Uma das primeiras ações do prefeito de São Sebastião do Paraíso, no Sudoeste mineiro, Rêmolo Aloise (PSDB), eleito no ano passado, foi cancelar uma dívida de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) do Hospital Sagrado Coração de Jesus, registrado em nome de seus filhos, Daniel Aloise (PSDB), atual vice-prefeito, e Flávio Aloise. O parecer técnico sugerindo o cancelamento da dívida foi emitido pela Gerência e Arrecadação da prefeitura menos de um mês antes da posse do prefeito.
Além de anular a dívida do hospital, referente ao período de 2001 a 2013, a prefeitura pediu a extinção do processo de execução fiscal que corria na Justiça de São Sebastião do Paraíso e que chegou a render a penhora do prédio da instituição para sua quitação. Rêmolo, que já foi acusado de fraudar o Sistema Único de Saúde (SUS) quando o hospital da sua família ainda atendia a rede pública, acabou voltando atrás depois que o ato de cancelamento dos débitos foi descoberto pelo Ministério Público.
O prefeito teve de enviar para a Segunda Vara Cível da comarca de São Sebastião do Paraíso, no dia 17 de abril, um ofício assinado pela procuradora-geral do município, Maria Salete dos Santos Caetano, pedindo a desconsideração de uma petição que requeria a extinção do processo de execução da dívida do hospital “em virtude do cancelamento do débito pela municipalidade” e a “reativação do processo”, que começou a tramitar em 2006, durante gestão da ex-prefeita Marilda Melles (DEM), adversária política de Rêmolo.
A prefeitura, por meio de sua assessoria, alega que não tinha intenção de cancelar a dívida e, sim, passá-la para o nome dos proprietários do prédio onde funciona o hospital. O imóvel está registrado em nome dos filhos do prefeito, que também são donos do Sagrado Coração de Jesus. No ato em que anula os débitos do hospital, a prefeitura solicita a transferência dos débitos para os donos do imóvel, mas encurta a dívida. Em vez de cobrar o período entre 2001 e 2013, a prefeitura solicita que seja feito “novo lançamento do IPTU em nome dos reais proprietários referente ao período compreendido entre 2008 e 2013”, deixando em aberto os anos anteriores, desde 2001.
Até 2009 a dívida de IPTU do hospital era de cerca de 38 mil. O valor atual do débito não foi informado pela Prefeitura de São Sebastião do Paraíso. A reportagem entrou em contato com a assessoria de comunicação e também enviou um e-mail solicitando informação, mas até o fechamento desta edição ninguém respondeu o pedido.
A prefeitura foi notificada pela promotora do Patrimônio Público, Manuella de Oliveira, para rever o ato publicado na última edição do Diário Oficial do município. No entanto, segundo informações de vereadores, continua em curso uma investigação contra os atos do prefeito. A promotora não foi encontrada para comentar o assunto. Segundo a assessoria de comunicação do MP, ela estava em audiência. No ofício em que determina a suspensão do perdão da dívida sob pena de ação de improbidade, ela critica o fato de o prefeito colocar os interesses da família acima do interesse público.
Investigação
O prefeito agora é alvo de uma comissão especial de investigação da Câmara Municipal, que deve ser instalada na semana que vem, e corre o risco de perder o mandato. O vereador Gerominho (DEM) disse que a comissão já tem as assinaturas necessárias para ser instalada, mas adianta que ela terá dificuldades de trabalhar, pois o prefeito tem o apoio de seis dos eleitos para a Câmara Municipal de São Sebastião do Paraíso. Segundo ele, a família de Aloise tem também dívida referentes a outros imóveis.
O Hospital Sagrado Coração de Jesus foi descredenciado do SUS em 2006 depois de uma série de reportagens do Estado de Minas que revelaram a existência de fraudes nas cobranças de procedimentos feitos pela instituição. Entre as irregularidades, foram detectados, por exemplo, exame de próstata em mulheres e mamografias em homens, além de fichas exatamente iguais para pacientes diferentes. O hospital chegou a ser alvo de uma operação de busca e apreensão pela Polícia Federal. Rêmolo, na época deputado estadual, foi denunciado pelo Ministério Público, mas o processo está parado na Justiça Federal.