Amanda Almeida
Brasília – O presidente da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro e da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Wadih Damous, defendeu nesse domingo a demissão do diretor
adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Ronaldo Martins Belham. Conforme o Estado de Minas revelou nesse domingo, ele é filho do general da reserva José Antônio Nogueira Belham, que comandou o DOI-Codi do Rio na época em que o ex-deputado federal Rubens Paiva foi assassinado, após ser preso e levado para o departamento.“Ainda que ele nada tenha a ver com os episódios, hoje sob investigação, de torturas e desaparecimentos ocorridos à época da ditadura, a sua suspeição é evidente pelas funções que exerce atualmente”, disse Damous. Para ele, Belham tem acesso a informações privilegiadas sobre a época em que o pai atuava como dirigente do DOI-Codi do Rio, conhecido como um dos órgãos de repressão mais fortes da ditadura. “Não temos que estigmatizá-lo por ser filho do general, mas a posição que ele ocupa cria a suspeição.”
O escritor Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado, cujo corpo continua desaparecido até hoje, questiona a posição de destaque do filho de Belham na estrutura da agência. “Causa-me desconforto e estranheza saber que ele é filho do general Belham, mesmo que seja isento. Como, numa posição de destaque na Abin, ele vai facilitar a revelação de informações secretas que comprometam o pai?”, justifica.
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) tenta localizar o general da reserva Belham para ser ouvido sobre o que ocorreu em janeiro de 1971. A CNV diz que o general recebeu, quando chefiava o DOI-Codi do Rio, dois cadernos de anotação que pertenciam a Rubens Paiva. Os documentos — encontrados no fim do ano passado pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul, na casa do coronel da reserva Julio Miguel Molinas — derrubaram a versão do Exército de que o ex-deputado fugiu do DOI-Codi em 22 de janeiro. Os textos relatam a trajetória de Paiva nas dependências do departamento, entre 20 e 25 de janeiro, mas não registram a morte do ex-deputado no período.
A Abin guardava, em relação ao período entre 1964 e 1990, mais de 132 metros lineares de documentos sobre o regime militar, o que soma cerca de 1 milhão de páginas. Ainda há 220 mil unidades de microfichas enviadas pela Abin para digitalização no Rio. Os documentos foram encaminhados ao Arquivo Nacional, em Brasília. O EM tentou falar com o general da reserva Belham, mas uma mulher que atendeu o telefone dele disse que o militar está viajando. O filho, Ronaldo Belham, foi procurado por meio da assessoria da Abin, mas não atendeu a reportagem.
“Escolha do governo”
O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) destaca que a responsabilidade pelos atos dos ocupantes de cargos de confiança no governo federal é da presidente Dilma Rousseff. “Não cabe à oposição dizer quem o governo deve nomear, mas vamos aguardar para ver o resultado dos atos (de Ronaldo Belham) e das investigações da Comissão da Verdade. Depois disso, poderemos ver se o governo deu um tiro no pé ou acertou”, ponderou.
Já o deputado federal e ex-secretário nacional de Direitos Humanos Nilmário Miranda (PT-MG) disse que é “precipitado” pedir a demissão de Belham. “O fato de ser filho de um ex-general não significa que ele concorde com o que ocorreu durante a ditadura. Ele não controla acervos do período e, por isso, não vejo com preocupação a permanência dele no cargo. Os documentos da Abin foram encaminhados ao Arquivo Nacional e podem ser consultados”, avaliou. Para ele, não se deve tratar a questão com “revanchismo”. “Nossa luta não deve se dar com a rotulação das pessoas, como se fazia na ditadura.”