aposentado do STF.
Reforma política “É uma armadilha o que esse grupo (de parlamentares responsáveis pela elaboração do projeto de lei complementar) está tentando montar. Se o prefeito tem maioria na câmara (municipal), o que geralmente tem, não vai ter consequências para ele”, disse o juiz Márlon Reis, um dos fundadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). A possibilidade de o prefeito também ser ordenador de despesas, em vez de delegar a tarefa à área técnica da administração municipal, favorece a concentração de funções e os desvios de recursos.
Procurado para falar sobre a viabilidade de a proposta ir a plenário na próxima semana, o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), disse que ainda não existe acordo. “Vamos discutir segunda à tarde. Depois, vamos dar o parecer”, afirmou. Quando questionado sobre a possibilidade de o PT apoiar a mudança na Lei Ficha Lima, o líder do partido na Câmara desconversou. “Não sei se posso concordar se nem conheço o texto”, disse.