Jornal Estado de Minas

Para onde caminha o gigante desperto?

Especialistas dizem que é cedo para saber se protestos trarão mudanças, mas têm uma certeza: atual modelo político faliu

Jorge Macedo - especial para o EM
Adriana Caitano e Juliana Colares
Brasília – Um movimento sem líderes, sem partidos, sem foco. Por mais que se tente comparar as cenas que o Brasil tem visto nas últimas semanas com outros momentos da história em que as cidades foram tomadas por protestos, todos têm dificuldade de achar uma explicação teórica ou lógica para o que ocorre agora. Especialistas ouvidos pelo Estado de Minas reforçam: não é o momento de ter certezas sobre o futuro, porque a voz das ruas, desta vez, tem muitos tons. Ainda que apostem em um arrefecimento das manifestações em breve, eles concordam que o fato é inédito e deve servir de reflexão, principalmente, para a classe política.

O diretor da ONG Transparência Brasil, Claudio Abramo, e o professor de Ética e Filosofia da Universidade de Campinas (Unicamp) Roberto Romano destacam que, apesar de existirem demandas difusas vindas dos manifestantes, a inconformidade com as instituições públicas e a corrupção são o ponto comum de todos os grupos. “O Estado brasileiro, que sempre foi muito repressivo e parasitário, está decepcionando cada vez mais a população. A máquina pública é lenta, enquanto a população tem informação em tempo real e está percebendo o quanto tudo isso incomoda”, comenta Romano.

Claudio Abramo ressalta que a rejeição dos manifestantes aos partidos é o maior reflexo de que há uma crise institucional no país. “Não defendo a inexistência de legendas, porque isso não funciona, mas as manifestações estão apontando a falência do sistema eleitoral brasileiro e a absoluta falta de representatividade dos partidos políticos, que parecem divorciados da comunidade que os elege”, argumenta.

Romano concorda: “Os partidos, nos últimos 40 anos, decepcionaram as bases, não se democratizaram, são siglas com donos, que só pensam em ganhar eleição e mandam no Fundo Partidário, nas indicações para cargos, na propaganda, nas alianças, e dão uma banana para os militantes”, analisa. “Com essa prática, não incentivam os jovens a participar, expulsam a sociedade e levam o exemplo para os poderes Legislativo e Executivo que ocupam.”

DESNORTEADOS


Ao mirarem o futuro, os especialistas frisam que não há espaço para teorias prontas e restritas sobre o momento, que é “um divisor de águas”. “Os políticos não estão sabendo o que dizer, não têm noção do que está ocorrendo nem resposta, análise ou ação, mas deveriam olhar com muita curiosidade essa mensagem forte das ruas”, alerta Abramo. “Os intelectuais e políticos menosprezam a capacidade de pensamento da população, que talvez não saiba ainda se organizar da melhor forma, mas sabe o que está acontecendo. As manifestações são o resultado da modernização da sociedade brasileira”, diz Romano.