Jornal Estado de Minas

Ex-prefeitos mineiros vão para a cadeia após operação da PF

Operação da Polícia Federal desarticula quadrilha que desviava dinheiro público e prende sete pessoas, entre elas um empresário capixaba. Esquema movimentou R$ 70 milhões no estado

Luiz Ribeiro
Federais acompanham Sebastião José Vieira Filho, ex-procurador de Montes Claros, acusado de envolvimento no esquema denunciado em abril pelo EM - Foto: Solon Queiroz/Esp. EM


A Polícia Federal desarticulou nessa terça-feira uma quadrilha acusada de desviar recursos públicos por intermédio da negociação fraudulenta de precatórios falsos, usados para a compensação tributária de dívidas dos municípios com a União. O esquema teria causado danos aos cofres públicos de mais de R$ 70 milhões em Minas Gerais e mais 10 estados (SP, RJ, ES, BA, PE, SE, PB, MA, PA e SC). Foram presas na Operação Violência Invisível sete pessoas, das nove que tiveram a prisão decretada, entre elas o empresário Mateus Roberte Carias, do Espírito Santo, apontado como mentor do esquema e os ex-prefeitos de Pirapora, Warmillon Fonseca Braga (DEM), e de Janaúba, José Benedito Nunes (PT).

Também foi expedido mandado de prisão contra o ex-prefeito de Montes Claros Luiz Tadeu Leite (PMDB), que se encontra em viagem aos Estados Unidos. O advogado Sanzio Baioneta Nogueira, que o defende  informou por meio de nota que o ex-prefeito está em tratamento médico e que sua viagem ao exterior foi comunicada às autoridades brasileiras. O delegado Marcelo Eduardo Freitas, chefe da Delegacia da Policia Federal em Montes Claros, que comandou a operação, disse, porém, que Leite é considerado foragido. No fim da tarde dessa terça-feira, Freitas anunciou que a PF localizou o ex-prefeito em um flat em Miami e que negociava com a polícia americana a prisão e imediata transferência dele para o Brasil. O delegado disse ainda que não havia informações de quem é o flat e em que condição Tadeu Leite estaria no imóvel – se ele seria dono ou teria alugado.

- Foto: De acordo com a PF, Mateus Roberte Carias montou a empresa Digicorp Consutoria e Sistemas Ltda., que oferecia às prefeituras títulos de crédito com o governo federal, para serem usados na compensação tributária de débitos com a União. Os papéis eram oferecidos com desconto de 30% e adquiridos por licitações, que seriam direcionadas para a empresa capixaba. “Só que os títulos eram falsos e a legislação proíbe a compensação tributária pelos municípios com o uso de créditos de terceiros”, informou o delegado Marcelo Freitas.

Mateus Carias já havia sido preso na Operação Camaro, deflagrada pela Policia Federal em abril de 2012, por prática semelhante. Na época, ele fechou contratos com cerca de 180 prefeituras, por meio da empresa Urbis Instituto de Gestão Pública, para compensar créditos tributários usando informações falsas e decisões liminares. Em depoimento à PF em dezembro, ele alegou que negociou com as prefeituras créditos de precatórios judiciais apresentados pela empresa Merizio & Giuberti Louzada Advogados Associados, com sede em Vitória (ES), investigada na mesma operação.
 
Mandados

Em Minas Gerais, além de Montes Claros, Pirapora e Janaúba, o grupo atuou em Águas Vermelhas, Capelinha Caratinga, Ipatinga, Itambacuri, Janaúba, Montes Claros, Pirapora, Rio Pardo de Minas, Várzea da Palma e Varzelândia. Em todas essas cidades foram cumpridos ontem mandados de busca e apreensão, visando aprofundar as investigações sobre o esquema fradulento. Segundo a PF, os prejuízos causados a esses municípios chegam a R$ 71,92 milhões.

Montes Claros, polo do Norte do estado, foi a cidade mineira que teve o maior volume de recursos envolvidos na compensação de dívidas com a União com o uso dos precatórios negociados pela empresa capixaba. De acordo com a Polícia Federal, por meio de uma licitação realizada em outubro de 2011, a Prefeitura de Montes Claros adquiriu R$ 13.957.219,48 em créditos e foram pagos R$ 9.367.901,49. “Todo esse dinheiro foi para o ralo”, afirmou o delegado da PF, lembrando que a compensação para o pagamento de débitos com o INSS não foi aceita pela Receita Federal e que o município continuou com os mesmo débitos com a Previdência Social.

Marcelo Freitas destacou ainda que, nas tentativas de compensação tributária com papéis negociados pela Digicorp foram usados documentos falsos com os nomes de Cláudio Maia Silva (supostamente auditor da Receita Federal) e Ângelo da Silva Marinho (suposto auditor fiscal da Previdência Social). “Mas essas pessoas não existem, o que é uma prova cabal da falsificação”, disse o delegado.

Em Pirapora, Warmillon chegou a negociar com a empresa capixaba precatórios no valor de R$ 2,8 milhões, que não chegaram a serem pagos. Em Janaúba, foi negociado R$ 1,68 milhão. Durante as investigações também foram levantados valores envolvidos em outras cidades mineiras, como Capelinha (R$ 4,53 milhões) e Caratinga (R$ 9,4 milhões).

Assessor de deputado entre os envolvidos

O empresário Roberto Mateus Carias foi preso em Guarapari (ES), com a mulher, Rosilene Trindade Carias, sócia da Digicorp. A empresa tinha como lobista Marcos Vinicios da Silva, o Marquinhos, assessor parlamentar do deputado federal Ademir Camilo (PDT), lotado na Câmara dos Deputados desde 2010 e que, segundo a PF, oferecia o “negócio” para os prefeitos. Até ontem à noite ele estava foragido. O deputado não quis comentar a decretação da prisão de seu assessor nem informar qual sua função no gabinete. Outro colaborador do esquema é Ademilson Emídio de Abreu, preso em Vila Velha (ES). Foram detidos ainda o advogado Sebastião José Vieira Filho (procurador do Município de Montes Claros na gestão de Luiz Tadeu Leite) e Eduardo Souza Bezerra, presidente da Comissão de Licitação da Prefeitura de Pirapora na gestão de Warmillon Braga.

As prisões temporárias – por cinco dias – foram decretadas pela juíza de Pirapora, Arlete Coura. Os envolvidos. podem responder por crimes contra a administração pública, formação de quadrilha, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva e fraude nas licitações. Três pessoas foram conduzidas até a Delegacia da Polícia Federal em Montes Claros para prestar depoimentos. Uma delas foi o advogado Farley Soares Menezes, que presta serviços de assessoria jurídica para vários municípios do Norte de Minas. Ele disse que chegou a ser consultado sobre a validade da compensação tributária com o uso dos precatórios, mas que emitiu parecer considerando que a operação não tem valor legal.

Na representação criminal encaminhada à Justiça de Pirapora, a Polícia Federal afirma que “o então procurador do Município de Montes Claros funcionou como um agente executivo da organização criminosa. Teve atuação relevante no certame licitatório, sendo o responsável pelo contato com representantes da empresa Digicorp”. Ontem à noite, o advogado Erick Rodrigues, que defende Sebastião Vieira, disse que a acusação não procede. “A acusação não passa de devaneio com o objetivo único e exclusivo de macular a imagem de um profissional que sempre pautou a sua vida pela ética e pela conduta ilibada”, disse Rodrigues.